Museu histórico do Crato. (FOTO | Professor Nicolau Neto). |
Por Alexandre Lucas, Colunista
Essa pergunta deverá nortear politicamente os movimentos sociais da cultura e a nova gestão municipal. Os desafios para a nova gestão são complexos e a sua superação depende de uma série de fatores políticos, econômicos e de articulações para colocar a cultura na centralidade e transversalidade política.
A
nova gestão tem interesse em colocar a cultura na centralidade e
transversalidade política? Esse questionamento deve ser guia da pauta política
dos movimentos sociais, pressão e diálogo (diálogo quando possível) devem ser o
combustível para consolidar e ampliar conquistas no campo cultural.
Historicamente
as conquistas sociais são frutos de uma série de processos de lutas e
resistências. No Crato, as recentes conquistas políticas e jurídicas são resultado
de muita pressão e nem sempre o diálogo foi um mecanismo possível, muitas vezes
o apagamento e o desprezo com as pautas mais emergentes foi o modus
operandi.
Dentre
as conquistas políticas e jurídicas
frutos da mobilização do setor cultural podemos destacar: A criação do
Sistema Municipal de Cultural, a Política Municipal do Cultural Viva, a
realização da última Conferência Municipal de Cultura, o Plano Municipal de
Cultura e a conquista paliativa dos 2% do orçamento para cultura que sofreu um
golpe declarado, desrespeitando as deliberações da Conferência Municipal de
Cultura e a mesa de negociação. Os 2% não deve ser teto e por isso continuamos
defendendo a aplicação de mínimo 2% do orçamento para cultura.
A
execução do Plano Municipal de Cultura requer que as políticas culturais caibam
dentro do orçamento. Sem ampliação de investimentos do Município e a busca de
investimentos externos para além da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), não é
possível projetar as políticas culturais na centralidade e transversalidade
política.
Atualmente
todos os equipamentos culturais do Município, sem exceção, precisam de
adequações, alguns estão de portas fechadas, outros funcionam precariamente.
Vale destacar que mesmo com reformas e adequados às exigências das linguagens
artísticas, garantia de acessibilidade e
condições de segurança, esses equipamentos precisam de condições de
funcionamento para sua manutenção e programação. Valeu lembrar que está sobre a
tutela da Secretaria de Cultura do Município, os seguintes equipamentos: Fundação
J. de Figueiredo Filho;
Escola
de Música Maestro Azul; Banda de Música do Crato; Biblioteca Pública Municipal
do Crato; Biblioteca Luiz Cruz; Centro de Formação e Apoio ao Reisado e
Tradições Populares Mestre Aldenir (Escola de Reisado); Museu Histórico do
Crato; Museu de Artes Vicente Leite; Teatro Municipal Salviano Arraes; Centro
Cultural da RFFSA; Caldeirão da Santa
Cruz do Deserto e outros que possam ser criados.
Um
outro elemento central é o Plano Municipal de Cultura que deve ser compreendido
como Política de Estado e não como política da Secretaria de Cultura do
Município, ou seja, essa compreensão coloca a cultura na centralidade e
transversalidade da política de governo.
O Plano deve ser o instrumento norteador a ser seguido por cada
Secretaria e equivalentes do Município.
Os
mecanismos de controle e participação social previstos no Sistema Municipal de
Cultura e na Política Municipal do Cultura Viva devem ter suas instâncias
respeitadas, inclusive o caráter deliberativo do Conselho Municipal de
Políticas Culturais e adequado às novas necessidades e abrangências do Sistema
Municipal de Cultura. A cadeira do segmento do Cultura Viva deve ser incluída
nos assentos do Conselho.
A
Política Municipal do Cultura Viva é a principal política de promoção da
cidadania cultural, legislação avançada, espelhada na Política Estadual do
Cultura Viva e em consonância com o movimento latino-americano do Cultura Viva
e é fruto da articulação dos movimentos
sociais no Crato. A Política dos Pontos
de Cultura precisa ser reforçada com ampliação de recursos que garantam
manutenção de espaços e de atividades nas mais diversas localidades urbanas e
rurais do município. Os valores destinados para os Pontos de Cultura no Crato
são insuficientes e não caracterizam fomento, os valores se assemelham aos
cachês praticados pelos centros culturais da região. O Crato é uma das cidades
que tem o maior número de Pontos de Cultura certificados, isso é resultado da
defesa e da difusão que vem sendo efetivada pelos agentes culturais e suas organizações.
Educação
e Cultura são partes da mesma construção, provocar uma política intersetorial é
uma necessidade histórica e uma previsibilidade contida nos Planos de Cultura e
Educação. Reafirmo, os planos devem ser tratados como políticas de estado e não
de setores. Para a cultura estar na
centralidade e transversalidade política é preciso também se aproximar das
universidades públicas da região do Cariri e entender o seu papel como
formulador de políticas e sua contribuição para implementar a legislação
prevista no setor educacional.
Nas
escolas, o ensino de Artes precisa ser ocupado por professores licenciados nas
áreas de Artes. As chamadas disciplinas
eletivas precisam ser repensadas para que tenham impacto significativo e
contextualizado com a função social da escola que é democratizar o
conhecimento. Isso requer combater a chamada “complementação da carga horária”
que na prática menospreza o caráter e a importância política, social e estética
das áreas ligadas às culturas e as artes. O professor acaba se submetendo a
fazer de conta que domina uma área que não tem formação e nem relação.
As
escolas, como previsto, no Plano Municipal de Educação podem “Promover a
relação das escolas com instituições e movimentos culturais, a fim de garantir a
oferta regular de atividades culturais para a livre fruição dentro e fora dos
espaços escolares, assegurando, ainda, que as escolas se tornem polos de
criação e difusão cultural”. Reconhecer as escolas como espaços de fruição e
difusão estética, artística e cultural (equipamentos culturais), possibilita
ampliar a escala de democratização das artes e das culturas para um público que
historicamente é excluído dos espaços e circuitos tradicionais das artes e das
culturas.
Os
espaços de leitura nas escolas e as bibliotecas municipais têm função essencial
na ampliação da visão social do mundo e na construção de uma cultura
leitora. Estamos atrasados na
implementação Política/Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e
Biblioteca.
Precisamos
sair de alguns modelos atrasados e elitistas, como é o caso da narrativa
“Crato: Capital da Cultura”, conceito fundado pelas elites econômicas que serve
para massagear egos, romantizar a cultura e reduzir a compreensão de
diversidade, pluralidade, conflitos e desafios do campo cultural do município.
As
culturas tradicionais, cartão postal da cidade, não devem ser tratadas como
adereços, como ornamentos de festas e cerimônias, mas pensada como parte
estruturação do direito à cidade e fortalecimento da economia solidária. Cada
Terreiro e grupo afastado do centro da cidade é em potencial, equipamento de
desenvolvimento social, econômico, turístico, de reafirmação de identidades,
amplificação de olhares, circulação e fruição estética. Por isso é necessário a compreensão de
interrelações de outras secretarias com o setor cultural e a importância dos
mapeamentos territoriais e a integração de cada território.
A
nova gestão caso queira colocar a cultura na centralidade e transversalidade
política deve fugir do modelo pão e circo, a exemplo do FestCrato que
desrespeita o Sistema Municipal de Cultura
e desnutri o orçamento do município. Esse tipo de evento é insalubre
para a cadeia produtiva da economia da cultura local, não potencializa e nem reafirma,
a diversidade e a pluralidade da produção regional, reproduz uma lógica de
mercado e enfraquece o repertório simbólico da população.
Os
desafios e as complexidades para desenvolver uma macropolítica para cultura no
Crato não são solucionadas com receitas, esse tem que ser um dos entendimentos.
Quais as condições objetivas para colocar a cultura na centralidade e
transversalidade política? É possível fazer diferente?
Sem economia para cultura, não se estrutura sonhos.
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