Professores, professoras, palestrantes, ceriminialistas e gremistas por ocasião do novembro negro 2024 da EEMTI Padre Luís Filgueiras. (FOTO | Reprodução). |
Por Nicolau Neto, editor
No último dia 21 de novembro a EEMTI Padre Luís Filgueiras, de Nova Olinda-CE, a edição 2024 do Novembro Negro, parte integrante de um conjunto de ações desenvolvidas durante o ano letivo dentro de componentes curriculares da área de Ciências Humanas, sobretudo em Sociologia.
Em 2023,
a temática foi “20 anos da lei 10.639/2003 – educação, resistência e
equidade racial” e foi marcada com uma grande “caminhada
antirracista” pela valorização da história e cultura dos povos negros e
originários do Brasil, vindo a percorrer as principais ruas da cidade e uma
palestra com o professor Dr. João Luís do Nascimento Mota que versou sobre “a luta do negro e a
negritude”.
Este ano, a temática central foi “Mulheres, Educação
e Comunicação Antirracista” e contou com a participação Tatiane
Evangelista, Ismênia Leite, Victoria Alencar, Ermina Bezerra, além das
cerimonialistas Maria Edilaine e Jamile Bispo. (clique aqui e reveja).
Abaixo
o cerimonial
Cerimonial
do Novembro Negro da EEMTI Padre Luís Filgueiras
Tema:
Mulheres, Educação e Comunicação Antirracista
Cerimonial (Edilaine
Lima e Jamile Bispo)
(Edilaine). Não há como falar da
História do Brasil sem mencionar os mais de três séculos de escravização, tanto
dos povos originários quanto dos povos africanos. A História do território que
hoje chamamos Brasil se entrelaça com o processo de escravização. Os europeus
levaram de forma forçada para o continente americano mais de 12 milhões de
africanos para serem escravizados. Segundo Laurentino Gomes, em seu livro
“Escravidão”, o Brasil sozinho obteve desses mais de 12 milhões cerca de 5 milhões
de africanos na condição de escravizados.
(Jamile).
Pois é, Edilaine. Isso significa dizer que não dá para entender a formação do
país sem que estudemos de maneira séria a escravidão que tão mal fez e tem
consequências desastrosas. Afinal, a principal consequência que temos hoje é o
racismo. O racismo é um projeto de poder muito difícil de combater. E ele que
mantém os privilégios, a desigualdades e que mantém a população preta e
indígena a margem, no desalento. É por isso, por ele ser um projeto de poder
bem articulado que o torna tão difícil de combatê-lo. Pois, por um lado, há uma
negação constante de que ele exista e por outro lado, há os que não confessam
que são racistas. Dentro desse contexto, a gente traz o antropólogo
congolês-brasileiro Kambegele Munanga. Para ele, o racismo é uma dupla morte,
visto que ele é “um crime perfeito. Não
vemos o carrasco do racismo porque ele não se assume como tal. Então é uma
morte física e também da consciência do negro.”
(Edilaine). O
Munanga tem razão. Mas apesar desse massacre, a população negra e indígena
existe e resiste. Fora do continente africano, o Brasil é o país mais negro do
mundo. Mais da metade da população brasileira é negra.(55,5%). No Estado do
Ceará, por exemplo, esse número sobe para a casa dos 72,5%, conforme dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). No nosso município,
Nova Olinda, a população negra também é maioria. Negros e negras aqui são
70,3%.
(Jamile).
Pois é, Edilaine. E na nossa escola os números não são diferentes dos nacional
e estadual. Segundo pesquisa realizada pelo professor Nicolau Neto este ano e
publicada no blog Negro Nicolau, 75,3% dos estudantes da Escola Padre Luís
Filgueiras se autodeclararam negros.
(Edilaine).
Esses números são um tapa na cara daqueles dirigentes que, em um passado não
muito distante implementaram a ideologia do branqueamento. Segundo esta ideologia
que foi uma política de estado, em pouco tempo dada a mistura de povos, o pais
não teria mais negros. A teoria do embranquecimento da população foi uma teria
racista e que repercute ainda hoje, o que professor e ativista negro Abdias
Nascimento chamou de “política de genocídio” em seu livro “Genocídio do povo
negro brasileiro. Processo de um racismo mascarado (1978).” E foi um
tapa na cara porque, a biologia explica. Na relação entre pessoas pretas e
brancas, a pele preta e dominante e a branca é recessiva. Isso a gente discutiu
em uma oficina desenvolvida pelo professor Nicolau no início deste ano nas
turmas de 1º ano e eu era monitora.
(Jamile).
Tratando especificamente de educação, o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA) destacou que jovens de pele negra possuem quatro vezes mais
chances de morrer do que um branco. As mulheres negras ocupando as mesmas
funções de brancos e brancas ainda recebem os menores salários. E é esse mesmo
IPEA que constata que a chance de um negro ser alfabetizado é cinco vezes menor
do que um branco. No nível superior a realidade é praticamente a mesma. Somente
uma a cada quatro pessoas formadas é negra. Sem contar os inúmeros casos de
discriminação e racismo que crianças e jovens de pele negra sofrem todos os
dias nas salas de aulas.
(Edilaine).
Dados que nos entristecem e que nos deixam em sinal de alertas o tempo todo
para exigirmos, Jamile, uma educação que dê conta desse problema. Não dá pra
pensar em educação só sob a luz de metas. Aliás, se é pra pensar em meta que
seja para superar o racismo e construir uma educação voltada para a equidade
racial e de gênero. Pois muitos estudantes abandonam as escolas por não serem
capazes de superar esse câncer que atinge o país desde a invasão dos
portugueses em 1500. Nos livros didáticos, negros, negras e povos nativos não
se reconhecem. Não conseguem se perceber nele porque nosso currículo ainda é
pautado pela linha do europeu.
(Jamile). Mas
se por um lado a gente não pode pensar o Brasil sem estudar a escravidão e as
consequências danosas dela originadas, é importante destacar que a compreensão
do Brasil, em particular da educação e da comunicação como instrumentos de luta
por justiça e equidade, passa primordialmente pelas contribuições da população
preta, especialmente de mulheres pretas. Pensou em combate ao analfabetismo? Lá
está uma mulher preta, a Antonieta de Barros. Sua crença era que a educação era a única arma capaz
de libertar os desfavorecidos da servidão. Foi com essa visão que ela criou um
curso que levou seu nome, o “Antonieta de Barros”, com o objetivo de combater o
analfabetismo de adultos carentes. E o dia do professor e da professora,
celebrado anualmente em 15 de outubro? Foi Antonieta de Barros.
(Edilaine). Se
a gente voltar um “bucadinho” na História e pesquisar por libertação e luta
contra a casa grande, iremos encontrar muitos exemplos. Comecemos por
Aqualtune, fundadora do “Quilombo dos Palmares” e avó de Zumbi dos Palmares. Na
mesma linha, temos Tereza de Benguela. Ela que é conhecida por ser símbolo na
luta contra o racismo e o patriarcado do século 18, e ter liderado o Quilombo
do Quariterê, atual estado do
Mato Grosso. Desde 2014, o Brasil celebra, no dia 25 de julho, o Dia Nacional
de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
(Jamile). E
como esquecer de Preta Tia Simoa, heim gente? Segundo o professor Nicolau Neto,
com base em estudos desenvolvidos pela historiadora cearense Karla Alves, “Tia
Simoa definiu os rumos da abolição no Ceará.” A Preta “Tia Simoa” foi uma negra liberta que,
ao lado de seu marido (José Luís Napoleão) liderou os acontecimentos de 27, 30
e 31 de janeiro de 1881 em Fortaleza – Ce , episódio que ficou conhecido como a
“Greve dos Jangadeiros”, onde se decretou o fim do embarque de
escravizados naquele porto, definindo os rumos para a abolição da escravidão na
então Província do Ceará, que se efetivaria três anos mais tarde.
(Edilaine). E a
gente não pode esquecer da historiadora Beatriz
Nascimento e sua grande contribuição no campo da educação. Suas pesquisas
contribuíram para entender a identidade negra como instrumento de
autoafirmação racial, intelectual e existencial. As políticas de reparação
que temos hoje são frutos de sua luta incansável contra o racismo.
(Jamile). Do
mesmo modo, a antropóloga, filósofa, professora e uma das principais autoras do
feminismo negro no país, a Lélia Gonzalez. Suas pesquisas falam as culturas
negras e seus saberes a levaram a produzir uma obra de impacto dentro e fora da
academia, além de ser notória sua intensa atuação política contra o sexismo e o
racismo.
(Edilaine). São
tantas as mulheres pretas que contribuíram para entender a formação do país que
a gente passaria a manhã inteira e não iriamos concluir. Hoje, dando
continuidade a esse grande legado, nós temos Sueli Carneiro, Cida Bento, Cícera
Nunes, Zuleide Queiroz, Maria Telvira, Karla Alves, Dayze Vidal, Valéria e
Verônica Carvalho e tantas e tantas outras, das quais as nossas convidadas de
hoje fazem parte.
(Jamile). É
dentro desse contexto que necessitamos construir uma educação voltada para a
diversidade, para a pluralidade e que esteja direcionada a combater diariamente
o racismo. A nossa educação precisa ser antirracista e um dos caminhos para
isso é o debate, a reflexão e a promoção de ações que perceba negros, negras e
povos nativos não só como contribuidores na formação do país, mas
principalmente como produtores de conhecimentos e de saberes.
(Edilaine).
Jamile é importante lembrar que pela primeira vez o Dia da Consciência Negra,
celebrado ontem, 20 de novembro, é feriado nacional. O presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) sancionou a Lei 14.759, que coloca no calendário de feriados
nacionais o Dia da Consciência Negra e o Dia Nacional de Zumbi dos Palmares, em
dezembro de 2023.
(Jamile). Que
marco importante na História, hein Edilaine. Ano passado o projeto “aCORde uma voz”, da área de Ciência
Humanas, apresentou como temática “20 anos da lei 10.639/2003 – educação,
resistência e equidade racial.” E este ano, a gente irá discutir o tema “Mulheres,
Educação e Comunicação Antirracista”.
(Edilaine).
Sintam-se todes, todas e todos acolhidos no Novembro Negro, edição 2024 do Projeto “aCORde uma voz”, da Escola de Ensino Médio em Tempo Integral Padre
Luís Filgueiras.
(Jamile). Para
abrir nosso evento convidamos a professora e diretora da Escola Padre Luís
Filgueiras, Aparecida Matos, a Tia Cida.
(Edilaine).
Gratidão, Tia Cida. Com muita alegria recebamos o professor Nicolau Neto para
falar sobre nosso Novembro Negro.
(Jamile). Sem
mais delongas, convidamos para compor nossa mesa Tatiane Evangelista. Ela é da
Zona Leste de São Paulo e mora no Cariri Ceara desde 2010 É Assistente Social,
cursou Filosofia na Universidade Federal do Cariri (UFCA) e Sanitarista egressa
da Residência Integrada em Saúde com ênfase em Saúde Coletiva pela Escola de
Saúde Pública do Ceará. Poeta e Educomunicadora vive os movimentos sociais
desde sua infância, participante da fase embrionária do projeto Educom.radio em
2002 pela Univesidade de São Paulo (USP).
(Edilaine). Recebamos
agora Ismênia Leite. Ela é professora de geografia da rede pública municipal de
Assaré. Mestranda em educação, pesquisa sobre as memórias das afrodescendências
de Assaré na formação civilizatória do lugar e é integrante do Núcleo de Estudo
em Educação, Gênero e Relações Étnico-raciais- NEGRER.
(Jamile).
Comporá nossa mesa também Victoria Alencar. Ela tem 17 anos. É a primeira
mulher transexual presidenta de um grêmio estudantil na história do Cariri,
diretora de movimentos secundaristas da União da Juventude Socialista (UJS) de
Crato. É militante na frente LGBTQIA+, Antirracista da UJS Ceará e
transfeminista negra.
(Edilaine).
Para completar. Vamos chamar a moça da casa, Ermina Bezerra. Ela é estudante do
2º ano A e é inegrante do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e
Indígenas (Neabi), do Instituto Federal do Ceará (IFCE), campus Crato.
(Jamile). Bem
vindas, meninas. E vamos começar com uma das formas mais potentes de denúncia,
mas também de empderamento. Estamos falando de poesia, gente. Chega pra cá
Ronyldo Júnior. Gente, o Ronyldo é estudante, mora em Assaré e irá recitar três
poesias, uma delas é de sua autoria.
(Edilaine). Que
maravilha. Gratidão, Ronyldo por compartilhar conosco essas escritas. A Jamile,
que divide comigo este cerimonial também escreve, gente. E ela tem é autora da
poesia que sobre a importância das mulheres vítimas de violência fazerem as
denúncias.
(Jamile). Deixe-me
aproveitar e chamar minha parceira Edilaine porque eça também é autora de
poesias e recitará para nós duas. Uma leva o título de “miseráveis abolidos” e a outra fala sobre “a voz não escutada.”
(Edilaine).
Também vou aproveitar que estou na ativa e dizer que nossa mesa terá a seguinte
sequência. Primeiro a gente escuta Ermina que falará sobre sua participação no
NEABI e a contribuição dele para sua formação antirracista. Depois, será a vez
da professora Ismênia que trará as vivências e os atravessamentos enfrentados
pelas mulheres negras do interior nordestino. Depois, a gente irá ouvir Tatiane
que nos trará contribuições sobre sua atuação nos movimentos sociais e na
comunicação. E para fechar nossa manhã, a gente tem a estudante cratense
Victória Alencar que falará sobre sua luta cotidiana.
(Jamile). Que
mesa, hiem? Cada participante terá 20 minutos de exposição e, findado a rodada,
a gente abre espaço para o público fazer considerações.
(Edilaine).
Dito isso, fiquemos com nossas convidadas.
(Jamile). A
palavra está aberta para perguntas ou qualquer outra contribuição......
( Edilaine). A gente agradece as nossas
convidadas, ao nosso convidado e a todos pela contribuição. Grande abraço,
gente.
(Jamile). A gente lembra que esse evento é uma realização da área de Ciência Humanas, da EEMTI Padre Luís Filgueiras, com o apoio dos demais professores e professora, equipe gestora e do Grêmio Estudantil. Grande abraço, gente.
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