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(FOTO | Marcelo Camargo | Agência Brasil). |
No Brasil, há registros de 119 povos em isolamento voluntário, também chamados de povos livres. Dentre eles, há os que vivem em 37 espaços sem proteção e que podem ser invadidos a qualquer momento, o que os ameaça em diversas dimensões e pode culminar em seu extermínio. Os dados constam no livro Povos Indígenas Livres/Isolados na Amazônia e Grande Chaco, lançado na última quinta-feira (13), na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Brasília.
Diferentemente
dos dados que entidades indigenistas produzem regularmente e com mais facilidade,
os relacionados aos povos livres exigem um tratamento especial, já que os
grupos assim classificados levam esse nome por evitar a convivência com outras
pessoas, sejam não indígenas, sejam de outros agrupamentos originários,
geralmente devido a experiências de violência que os vitimaram.
Projeto
da Equipe de Apoio aos Povos Livres do Cimi (Eapil), do Cimi, a obra destaca
que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) reconhece 114 desses povos
e toma apenas 28 deles como os que têm sua existência comprovada.
Para
um dos organizadores do livro, o antropólogo e docente da área na Universidade
Federal do Amazonas (UFAM) Lino João de Oliveira Neves, ao deixar de
identificá-los, as autoridades governamentais expõem sua negligência e, por
vezes, o menosprezo que sentem em relação a eles. O pesquisador ressalta que a
omissão não é exclusividade do Brasil e deixa subentendido que, ao não fazer o
reconhecimento formal, os governantes garantem que não terão que cumprir nenhum
dever, nem mesmo os previstos na Constituição.
“Esses Estados nacionais produzem uma
política de negação”, afirmou Neves, que também é assessor da Eapil,
durante o evento de lançamento. “São
anti-indígenas, violentos contra indígenas. Fazem com isolados o que fazem com
todos os indígenas.”
Brasil de atrasos e tragédias
Neves
argumenta, ainda, que “todos os indígenas
da América Latina vivem na violência” e que, “há 15, 18 anos atrás”, o Brasil e outros países da América do Sul
conseguiram consolidar algumas medidas de proteção territorial dos povos
indígenas.
“Mas, nos últimos anos, os Estados começaram
a retirar os direitos indígenas. Houve um retrocesso das políticas
indigenistas. Isso não ocorreu só no Brasil, mas mais concretamente no Brasil e
no Peru”, prosseguiu.
Conforme
lembra o antropólogo, desde 1987, o Brasil decidiu não mais insistir em
promover aproximações de indigenistas com povos em isolamento voluntário. A
deliberação chegou dois anos após o fim da ditadura militar, iniciada em 1964,
período em que quem estava no poder vendia um discurso de integração dos povos
originários. Neves argumenta que a dificuldade de se levantar e atualizar dados
sobre os povos livres pode, de primeira, parecer somente um inconveniente, mas,
se analisada sob outro ângulo, ser um indicativo de que estão tendo sucesso em
se manter longe de tudo e todos, preservados do que chama de “sociedade fundamentalista”.
Por
isso, a relativa acessibilidade que se vê agora também diz algo a seu respeito.
Para Neves, o que vem ocorrendo é que as regiões que podem habitar estão
diminuindo.
“Estão sendo prensados pelo mundo do branco”,
resume. “E também porque, nos últimos
anos, as próprias organizações indígenas, os próprios parentes [indígenas de
outros povos], perceberam que não deviam mais fazer contato, e sim protegê-los.”
“Não somos nós, de fora, que devemos dizer
quem eles devem ser”, finaliza o docente da UFAM, quanto ao respeito ao
modo de viver dos povos em isolamento voluntário.
Fronteiras
Assim
como Neves, que percebe o livro lançado como “um chamado para a consciência coletiva”, o missionário do Cimi e
historiador Guenter Francisco Loebens, também responsável por organizá-lo,
acredita no potencial de mobilização da publicação. Ele destaca que grande
parte desses povos está localizada em regiões de fronteira. “O que remete a uma discussão sobre sua
proteção, levando em conta a necessidade de cooperação entre os países, para
[se formular] políticas mais adequadas”, explica.
Outro
participante do debate feito durante o evento, Daniel Aristizabal, secretário
do Grupo de Trabalho Internacional para a Proteção dos Povos Indígenas Isolados
e Contato Inicial (GTI-PIACI), elogiou a iniciativa de se escrever o livro
sobre essa temática. “Regionaliza o
debate e reconhece que estão em condição de fronteiras, bosques e convida os
governos a estabelecer uma estratégia ecológica para mitigar a mudança
climática”, avalia.
Aristizabal
salienta que há registros de povos livres na Bolívia e no Paraguai, assim como
na Colômbia, no Equador e na Venezuela. “Há
na Índia e já estão recebendo informações sobre possíveis registros na África”,
acrescenta.
O
secretário evocou, ainda, a autodeterminação, que é o princípio que, quando
respeitado, permite que cada povo mantenha intacto o modo de viver que deseja
seguir. “É nosso sonho que possam
permanecer nessa condição”, disse. “Devemos
lembrar que esses são os últimos povos que ainda são resistência à colonização.”
Publicação
O
livro pode ser lido e baixado no site do Cimi. Caso haja interesse em se obter
uma cópia impressa da obra, pode-se adquiri-la pelo email mobiliza@cimi.org.br.
Os exemplares físicos estão disponíveis no valor de R$ 45. O valor arrecadado
será totalmente revertido para custear as despesas da publicação.
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Com informações do Notícia Preta.
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