O testamento, por Alexandre Lucas*

 

(FOTO | Reprodução).


É colunista, pedagogo e artista-educador*

Teve que partir. Tomou água, sentiu dor na barriga, olhou pela janela, viu um abismo e uma rosa vermelha como se estivesse de braços abertos. Mordeu os lábios com força, quase que bebeu do seu sangue. Seus olhos um bocado de brilho de lembranças.

As malas ainda não estavam prontas e o desejo de partir desarrumado. Tinha que sair assim mesmo, sem vontade. Parece que colocaram agulhas nas horas e a cada segundo uma sessão de tortura se iniciava. O tempo, na hora da dor, é mais demorado, até parece que é para sempre. Como os finais de histórias previsíveis que contam para as crianças. 

Ainda não acreditava na sua partida, achava que era pesadelo e logo acordaria. Na agenda, deixou anotado um testamento, onde dividia o que não era possível empacotar, nem sentir com as mãos. Por falar em mãos, as suas estavam deliciosamente sujas de chocolate. O Testamento ficou literalmente achocolatado.

Belchior cantando, o vento soprando a cabeça, os filmes passando, o movimento. A pipoca foi se espalhando pelo chão para enganar os caminhos, enquanto a sede aumentava.

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