Michel
Temer sancionou, na última terça-feira (28), mudanças no marco regulatório da
radiodifusão brasileira. A Medida Provisória 747 – que agora é lei – foi
enviada para o Congresso Nacional no final do ano passado e altera regras para
outorgas de radiodifusão, retirando obrigações básicas das empresas na
prestação do serviço.
CartaCapital
- O empresariado de radiodifusão comemorou as mudanças no marco regulatório do
setor, mas a imprensa não se preocupou em explicar de forma abrangente no que
isso implica. O discurso que prevaleceu foi o da “desburocratização para apoiar as empresas”.
No
que diz respeito ao fato de o interesse público ser o condutor dos processos de
licenciamento das outorgas de rádio e TV no Brasil, a MP representa um grande
retrocesso. Para Bia Barbosa, coordenadora geral do Intervozes e Secretária
Geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), “não é
nenhum exagero afirmar que o empresariado da radiodifusão agora pode fazer o
que bem entender com este bem [a comunicação]”.
Veja
o que muda, segundo Bia:
1. Anistia nos prazos para renovação
Pelas
novas regras, todo concessionário que tenha perdido o prazo para renovar suas
outorgas ganha de presente 90 dias para fazê-lo. Não interessa se o atraso foi
de um mês ou de dois anos. Todo mundo poderá fazer o pedido agora. Aquelas
emissoras que já pediram a renovação, mas o fizeram fora do prazo – inclusive
as que o Executivo já tinha revogado a licença justamente pelo atraso na
solicitação da renovação –, também ganham mais uma chance para recolocar seus
canais em funcionamento, caso o Congresso Nacional ainda não tenha se
manifestado sobre o caso.
E,
daqui pra frente, se mais alguém se esquecer de pedir para renovar suas
outorgas dentro do prazo, caberá ao Estado brasileiro a tarefa de avisar as
empresas sobre isso.
Ou
seja, em vez de retomar as outorgas que foram abandonadas pelas empresas que
não pediram sua renovação e abrir novos processos de licitação, para que outras
empresas ou atores possam participar da disputa por um espaço no espectro
eletromagnético, o governo Temer “facilitará” a vida de antigos radiodifusores,
para que eles voltem a operar, agora “dentro da lei”.
A
mesma anistia foi concedida às rádios comunitárias, depois de muita pressão,
sobretudo da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), porque
a proposta inicial de Temer era conceder o benefício apenas às comerciais.
2. Renovação mais do que automática
Foi
excluído do texto da lei a previsão de cumprimento de “todas as obrigações legais e contratuais” e o atendimento “ao interesse público” como requisito
para o direito à renovação das outorgas. Já se sabe que o processo de renovação
das licenças de rádio e TV no Brasil é quase automático, sendo necessário o
voto aberto de dois quintos dos deputados e senadores, em sessão conjunta do
Parlamento, para que uma concessão não seja renovada.
Agora,
as obrigações que tinham de ser respeitadas – pelo menos segundo a letra da lei
– desapareceram. Se o (antigo) Ministério das Comunicações (hoje Ministério da
Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) já pouco fiscalizava o cumprimento
dessas “obrigações legais e contratuais”
e nada olhava para o atendimento “ao
interesse público” no momento de renovar licenças, agora isso nem mais será
solicitado.
Pelas
mudanças que entraram em vigor, as empresas também não precisam mais demonstrar
ou comprovar que possuem recursos técnicos e financeiros para participar de um
edital de concessão de outorgas.
3. Cotas pra quem quiser
Pela
regra em vigor antes da edição da Medida Provisória, qualquer alteração nos
objetivos sociais das empresas concessionárias, assim como cessões de cotas e
ações que alterassem o controle societário das empresas, deveria ser
previamente autorizada pelo Executivo.
Isso
porque, em teoria, há (mínimas) regras anti-concentração na propriedade dos
canais que devem ser respeitadas no País. Mas isso também caiu com a nova lei
de Temer. Agora, basta que as empresas informem o governo sobre as alterações
feitas.
Aquelas
que fizeram alterações ilegalmente sem a autorização prévia do ministério,
quando a lei anterior ainda valia, ganham agora 60 dias para informar o governo
das mudanças, sem qualquer prejuízo para continuarem funcionando normalmente.
O
que segue dependendo de autorização prévia do Estado é somente a transferência
total e integral da concessão para outra empresa, numa prática já bastante
conhecida, chamada “comércio de outorgas”. Na avaliação de procuradores do
Ministério Público Federal, a venda e transferência total de licenças de rádio
e TV para terceiros viola totalmente a legislação brasileira, ao ignorar
processos licitatórios e permitir o enriquecimento ilícito de empresários da
radiodifusão com a comercialização de um bem (a frequência eletromagnética) que
é público.
Mas
o governo federal sempre autorizou as transferências diretas e indiretas, e
nada nunca foi feito. Isso continua como está, claro. Mas os radiodifusores
também ganharam uma ajudinha: a transferência agora está liberada inclusive
para as outorgas que estiverem funcionando em caráter precário, ou seja, que
ainda não tiverem seus processos de renovação concluídos dentro do Estado
brasileiro.
Paulo Tonet (Albert), Michel Temer e Gilberto Kassab na cerimônia de sanção da MP 747: "liberdade". Foto: Ricardo Fonseca/ MCTIC. |
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