Acusações
criminais e citações de delatores da Lava Jato perseguem pelo menos 44 dos 81
senadores que votarão a indicação de Alexandre de Moraes para o Supremo
Tribunal Federal. Na prática, alguns parlamentares definirão o seu próprio juiz.
Sem
qualquer constrangimento, senadores sob suspeita escolherão na próxima semana o
novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Na prática, parlamentares com
problemas na Justiça ou ameaçados pela Operação Lava Jato terão o privilégio de
definir o próprio juiz. Mais da metade do Senado que votará em plenário a
indicação de Alexandre de Moraes está na mira da mais alta corte do país. Pelo
menos 44 dos 81 integrantes da Casa respondem a acusações criminais no próprio
Supremo ou enfrentam a desconfortável situação de figurar nas delações ou
planilhas da Odebrecht – e, por isso, estão a um passo de terem de se explicar
à Justiça.
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Collor e Renan estão entre os mais enrolados na Lava Jato: os dois foram denunciados por corrupção e lavagem de dinheiro. Foto: Jonas Pereira/ABr. |
Levantamento
do Congresso em Foco revela que pelo menos 34 senadores são alvos de inquérito
(investigações preliminares) ou ação penal (processos que podem resultar em
condenação) por diversos crimes, como corrupção, lavagem de dinheiro, contra a
Lei de Licitações e o meio ambiente. Oito já são réus. Um deles já poderia
estar na cadeia. Condenado pelo próprio Supremo a quase cinco anos de prisão,
em agosto de 2013, por fraude contra a Lei de Licitações, Ivo Cassol (PP-RO)
continua em liberdade e no exercício do mandato, participando de algumas das
principais decisões do país. Desde dezembro de 2014 o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, pede o início do cumprimento da pena. O senador está
pendurado em um recurso cujo julgamento poderá ser definido pelo próprio
Alexandre de Moraes.
Também
vão participar da escolha do novo ministro 13 senadores investigados na
Operação Lava Jato. Na última terça-feira (14), Moraes se reuniu com a bancada
do PMDB em busca de votos. Foi recebido pelo novo líder, Renan Calheiros (AL),
que acaba de deixar a presidência da Casa carregando uma dezena de inquéritos
da Lava Jato, apontado como beneficiário do esquema de corrupção em estatais.
No mesmo dia, o candidato também se encontrou com o senador Fernando Collor
(PTC-AL), outro denunciado na operação.
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Renan e Moraes: hoje eleitor e candidato; amanhã, réu e juiz. Foto:Debora Brito/ ABr |
Delatados
Entre
os eleitores do novo ministro também estão potenciais integrantes da bancada do
petrolão. Ao menos 22 senadores já tiveram o nome citado por executivos e
ex-dirigentes da Odebrecht. Desses, nove ainda não respondem a qualquer
processo. Entre eles, o novo presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
Um dos executivos da empreiteira afirma que “Índio”, apelido dado ao
peemedebista, recebeu cerca de R$ 2,1 milhões em propinas entre outubro de 2013
e janeiro de 2014 em troca de apoio a uma medida provisória de interesse do
grupo.
Ainda
sob análise na Procuradoria-Geral da República, a delação da Odebrecht é a
maior já feita no país e tem potencial explosivo para sacudir os três poderes.
Os estilhaços dela ameaçam o presidente Michel Temer, alguns de seus principais
ministros, figuras centrais do governo Dilma e a cúpula do Congresso.
Responsável pela indicação de Alexandre de Moraes, Temer é citado pelo menos 43
vezes na delação do ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht
Cláudio Melo Filho. Ele diz que o presidente pediu e recebeu R$ 11 milhões da
empreiteira para a campanha presidencial de 2014. O peemedebista alega que o
dinheiro foi legal e declarado à Justiça eleitoral.
Revisor da Lava Jato
Embora
Temer tenha feito a indicação de Moraes somente após o Supremo definir Edson
Fachin como substituto de Teori na relatoria da Lava Jato, o novo ministro deve
assumir a revisão dos processos da operação na corte. Como revisor, Moraes
poderá sugerir medidas para corrigir algum problema do processo, confirmar ou
divergir da posição do relator. No julgamento do mensalão, por exemplo, o
revisor, Ricardo Lewandowski, abriu caminho para atenuar a pena de alguns dos
acusados, contrariando o então relator, Joaquim Barbosa.
Antes
de se submeter ao plenário, Alexandre de Moraes terá de passar por uma sabatina
na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde seu nome será examinado, em
caráter prévio, pelos senadores. Após fracassar a manobra de governistas para
antecipar para essa quarta-feira o depoimento do ministro licenciado da
Justiça, o encontro ficou marcado para a próxima terça-feira (21).
Na
CCJ, uma das comissões mais poderosas de todo o Congresso, Moraes será recebido
pelo presidente do colegiado, o senador Edison Lobão (PMDB-MA), alvo de três
inquéritos da Lava Jato. No auditório, ficará frente a frente com 21
parlamentares, entre titulares e suplentes, investigados no Supremo cujos casos
poderá ter de julgar a qualquer momento. Além de Lobão, outros nove estão
pendurados nos processos do petrolão.
Candidato de polêmicas
Os
senadores não demonstram constrangimento com o papel de eleitores de seu
próprio juiz. Para alcançar o ápice de sua carreira jurídica, Alexandre de
Moraes também não se mostra incomodado com a necessidade de cabular votos entre
potenciais futuros réus. Depois de se licenciar do Ministério da Justiça
enquanto o Espírito Santo protagonizava uma das maiores crises da segurança pública
da história do país, ele se reuniu na semana passada com um grupo de senadores
em uma embarcação no Lago Paranoá.
Na
chalana do senador Wilder de Morais (PP-GO), o candidato ao STF jantou com
Benedito de Lira (PP-AL), denunciado na Lava Jato, Cassol, condenado à prisão,
Sérgio Petecão (PSD-AC) e Zezé Perrella (PMDB-MG), investigados no Supremo,
Cidinho Santos (PR-MT), José Medeiros (PSD-MT) e Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Todos seus potenciais eleitores.
Para
se aproximar dos senadores, Moraes tem visitado gabinetes e conversado com
parlamentares. Se virar ministro, o professor da Universidade de São Paulo
(USP) herdará cerca de 7,5 mil processos deixados por Teori Zavascki. Desde que
teve o nome anunciado como o candidato de Temer para a vaga de Teori no STF,
ele virou alvo de críticas e ataques de opositores.
Ele
é questionado por sua ligação com o PSDB, partido do qual se desfiliou apenas
na semana passada, e por ter advogado para uma cooperativa suspeita de ser
braço do Primeiro Comando da Capital (PCC), uma das principais facções
criminosas do país. Também enfrenta denúncia de plágio em sua produção
acadêmica. Por causa disso, dois deputados petistas e um advogado pediram ao
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que solicite a abertura de
inquérito contra Moraes por violação de direitos autorais. A atuação dele à
frente da Secretaria de Segurança Pública em São Paulo e do Ministério da
Justiça também é questionada pela oposição e por um grupo de juristas. No
início do ano o país enfrentou a mais grave crise do sistema penitenciário, que
resultou em mais de uma centena de mortos.
Nessa
terça-feira (14), o relator da indicação na CCJ, Eduardo Braga (PMDB-AM),
apresentou suas conclusões. Citado em delação da Odebrecht, o amazonense evitou
comentar as polêmicas em torno de Moraes. Segundo ele, o candidato ao Supremo
tem “atividade intensa nas áreas do direito constitucional, direito
administrativo e direito penal, especialmente relacionada a temas como proteção
aos direitos fundamentais, funcionamento das instituições democráticas e
combate à corrupção”. O relator ressaltou o número de publicações acadêmicas de
Alexandre de Moraes, como livros e artigos científicos. O senador afirmou,
ainda, que Moraes tem vasta experiência profissional, com atuação em diferentes
frentes na advocacia privada, no Poder Executivo, no Poder Judiciário e no
Ministério Público.
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