Estudantes protestam contra disciplina que incorpora racismo


Estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais (EAD-UFMG) divulgaram no ultimo dia (27) nota de repúdio à disciplina “Casa Grande”, ministrada pelo professor Otávio Curtiss. O motivo, segundo os alunos, é o racismo e o desrespeito de um projeto proposto em sala de aula, na qual os estudantes deveriam elaborar um projeto de alto padrão em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte.

Da RBA - O projeto prevê cinco suítes com banheiro completo e rouparia e uma zona de serviço composta de cozinha, lavanderia, despensa, depósito, quartos e banheiros para oito empregados. Segundo os alunos, o projeto “incorpora a senzala e reforça os moldes de dominação em pleno século 21”.

Após 129 anos da abolição da escravidão no Brasil, no entanto, a estrutura escravocrata ainda segue presente no cotidiano brasileiro. Como discutido em diversas disciplinas na EAD-UFMG, o quarto de empregada, por exemplo, tem como origem a segregação escravista. Ele surge como uma solução para separar empregados e patrões que permaneceram vivendo juntos após a abolição, em 1888. Com o crescimento das cidades e a verticalização urbana, as novas soluções de moradia mantiveram soluções arquitetônicas que perpetuam a separação entre patrões e empregados”, diz trecho da nota publicada pelo diretório acadêmica da Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFMG.

No texto os estudantes questionam a construção da grade curricular do curso e o modelo de arquitetura estimulado pela universidade direcionado para uma classe elitista da qual parte dos estudantes, que são negros e originários de escolas públicas, não pertencem.

Com essa proposta, o professor Otávio Curtiss reforça os padrões sociais que vão ao encontro das estruturas do Brasil Colônia e fogem da realidade da maioria dos indivíduos que compõem a população brasileira, utilizando a proposta da disciplina para justificar a produção de uma arquitetura racista”, afirma a nota. “O racismo institucional presente na Escola de Arquitetura vai de encontro a todos os esforços de inclusão expressados pela UFMG. Mais uma vez, os setores reacionários da universidade estão pouco preparados para receber a diversidade sociocultural do novo perfil de seus estudantes, reforçando suas estruturas racistas e como elas representam uma forma de dominação na sociedade atual.

Na rede social, a reclamação dos alunos tanto ganhou adeptos quanto recebeu críticas. Procurado pelo jornal Estado de Minas, o professor respondeu, por e-mail: “Não tenho interesse em entrar nessa questão. Os alunos não são obrigados a cursar essa disciplina para obterem o grau de arquitetos”.

Em seu perfil no Facebook, o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro comentou: “Não sei o que é mais esquisito, numa faculdade paga com o dinheiro da sociedade (isto é, pública): o tamanho de 800 metros quadrados, a área de empregados ou o nome da disciplina, ‘Casa Grande’".

Para os estudantes, projeto reforça as estruturas sociais do Brasil Colônia. Gravura de Frans Post.

Série de fotografias denuncia o racismo e silenciamento sofrido pela mulher preta


Fotografia: Rás Akanni.
A imagem acima faz parte da obra “O embranquecimento da mulher preta através da estética” que, por sua vez, faz parte do projeto fotográfico “Racismo em percurso”, realizado pelo fotógrafo Rás Akanni, com o objetivo de aborda as diversas facetas do racismo e suas consequências no corpo negro

Do Ceert - Rás se juntou a maquiadora Carol Romero a fim de criar as fotos que estão disponíveis na página “Afrotografia”. As imagens, que trazem elementos provocativos acerca do racismo e em embranquecimento, já alcançaram mais de 40 mil pessoas.


O objetivo é invocar na pessoa negra a memória de cada momento vivido em que ela tenha sido potencialmente silenciada, ou embranquecida esteticamente para se tornar aceita a em algum grupo, uma vez que a ideia social de beleza é racista e exclui a estética negra.

É importante acentuar que o mercado da beleza ainda tem resquícios eugenistas, onde os processos de desenvolvimento e promoção dos produtos tem foco em peles claras, em corpos magros ou robustos(…). Por este motivo escolhemos uma modelo com a melanina acentuada, pois o mercado não olha para estas mulheres com o potencial de consumo. Mulheres pretas, gordas e retintas não são vistas como concepção de beleza”, afirma Carol.

Para ver a todas as fotos que compõem “O embranquecimento da mulher preta através da estética”, acesse a página  “Afrotografia” no Facebook.

Altacity passeia em quadra e conquista título do XI Campeonato de Futsal de Altaneira


O Ginásio Poliesportivo Antonio Robério Carneiro sediou neste sábado, 30, os jogos que construíram os campeões do Campeonato de Futsal de Altaneira. 

Altacity - campeão do Xi Campeonato de Futsal de Altaneira. Foto/ Reprodução Facebook.

Diferentemente das edições anteriores, as finais deste sábado, contou com uma nova categoria – a dos Veteranos – sendo todas elas disputadas dentro do que o Departamento de Esportes denominou de I Maratona de Futsal de Altaneira. Além deles, as categorias sub 10, sub 15, feminino e adulto compuseram a competição que teve início no dia 21 de maio.

O Jogo

De volta a uma final depois de ficar de fora da X Edição quando a ARCA coroando suas boas atuações nos últimos anos disputou o título em 2015, o Altacity não poupou pernas e muito menos vontade para levar o troféu de campeão.

Mas pernas e vontade não seriam suficientes se não houvessem de igual modo, velocidade, criatividade e audácia. Sim, audácia. Os meninos do City não tomaram conhecimento do vitorioso Nice e o tempo todo e todo o tempo pressionaram, trocaram passes, armaram e o mais importante- fizeram as redes balançarem. Só no primeiro tempo foram oito. Sete para os altacityanos.

Na etapa complementar, os lances iniciais davam a impressão que o cenário avassalador ia se repetir, pois logo nos primeiros segundo Cícero fez as redes niceanas balançarem pela oitava vez. Mas só pareceria, pois de um apático Nice que assistiu o adversário jogar para um mais concentrado, porém nervoso quanto predoinou. Poucos gols.

Cícero, um dos melhores em quadra.
Foto/ Reprodução Facebook.
Mas o caminho do título já tinha sido construído e consolidado no primeiro tempo em noite inspirada de Hercules, Luan e Cícero. A beleza dos gols e da envolvente troca de passes do Altacity e apatia no Nice não disse tudo do jogo. Para além disso, a enorme quantidade de faltas das duas equipes foi um dos motivos para o nervosismo entre árbitros e jogadores, de forma bem evidente entre o atleta Cristiano (Nice) e Luciano (arbitro). Este último expulsou o jogador que ainda nem tinha entrado em quadra por reclamação. O tumulto entre os dois foi logo contornado pelos companheiros de time.

Com o passeio, o Altacity volta a levantar o troféu de campeão. As boas atuações do goleiro não só neste jogo, mas durante a competição lhe rendeu a medalha de melhor na posição.

Nas preliminares, o Humafe venceu o Serrano nas penalidades por 2 a 1 e as meninas da Escolinha EL a equipe do Distrito do São Romão e se sagraram campeãs na categoria Veteranos e Feminino, respectivamente.

Apesar do frio, o Ginásio permaneceu com um bom público do início ao fim.


Diva Guimarães, mulher negra e pobre, faz depoimento sobre resistência negra e emociona público na Flip


Diva Guimarães, mulher negra e pobre, rouba o microfone e deixa Lázaro Ramos em lágrimas. Essa poderia ser a descrição de uma das cenas mais emocionantes da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty). Porém, o momento vai muito além: Diva é um retrato do Brasil que resiste.

Do Huffpostbrasil - Em meio a uma palestra que ocorria na tarde desta sexta-feira (28), a professora deixou o público emocionado e foi recebida com muitos aplausos ao contar um pouco de sua história.

"Eu fiquei muito emocionada que você chamou atenção de que estamos em uma plateia de maioria branca. Sou do sul do Paraná, você já pode imaginar... Só sobrevivi porque tive uma mãe que passou por toda humilhação para que os filhos pudessem estudar. Fui para um colégio interno aos cinco anos. Passavam as freiras, as missões pelas cidades recolhendo as crianças como se fosse assim... Em troca de você ir para essa escola estudar, na verdade você ia para trabalhar. Eu trabalhei duro desde os cinco anos. Sou neta de escravos. Aparentemente a gente teve uma libertação que não existe até hoje."

A professora falou sobre situações de preconceitos que enfrentou ao longo da vida por ser pobre e negra. Ela, que desde criança foi ensinada sobre o que era a desigualdade, afirmou que amadureceu aos seis anos ao ouvir de uma das freiras uma história que a marcou por toda vida.

A anedota servia para justificar o injustificável, o racismo.

"As freiras contavam que Jesus - eu demorei muito para aceitar o tal de Jesus -, Deus, criou um rio e mandou todos tomar banho na água abençoada daquele maldito rio. Ai, as pessoas que são brancas é porque eram trabalhadoras e inteligentes. Nós, como negros, somos preguiçosos. E não é verdade. Esse país só vive hoje porque meus antepassadas deram toda a condição. Então, nós, como negros preguiçosos, chegamos no final dos banhos e no rio só tinha lama. E é por isso que só nossas palmas da mãos e pés são claras. Nós só conseguimos tocar isso."

E prosseguiu:

"Ela contava essa história para mostrar aos brancos como nós eramos preguiçosos. E não é verdade. Porque senão nós não tinhamos sobrevivido."

No final da fala, Diva volta a relembrar sua mãe e a importância de estudar. Para ela, ter acesso à educação foi definidor para que pudesse construir sua própria trajetória.

"Eu sou uma sobrevivente pela educação. E pela minha mãe. Ela me pedia: 'Olha bem pra mãe. Se você quiser ser como a mãe, não vá para a escola'. E eu dizia: Não vou ser igual a senhora. Então ela me mandava ir estudar. Eu ia correndo para a aula."

No final do diálogo, o ator Lázaro Ramos não conteve a emoção: "Meu coração ficou pequeninho."

Sob aplausos da plateia, Lázaro defendeu a educação pública e a valorização de todos os professores do Brasil.

Sobre o evento

A 15ª edição da Flip ocorre entre 26 e 30 de julho, na cidade histórica do litoral sul do Rio de Janeiro. Paraty será palco de reflexões e debates sobre as atuais narrativas produzidas no Brasil e no mundo.

Com curadoria da jornalista Josélia Aguiar, o evento literário mais importante do país abre neste ano espaço inédito para a diversidade de vozes da literatura negra.

E não só isso.

Pela primeira vez em sua história, a Flip traz um número de autoras que supera o de autores. Serão 22 mesas com 46 autores, dos quais 22 são homens e 24 são mulheres.

O escritor homenageado deste ano será Lima Barreto (1881-1922), autor marginal cuja trajetória foi marcada pela crítica contundente ao cotidiano racista e de segregação social no Brasil.


 
Imagem capturada do vídeo. 

'Tornei-me escritora para dar sepultura aos meus mortos'


A curadora Josélia Aguiar abriu a última mesa da quinta-feira (27) citando o fato de a Flip -Festa Literária Internacional de Paraty já ter tido uma mesas chamadas "Em Nome do Pai" e "Em Nome do Filho", mas nunca "Em Nome da Mãe", título do encontro entre a escritora ruandesa que vive na França Scholastique Mukasonga e a brasileira Noemi Jaffe.

Do CEERT - Scholastique, 61, é autora de "A Mulher de Pés Descalços" (ed. Nós), livro dedicado a sua mãe, assassinada no genocídio de Ruanda, em 1994. A escritora teve outros 26 familiares assassinados no massacre que vitimou 800 mil pessoas naquele ano, exterminando 70% das pessoas da etnia tútsi.

Jaffe, 55, escreveu "O Que os Cegos Estão Sonhando?" (Companhia das Letras) com sua mãe, uma sobrevivente do campo de Auschwitz.

"Não acho que é possível comparar graus de sofrimento, mas li na obra da Scholastique níveis de tortura que nunca encontrei em nenhum registro sobre o nazismo. Então, as shoás continuam acontecendo em locais como Ruanda ou, agora, a Síria", disse Jaffe.

As autoras foram incitadas a refletir sobre Primo Levi (1919-1987), escritor italiano que foi prisioneiro de Auschwitz e relatou os horrores do Holocausto em "É Isso um Homem?", obra que declaradamente influenciou ambas.

Scholastique afirmou ter compreendido, como Levi, o dever do sobrevivente de testemunhar, de preservar a memória do genocídio para que ele nunca seja esquecido. "Você pode ser cego mesmo enxergando, mesmo com os olhos abertos. E eu havia sido salva e tinha de salvar essa memória."

Já Jaffe explicou que a necessidade e o dever de escrever sobre a guerra são a mesma coisa. "Além de saber que tenho uma mãe que passou por tudo aquilo, eu sinto culpa por não ter passado por aquilo. Uma culpa absurda, mas que existe. Uma vontade de poder ter estado lá para impedir que acontecesse com ela aquilo que aconteceu", disse, questionando-se se não teria se tornado escritora justamente para poder "lembrar o que minha mãe precisou esquecer".

"Minha mãe viveu a tragédia e eu vivo o drama, que fica sempre aquém", disse, emocionada neste e em muitos outros momentos da conversa.

A escritora ruandesa explicou que nunca havia sonhado em se tornar escritora. "Mas o destino fez de mim escritora pelo dever de memória, porque houve o genocídio."

"Tornei-me escritora para encontrar meios de dar uma sepultura aos meus mortos. Eu tinha de tirá-los da vala comum e a solução que se apresentou para mim foi a de construir uma sepultura com as palavras. Fazer um túmulo de papel e poder assim esperar passar pelo meu luto, que não é um esquecimento."

A escritora africana contou que a mãe sempre pediu às cinco filhas que, quando ela morresse, cobrissem seu corpo com uma mortalha. "Mas eu não estava lá para fazer isso. E foi a escrita que me permitiu tecer a mortalha para cobrir o corpo de minha mãe. As palavras têm poder de reparação."

Ela falou que chama a mãe pelo nome próprio, e não de "mamãe", porque mãe é um termo universal -mas Stefania era uma só.

Créditos: Walter Craveiro/ Flip Flickr.