Papa Francisco lamenta “triste notícia” da morte de Fidel



O site Revista Fórum publicou neste sábado, 26 de novembro, nota do Papa Francisco lamentando a morte de um dos líderes da Revolução Cubana emitida ao seu irmão e presidente de Cuba, Raúl Castro.

 “EXCELENTÍSIMO SEÑOR RAÚL MODESTO CASTRO RUZ

LA HABANA

AL RECIBIR LA TRISTE NOTICIA DEL FALLECIMIENTO DE SU QUERIDO HERMANO, EL EXCELENTÍSIMO SEÑOR FIDEL ALEJANDRO CASTRO RUZ, EXPRESIDENTE DEL CONSEJO DE ESTADO Y DEL GOBIERNO DE LA REPÚBLICA DE CUBA, EXPRESO MIS SENTIMIENTOS DE PESAR A VUESTRA EXCELENCIA Y A LOS DEMÁS FAMILIARES DEL DIFUNTO DIGNATARIO, ASÍ COMO AL GOBIERNO Y AL PUEBLO DE ESA AMADA NACIÓN.

AL MISMO TIEMPO, OFREZCO PLEGARIAS AL SEÑOR POR SU DESCANSO Y CONFÍO A TODO EL PUEBLO CUBANO A LA MATERNA INTERCESIÓN DE NUESTRA SEÑORA DE LA CARIDAD DEL COBRE, PATRONA DE ESE PAÍS.

FRANCISCO PP”.

Tradução por Nicolau Neto

PRESIDENTE DOS CONSELHOS DE ESTADO E DE MINISTROS DA REPÚBLICA DE CUBA

A HAVANA

Ao receber a triste notícia da morte do seu querido irmão, sua Excelência Fidel Alejandro Castro Ruz, ex-presidente do Conselho de Estado e do Governo da República de Cuba, expresso meus sentimentos de simpatia a você e aos outros parentes do dignatário falecido, assim como ao Governo e ao povo desta nação querida.

Ao mesmo tempo ofereço orações ao senhor para seu relaxamento e confiança para todo o povo cubano e a intercessão materna de Nossa Senhora da Caridade do Cobre, padroeira do país.


Papa Francisco


Porque negros(as) admiram Fidel Castro?, por Douglas Belchior



Com a morte de Fidel Castro e a comoção da maior parte daqueles que se dedicam a luta social pelo mundo afora, alguns grupos e personalidades negras questionam o porquê de negros "idolatrarem" Fidel e seu regime "racista".

Publicado originalmente em sua página

Respeito os que criticam, mas preciso discordar e o faço com muita força. Reconheço que esse debate é complexo. Mas preciso dizer que não se trata apenas de "muita gente do movimento negro" idolatrar Fidel, mas sim de movimentos, organizações e personalidades negras de todo planeta reconhecerem o importante papel histórico de Fidel enquanto liderança que se contrapôs ao status quo mundial. Há controvérsias em sua atuação? Sem dúvida! Cuba pós revoluçao se curou do racismo? Evidente que não. Experiência essa que nos ajudou a forjar a ideia de que a revolução necessária está muito além de econômica, em especial nos aspectos de raca, genero, questoes religiosas e sexuais. Roberto Trindade, negro brasileiro que viveu 7 anos e se formou médico na Ilha nos relata:

"Em Cuba o racismo existe sim, mas não é um racismo institucional, como estamos "acostumados". É fruto de uma herança cultural de países escravocratas. Posso exemplificar com a ideia de que os santiagueros (Santiago de Cuba tem a maioria de sua população negra) são burros!!! Realmente a revolução não conseguiu desconstruir essa ideia vinda desde os tempos da colônia e essa persiste e se propaga nas "piadas", "ditados populares" e etc. Em Cuba os negros vivem melhor que em qualquer outro lugar previamente escravocrata. Existem as mesmas oportunidades e possibilidades, algo que pode parecer difícil de entender após eu confirmar que há racismo na Ilha. A revolução, plurirracial e de caráter nacional por si só já não permitiria que o racismo persistisse entre as esferas do governo".

Pra mim, particularmente, seria suficiente para admirar Fidel e sua obra uma atuação em especial Milito no mivimento de Cursinhos há quase 20 anos. Nesse período trabalhei em processos de seleção de jovens negros para fazer medicina em Cuba. Esse programa durou muitos anos e formou centenas de brasileiros latino americanos e africanos negros e pobres. Arrisco dizer que enquanto o programa durou, entre seu início e os primeiros resultados das políticas de acesse do governo Lula, Cuba formou mais negros brasileiros como médicos do que todas as universidades públicas do Brasil no mesmo período. Cleber Da Costa Firmino e José Cícero Da Silva e Roberto Trindade - que nos fez o relato acima - viveram lá, se formaram médicos e podem nos ajudar no debate.

É justo tbm lembrar o papel de Cuba e Fidel, no apoio a luta por libertação e independência de diversos países africanos frente a opressão colonial européia. Guevara, outro líder da revolução cubana, antes de ser morto enquanto guerreava na Bolivia, esteve a frente com seu batalhao cubana na guerrilha em Luta pela libertação do Congo.

Argélia foi apoiada em 1961. Enquanto lutava contra o colonialismo francês, Fidel Castro, a pedido da Frente de Libertação Nacional e fez chegar armas aos independentistas. Apoiou a luta contra o Apartheid e enviou cerca de 300.000 soldados a Angola entre 1975 e 1988 para fazer frente à agressão do exército supremacista da África do Sul. Em 1991, Nelson Mandela rendeu tributo a Fidel Castro: "Desde os seus dias iniciais, a Revolução Cubana tem sido uma fonte de inspiração para todos os povos amantes da liberdade. O povo cubano ocupa um lugar especial no coração dos povos da África."

Por fim, Sempre que sou provocado a falar de Cuba e de Fidel, deixo a seguinte pergunta, já respondida por Trindade, acima: seria exagero dizer que Cuba é o país em que os negros da Diáspora vivem melhor, em todo o mundo? Depois de uma rápida pesquisa nos índices de Desenvolvimento Humano e Desigualdades Sociais na Ilha, desde a revolução, eu arriscaria dizer que sim. Há teoricos que condenam a experiência Cubana? Sim. Mas eu prefiro ficar com a posição de Malcon X, Mandela, Ângela Davis e alguns outros dos Panteras Negras, pessoas com as quais sempre teve boa relação, e outros tantos revolucionários negras/os que o admiravam.

Fidel viverá para sempre!

Fidel Castro ao lado de Nelson Mandela e Ângela Davis - dois ícones na defesa
das causas negras. Montagem: Prof. Nicolau Neto.



Fidel, por Eduardo Galeano



 “E seus inimigos não dizem que apesar de todos os pesares, das agressões de fora e das arbitrariedades de dentro, essa ilha sofrida mas obstinadamente alegre gerou a sociedade latino-americana menos injusta

Publicado originalmente no Outras Palavras

Tradução: Eric Nepomuceno

Seus inimigos dizem que foi rei sem coroa e que confundia a unidade com a unanimidade.
E nisso seus inimigos têm razão.

Seus inimigos dizem que, se Napoleão tivesse tido um jornal como o Granma, nenhum francês ficaria sabendo do desastre de Waterloo.
E nisso seus inimigos têm razão.

Seus inimigos dizem que exerceu o poder falando muito e escutando pouco, porque estava mais acostumado aos ecos que às vozes.
E nisso seus inimigos têm razão.

Mas seus inimigos não dizem que não foi para posar para a História que abriu o peito para as balas quando veio a invasão, que enfrentou os furacões de igual pra igual, de furacão a furacão, que sobreviveu a 637 atentados, que sua contagiosa energia foi decisiva para transformar uma colônia em pátria e que não foi nem por feitiço de mandinga nem por milagre de Deus que essa nova pátria conseguiu sobreviver a dez presidentes dos Estados Unidos, que já estavam com o guardanapo no pescoço para almoçá-la de faca e garfo.

TEXTO-MEIO

E seus inimigos não dizem que Cuba é um raro país que não compete na Copa Mundial do Capacho.

E não dizem que essa revolução, crescida no castigo, é o que pôde ser e não o quis ser. Nem dizem que em grande medida o muro entre o desejo e a realidade foi se fazendo mais alto e mais largo graças ao bloqueio imperial, que afogou o desenvolvimento da democracia a la cubana, obrigou a militarização da sociedade e outorgou à burocracia, que para cada solução tem um problema, os argumentos que necessitava para se justificar e perpetuar.

E não dizem que apesar de todos os pesares, apesar das agressões de fora e das arbitrariedades de dentro, essa ilha sofrida mas obstinadamente alegre gerou a sociedade latino-americana menos injusta.

E seus inimigos não dizem que essa façanha foi obra do sacrifício de seu povo, mas também foi obra da pertinaz vontade e do antiquado sentido de honra desse cavalheiro que sempre se bateu pelos perdedores, como um certo Dom Quixote, seu famoso colega dos campos de batalha.

(Do livro “Espelhos, uma história quase universal”)

Com Angela Davis e Malcolm X durante uma visita aos EUA.

Depois do depoimento de Calero, Temer, apavorado, faz reunião de emergência


Em pânico com as reações ao depoimento de Marcelo Calero à Polícia Federal —em que o ex-ministro revela que Michel Temer também o pressionou na disputa com Geddel— o Planalto realizou ontem à noite uma reunião de emergência para tentar conter os estragos. A situação deve se agravar ainda mais agora que se sabe que Calero gravou diálogos com Temer, Padilha e Geddel. O governo avalia que a crise, antes restrita à questão do espigão em Salvador, já se tornou generalizada e ameaça o presidente. Antes seus aliados, jornais e redes de televisão já se distanciam de Temer, que vê crescer a possibilidade da abertura de um processo de impeachment.
Publicado originalmente no 247

Convencido das intenções políticas de Calero, o Planalto tenta agora desesperadamente distanciar a imagem do governo às irregularidades de Geddel. O que, diante das gravações feitas pelo ex-ministro da Cultura, parece cada vez menos viável.


Os partidos de oposição já se articulam para pedir a abertura de um processo de impeachment contra Michel Temer. Na internet, jornalistas também já deixam aberta essa possibilidade. Parte da mídia que apoiou Temer na remoção de Dilma Rousseff do cargo agora começa a virar as costas para o peemedebista.


Alunos são proibidos de apresentar trabalho sobre entidade do candomblé


Um vídeo feito na quarta-feira (23) por alunos de uma escola particular em Ananindeua, região metropolitana de Belém, viralizou nas redes sociais. No registro, um grupo de alunos diz à diretora do colégio que vai apresentar um trabalho na Feira da Cultura sobre a entidade Pombagira, entidade de matriz afro religiosa que é a mensageira entre o mundo dos orixás e a terra, mas é proibido pela gestora do local, conforme publicado no site G1.

O registro feito por celular mostra a discussão dos alunos com a diretora do Centro de Educação Trindade, localizado no bairro Águas Brancas. “Pombagira? Credo! Sangue de Jesus”, diz Ana Trindade, diretora e dona do colégio. “A senhora tem de respeitar outras religiões”, retruca o aluno Gabriel Ferreira, que propôs o tema. “Não, eu não sou obrigada a entender as outras religiões. Eu não quero e acabou!”, diz a gestora na conversa com o grupo de estudantes.

No vídeo, a diretora diz que a escola tem princípios cristãos. “Eu tenho que dizer pra vocês: aqui dentro da minha escola vai funcionar, vai se realizar e vai se apresentar o que eu achar que é de Deus. Nada de Pombagira aqui dentro”, declara Ana Trindade. “Mas a Pombagira Cigana é uma lenda cultural. A senhora respeite”, argumenta Gabriel.

Intolerância

O tema da Feira da Cultura do colégio este ano é “Construindo Valores”. De acordo com o estudante João Marcos de Souza, dentro da temática, foram determinados subtemas a cada turma da escola. ”A nossa sala ficou com ‘Lendas urbanas/Lendas Culturais’. Cada um escolheu sua lenda, fez seu projeto, alguns já tinham até comprado e alugado seus trajes. Dai alguns dias antes da Feira, chegou a história até a diretora que nós iriamos fazer ‘macumba’ na sala”, relata João Marcos ao site supracitado.

Para o aluno, a reação da diretora foi intolerante. “Ela agiu de forma preconceituosa, falando que não aceitava ‘macumba’ na escola dela. Eu achei o ato totalmente desrespeitoso e tomei a frente da situação chamando meus colegas de classe para irmos até ela, dialogar sobre o fato. Nesse momento, o vídeo foi feito pela minha amiga. Eu já tinha plena consciência que o que eu tinha acabado de presenciar era crime, porém precisava de provas para que o crime fosse julgado e penalizado”, completa.

Crime de racismo

Para a professora e doutora Zélia Amador, o episódio é um evidente caso de racismo, que precisa ser denunciado junto à polícia. “Mais do que intolerância religiosa, é racismo. A diretora tem o discurso usado há séculos de demonizar as religiões de matriz africana, segregando, diminuindo e invisibilizando”, critica Zélia, que é coordenadora do Grupo de Trabalho Afro-Amazônico da Universidade federal do Pará e fundadora do Centro de Estudos de Defesa do Negro do Pará (Cedenpa).

Para Zélia, o argumento de que a escola “é cristã” e por isso não aceita abordar outras religiões é equivocado e nocivo ao próprio ensino e formação cidadã. “A educação deve ser laica. A religião da diretora pode ser o cristianismo, tudo bem, ela tem todo o direito. Mas impor a religião dela a todos os que frequentam a escola é um problema”, destaca. A pesquisadora observa que o discurso de intolerância é a base das violências sofridas por grupo de afro religiosos. “Tivemos diversas mortes de líderes afro religiosos em Belém nos últimos meses. Isso é alarmante. Queremos que haja uma resolução por parte da Secretaria de Segurança para prevenir esse tipo de crime de ódio, intolerância e racismo e preservar a vida das pessoas”.

Procurada pelo G1, Ana Trindade disse que impediu a apresentação do trabalho dos alunos porque “pais mais conservadores não gostam que seus filhos assistam a esse tipo de tema”. “Trabalho na educação há 36 anos. Em anos anteriores já vivi experiências que foram desagradáveis por causa dessa questão. Os pais pediram a medida. Os pais é que não gostam”, declarou a diretora, que explicou que a Feira da Cultura, que será realizada nesta sexta (25), terá a participação de alunos de diversas faixas etárias, e que considera certos assuntos inadequados os estudantes menores.

Questionada sobre a segregação de religiões não cristãs na escola, a diretora disse “que não tem nada contra outras crenças”. “Tomei apenas cautela para evitar constrangimento aos alunos”.



Imagem capturada do vídeo no youtube.

Homem ataca mulher durante 13ª Marcha da Consciência Negra: "Sou machista sim, vagabunda!"


Simpatizante do MBL ataca mulher da marcha da consciência negra. Imagem
capturada do vídeo abaixo.

A 13ª Marcha da Consciência Negra, realizada no último domingo (20) em São Paulo, percorreu a avenida Paulista e a rua da Consolação até chegar ao Teatro Municipal, no centro.

Para nós agora é um momento de nos organizarmos, para estar em luta porque a conjuntura não está favorável… E também estamos aqui para lutar contra o racismo e o genocídio da população negra”, disse uma manifestante ao final da marcha.

Publicado originalmente no Pragmatismo Político

Integrantes de movimentos sociais e de defesa dos direitos da comunidade negra estiveram representados na marcha.

Neste ano, o manifesto teve como tema principal Fora Temer e Nem um Direito a Menos. Uma das bandeiras dos participantes foi a não aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) 55, que propõe o congelamento dos gastos públicos por 20 anos.

Se aprovada, a PEC atingirá principalmente os programas sociais voltados para a educação e a saúde.

Tensão

O Movimento Brasil Livre (MBL) convocou um ato para o mesmo horário e local da Marcha da Consciência Negra no domingo. Por esta razão, houve confusão quando integrantes da Marcha passaram diante do grupo liderado pelo menino Kim Kataguiri e pelo Vereador vernando Holiday (DEM).

Pessoas do movimento conservador vaiaram e insultaram participantes da marcha da Consciência Negra, principalmente os que estavam vestidos de vermelho.

Vem tirar foto do meu pau. Eu tô louco, sim! E sou machista, sim! Vagabunda”, gritou um homem para uma mulher que participava da marcha que ocorre todo ano naquele local (vídeo abaixo).

Ao Jornalistas Livres, uma integrante do movimento negro rebateu o ódio do MBL. “Eles não acham que aqui é lugar de negro. Quando eles viram a negritude aqui, vieram tomar espaço. Eles se esqueceram que a maior população do Brasil é negra”, disse Malvina Joana de Lima.

Confira o Vídeo

           

Estudo aponta que mesmo em crise, número de milionários cresce no País



Apesar da crise, 10 mil brasileiros podem comemorar. Eles passaram a ter uma fortuna acima de US$ 1 milhão, em 2016. É o que informa um estudo do banco Credit Suisse, divulgado nesta segunda-feira (21). Segundo os dados trazidos pela instituição, neste ano, o País passou a contar com 172 mil pessoas nessa situação.

De acordo com o relatório, entre 2000 e 2010, a média da renda de uma família triplicou, subindo de US$ 8 mil por adulto para US$ 27,1 mil, porém, em 2016, os dados apontam que a renda média de um adulto voltou a cair para apenas US$ 21 mil por ano. “A história da riqueza no Brasil foi uma de um boom e de uma explosão.”

Publicado originalmente na Revista Fórum

O banco da Suíça avalia que os ganhos dos novos milionários “são em grande parte inflacionários”. “Muitos brasileiros mantêm uma relação especial com ativos imobiliários, especialmente em forma de terra, como uma proteção contra futura inflação”, indicou.

Além dos 172 mil milionários no país, o estudo indica que o Brasil conta com 245 mil adultos entre a camada que representa 1% da riqueza mundial.

Ao mesmo tempo, o Brasil tem 24 milhões de pessoas com uma renda inferior a US$ 249,00 por ano. Essa população é classificada pelo banco como “o fundo” da sociedade mundial. “O nível relativamente alto de desigualdade reflete a desigualdade de renda, o que por sua vez está relacionado com um padrão desigual de educação pela população e a divisão entre os setores da economia formal e informal.”

Repercussão
Nas redes sociais, a página oficial do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), no Twitter, divulgou a notícia com a seguinte observação: “Como sempre acontece, a crise só é sentida no andar debaixo. Os ricos nunca perdem!”

O ex-ministro e deputado federal pelo PCdoB Orlando Silva afirmou: “Quem realmente ‘paga o pato’ é o povão”.


Foto: Reprodução/Youtube

Há 106 anos ocorria a Revolta da Chibata. João Cândido, o Almirante Negro, está presente



O Brasil era uma das maiores potências navais do mundo, destacando-se a sua Esquadra Branca formada pelos encouraçados Minas Gerais e São Paulo, pelos cruzadores Rio Grande do Sul e Bahia e por mais 18 navios. O Governo gastara uma fortuna para modernizar sua esquadra, mas o código disciplinar da Marinha era o mesmo do tempo da monarquia, assim como os arbitrários processos de recrutamento. Criminosos e marginais, produtos de uma sociedade que lhes negava maior sorte, eram colocados lado a lado com homens simples do interior para cumprir serviço obrigatório durante 10 a 15 anos! As desobediências ao regulamento eram punidas com chibatadas. Por isso, as revoltas ocorriam antes mesmo do ingresso na corporação.

Publicado originalmente em DNA

O decreto nº 3, de 16 de novembro de 1889, um dia após a Proclamação da República, extinguiu os castigos corporais na Armada, mas em novembro do ano seguinte o marechal Deodoro, contraditoriamente, tornou a legalizá-los: "para as faltas leves prisão e ferro na solitária, a pão e água; faltas leves repetidas, idem por seis dias; faltas graves, 25 chibatadas".

Como os reclamos dos marujos não foram ouvidos, eles passaram a conspirar. Uma primeira advertência foi feita durante a ida de uma divisão da Marinha às comemorações da Independência chilena, em que ocorreram 911 faltas disciplinares, a maioria punida com açoites: "Venho por meio destas linhas pedir para não maltratar a guarnição deste navio, que tanto se esforça por trazê-lo limpo. Aqui ninguém é salteador nem ladrão", dizia um aviso ao comandante de um dos navios, assinado por um marinheiro conhecido como Mão Negra.

Na madrugada de 16 de Novembro a Guanabara estava repleta de navios estrangeiros que aportaram para a posse do marechal Hermes da Fonseca na presidência da República. Ao raiar do dia, toda a tripulação do navio Minas Gerais foi chamada ao convés para assistir aos castigos corporais a que seria submetido o marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes. Na noite anterior ele ferira a navalhadas o cabo Valdemar, que o havia denunciado por introduzir duas garrafas de cachaça no navio. Sua pena: 250 chibatadas e não mais 25 como vinha acontecendo.

Junto à tripulação do navio havia também oito carrascos oficiais. Depois de examinado pelo médico de bordo e considerado em perfeitas condições físicas, Marcelino foi amarrado pelas mãos e pés e submetido ao castigo. Durante o castigo, Marcelino desmaiou de dor, mas a surra continuou. Ao fim das 250 chibatadas, suas costas estavam banhadas em sangue, lanhadas de cima para baixo. Desacordado, ele foi desamarrado, embrulhado num lençol e levado aos porões. Lá jogaram iodo em suas costas e o deixaram estrebuchando no chão.

A Campanha Civilista de Rui Barbosa à presidência da República, as revoltas populares ocorridas no Rio de Janeiro na primeira década do século XX e o descontentamento de diversos setores da sociedade com o tipo de República liberal que foi instaurada no país, foram fatores que fizeram parte do contexto no qual se insere a Revolta da Chibata, deixando à mostra o grande descontentamento social presente no Brasil na época anterior a I Grande Guerra. Expondo assim a inserção dos marinheiros na vida social da capital federal.

Tendo que se adicionar ainda a esse painel a falta crônica de mão-de-obra para a Marinha de Guerra, além do alistamento militar feito de maneira brutal, engajando criminosos (muitas vezes capoeiras), separando famílias e engajando homens e adolescentes por vinte anos, tempo que muitos deles não resistiam. Apesar de já existirem as primeiras Casas de Aprendiz de Marinheiros, locais destinados a órfãos e meninos pobres que eram educados para vida como praças da Marinha de Guerra, eram homens mestiços ou negros, em sua maioria, que serviam ao projeto de país e ao projeto civilizatório das massas perigosas, na visão das elites. Todavia, tais homens entrando em contato não somente com o duro labor, mas, também com populações do país inteiro sem esquecer das missões internacionais, possivelmente proporcionaram uma maior compreensão da realidade deles. Tornando cada vez mais latente e insustentável sua situação, a ponto de após a renovação de parte da esquadra de guerra, com a aquisição de encouraçados britânicos, deixou mais claro a falta de qualificação e o arcaísmo das codificações da Marinha de Guerra. Para tanto os marinheiros sublevados filtraram dos discursos políticos existentes algumas idéias para fundamentar suas revindicações como revela uma carta enviada por um marinheiro sublevado para o jornal Correio da Manhã de 25/11/1910:

Rio de Janeiro, 22 de novembro de 1910 – Ilustrado sr. redator do Correio da Manhã – É doloroso o fato que ora se passa na nossa marinha de guerra, mas, sr. redator, quem os culpados? Justamente os superiores da referida Armada, estes que deviam encarar os seus subordinados como homens servidores da pátria; pelo contrario, eles são tratados como desprezíveis e sujeitos, á simples falta, nos castigos mais rigorosos possíveis. Têm hoje como símbolo do martírio desses infelizes a palmatória, as algemas, e o chicote, e tudo isso, ilustre sr. redator, na marinha que, conforme os plano do sr. ex-ministro dizia civilizar-se. A escravidão terminou-se a 13 de maio de 1888, com a áurea lei da liberdade, e os oficiais da nossa marinha de guerra, conquanto as leis militares tivessem abolido castigos, não ligaram importância às leis militares e à disciplina, castigando os seus subordinados com ódio com que os senhores castigavam os mãos escravos. Sr. redator, é doloroso sim, ver-se a nossa marinha de hoje passar fome e todas as privações, pelo descaso dos comandantes de navios da Armada. Com um pessoal resumido e sofredor, eles querem o serviço feito a tempo e hora, sem encarar o cansaço, isto quando em viagens longas, como se deu nestas vindas das nossas unidades da Europa para aqui.

Os nossos pobres marinheiros e foguistas vieram como verdadeiros escravos, passando fome e sendo constantemente castigados com os ferros, a chibata e o bolo; em um dos últimos navios chegados, o comandante, durante a viagem, em alto mar, mandava amarrar o pobre marinheiro e fazia com este fosse lavar e pintar o costado do navio. Foguistas, estes coitados, faziam 6 horas de quarto e não tinham o direito ao descanso que, pela lei, lhes toca, porque eram logo chamados para outros serviços. O verdadeiro navio negreiro. É necessário, sr. redator, que publiqueis estas mal escritas palavras, afim de que, chegando elas ao conhecimento das autoridades competentes, possam sanar o mal, e o fato igual não mais se reproduza na nossa marinha de guerra. É necessário que os oficiais da Armada compreendam que estamos no século da luz. Abaixo a chibata, as algemas e a palmatória – Um marinheiro.”

O uso do açoite, como visto, continuou sendo aplicado nos marinheiros como medida disciplinar, como no tempo em que existia o pelourinho. Todos os marinheiros, na sua esmagadora maioria negros, continuavam a ser açoitados às vistas dos companheiros, por determinação da oficialidade branca.

Os demais marujos eram obrigados a assistir à cena infamante no convéns das belonaves. Com isto, criaram-se condições de revolta no seio dos marujos. Os seus membros não aceitavam mais passivamente esse tipo de castigo. Chefiados por Francisco Dias, João Cândido e outros tripulantes do Minas Gerais, navio capitânia da esquadra, organizaram-se contra a situação humilhante de que eram vítimas. Nos outros navios a marujada também se organizava: o cabo Gregório conspirava no São Paulo, e no Deodoro havia o cabo André Avelino.

Num golpe rápido, apoderaram-se dos principais navios da Marinha de Guerra brasileira e se aproximaram do Rio de Janeiro. Em seguida mandaram mensagem ao presidente da República e ao ministro da Marinha exigindo a extinção do uso da chibata.

O governo ficou estarrecido. Acharam tratar-se de um golpe político das forças inimigas. O pânico apoderou-se de grande parte da população da cidade. Muitas pessoas fugiram. Somente em um dia correram 12 composições especiais para Petrópolis, levando 3 000 pessoas. Todos os navios amotinados hastearam bandeiras vermelhas. Alguns navios fiéis ao governo ainda tentaram duelar com os revoltosos, mas foram logo silenciados. Com isto os marujos criaram um impasse institucional. De um lado a Marinha, que queria a punição dos amotinados, em conseqüência da morte de alguns oficiais da armada. Do outro lado, o governo e os políticos, que sabiam não ter forças para satisfazer essa exigência. Mesmo porque os marinheiros estavam militarmente muito mais fortes do que a Marinha de Guerra, pois comandavam, praticamente, a armada e tinham os canhões das belonaves apontados para a capital da República.

Depois de muitas reuniões políticas, nas quais entrou, entre outros, Rui Barbosa, que condenou os “abusos com os quais, na gloriosa época do abolicionismo, levantamos a indignação dos nossos compatriotas”, foi aprovado um projeto de anistia para os amotinados. Com isto, os marinheiros desceram as bandeiras vermelhas dos mastros dos seus navios. A revolta havia durado cinco dias e terminava vitoriosa. Desaparecia, assim, o uso da chibata como norma de punição disciplinar na Marinha de Guerra do Brasil.

As forças militares, não-conformadas com a solução política encontrada para a crise, apertaram o cerco contra os marinheiros. João Cândido, sentindo o perigo, ainda tentou reunir o Comitê Geral da revolução, inutilmente. Procuraram Rui Barbosa e Severino Vieira, que defenderam a anistia em favor deles, mas sequer foram recebidos por esses dois políticos. Uniram-se, agora, civis e militares para desafrontar os “brios da Marinha de Guerra” por eles atingidos. Finalmente veio um decreto pelo qual qualquer marinheiro podia ser sumariamente demitido. A anistia fora uma farsa para desarmá-los.

São acusados de conspiradores, espalharam boatos de que haveria uma outra sublevação. Finalmente, afirmaram que a guarnição da ilha das Cobras havia se sublevado. Pretexto para que a repressão se desencadeasse violentamente sobre os marinheiros negros. O presidente Hermes da Fonseca necessitava de um pretexto para decretar o estado de sítio, a fim de sufocar os movimentos democráticos que se organizavam. As oligarquias regionais tinham interesse em um governo forte. Os poucos sublevados daquela ilha propuseram rendição incondicional, o que não foi aceito. Seguiu-se uma verdadeira chacina. A ilha foi bombardeada até ser arrasada. Estava restaurada a honra da Marinha.

João Cândido e os seus companheiros de revolta foram presos incomunicáveis, e o governo e a Marinha resolveram exterminar fisicamente os marinheiros. Embarcaram-nos no navio Satélite rumo ao Amazonas.

Os 66 marujos que se encontravam em uma masmorra do Quartel do Exército e mais 31, que se encontravam no Quartel do 1º Regimento de Infantaria, foram embarcados junto com assassinos, ladrões e marginais para serem descarregados nas selvas amazônicas. Os marinheiros, porém, tinham destino diferente dos demais embarcados. Ao lado dos muitos nomes da lista entregue ao comandante do navio, havia uma cruz vermelha, feita a tinta, o que significava a sua sentença de morte. Esses marinheiros foram sendo parceladamente assassinados: fuzilados sumariamente e jogados ao mar.

João Cândido, embora não tenha participado do novo levante, também é preso e enviado para a prisão subterrânea da Ilha das Cobras, na noite de Natal de 1910, com mais 17 companheiros. Os 18 presos foram jogados em uma cela recém-lavada com água e cal. A cela ficava em um túnel subterrâneo, do qual era separada por um portão de ferro. Fechava-a ainda grossa porta de madeira, dotada de minúsculo respiradouro. O comandante do Batalhão Naval, capitão-de-fragata Marques da Rocha, por razões que ninguém sabe ao certo, levou consigo as chaves da cela e foi passar a noite de Natal no Clube Naval, embora residisse na ilha.

A falta de ventilação, a poeira da cal, o calor, a sede começaram a sufocar os presos, cujos gritos chamaram a atenção da guarda na madrugada de Natal. Por falta das chaves, o carcereiro não podia entrar na cela. Marques da Rocha só chegou à ilha às oito horas da manhã. Ao serem abertos os dois portões da solitária, só dois presos sobreviviam, João Cândido e o soldado naval João Avelino. O Natal dos demais fora paixão e morte.

O médico da Marinha, no entanto, diagnosticou a causa da morte como sendo "insolação". Marques da Rocha foi absolvido em Conselho de Guerra, promovido a capitão-de mar-e-guerra e recebido em jantar pelo presidente da República.

João Cândido continuou na prisão, às voltas com os fantasmas da noite de terror. O jornalista Edmar Morel registrou assim seu depoimento pessoal: "Depois da retirada dos cadáveres, comecei a ouvir gemidos dos meus companheiros mortos, quando não via os infelizes, em agonia, gritando desesperadamente, rolando pelo chão de barro úmido e envoltos em verdadeiras nuvens da cal. A cena dantesca jamais saiu dos meus olhos.

João Cândido enlouqueceu, sendo internado no Hospital dos Alienados.

Ele e os companheiros só seriam absolvidos das acusações em 1912. Tuberculoso e na miséria, conseguiu, contudo, restabelecer-se física e psicologicamente. Perseguido constantemente, morreu como vendedor no Entreposto de Peixes da cidade do Rio de Janeiro, sem patente, sem aposentadoria e até sem nome, este herói que um dia foi chamado, com mérito, de Almirante Negro.


Os que fizeram a Revolta da Chibata morreram ou foram presos, desmoralizados e destruídos. Seu líder, como visto, terminou sem patente militar, sem aposentadoria e semi-ignorado pela História oficial. No entanto, o belíssimo samba "O Mestre-Sala dos Mares", de João Bosco e Aldir Blanc, composto nos anos 70, imortalizou João Cândido e a Revolta da Chibata. Como diz a música, seu monumento estará para sempre "nas pedras pisadas do cais". A mensagem de coragem e liberdade do "Almirante Negro" e seus companheiros resiste.