Em declaração à Folha, especialista diz que “professores se aposentam cedo demais e quebram o país”


Segundo Paulo Tafner, "Não há razão que justifique que professores se aposentem cinco anos antes dos demais trabalhadores". Tafner foi sub-secretário de Fazenda do Rio de Janeiro (2010-2014), se diz "especialista" em previdência e deu tal declaração à Folha de S. Paulo (16.08.2016), sob encomenda da equipe econômica do governo interino golpista Michel Temer (PMDB).
Publicado originalmente no Mídia Popular

Pelo que expõe na Folha o tal "especialista", professores e demais trabalhadores brasileiros devem ir se acostumando com a ideia de se aposentar apenas quando completarem 65 ou mais de idade, homens e mulheres. Para ele, aposentadorias especiais dos docentes e outras devem acabar, pois ajudam a inviabilizar a previdência e quebrar o país.

Tafner afirma também que não se pode mais ter regimes diferenciados para funcionários públicos, privados, trabalhadores rurais e militares. "É preciso caminhar para um sistema único". Ou seja, um regime em que os trabalhadores se aposentem somente quando estiverem à beira da morte.

Sobre isso, diz ainda que "É possível criar uma regra de transição para todo mundo, com idade mínima de 62 anos para homens e 58 para mulheres, subindo progressivamente em 10 anos até chegar a 65 e 63 anos", conclui o "especialista".


Imagem: You Tube.

A presença de Dilma no senado representará mudança no impeachment?



A presidenta afastada de suas funções no palácio do planalto desde que o senado federal decidiu pelo prosseguimento do impeachment, irá pessoalmente fazer sua defesa marcada para o dia 29 de agosto.

Mas, como já foi dito anteriormente, o cenário histórico começa a ser desenhado quatro dias antes quando testemunhas de acusação e defesa serão ouvidas que, segundo o presidente do Superior Tribunal Federal (STF) e também do processo de afastamento, Ricardo Lewandowski, elas serão isoladas uma das outras, o que não quer dizer nada ante os fatos já consumado.

A presença de Dilma durante o circo que lhes prepararam mudará o processo? Senadores e senadoras a favor do seu afastamento definitivo e, portanto, de sua inelegibilidade por 8 anos mudaram de opinião? Para os legisladores federais de partidos aliados a presidenta, sim. O simples fato dela poder fazer sua própria defesa demonstra grandeza e que ela pode falar muito mais e com mais propriedade do que o seu próprio advogado, o José Eduardo Cardozo. E isso contribuirá para uma mudança de voto a seu favor.

Dilma fará pessoalmente sua defesa no senado.
Porém, pelo que se percebe a ida de Dilma ao congresso nacional não servirá muito. Não mudará em nada o cenário e o enredo de uma história que já tem o seu final. Um final de uma longa e deprimente narrativa construída pelo o que tem de mais sujo e podre na política brasileira e que teve seus primeiros passos logo que foi decretado o resultado final das eleições presidenciais em outubro de 2014.

A narrativa do afastamento de Dilma será apenas confirmada nos próximos 15 dias. Nada mais lhes acrescentará. Nada mais lhes diminuirá. Ela já está pronta. Senadores e senadoras repetirão o que 367 deputados naquela aberrante sessão do dia 17 de abril fizeram. Talvez também em nome de deus e da família, porque em nome de interesses próprios já é sabido que será.

Com o impeachment confirmado nos próximos dias que contou com deputados/as, senadores/as, governadores/as, prefeitos/as, vereadores/as e o apoio irrestrito de setores da mídia conservadora e reacionária, de membros da PF, do STF e do MPF, resta-nos fazer uma oposição programática e consciente de que só a força da mobilização popular pode mudar os rumos do país. Conscientes ainda de que o afastamento da presidenta entrará para os anais da historia como um fardo pesado para a democracia, como um peso em que quem mais sentirá não é Dilma, tão pouco Lula e seus assemelhados/as, mas os setores menos favorecidos deste país, ou seja, agricultores/as, negros e negras, homossexuais. Aliás, eles já estão sentindo na pele e no bolso as consequências do governo interino.

Todos os avanços sociais - poucos é verdade, se comparados com os lucros que banqueiros/as, industriais e fazendeiros tiveram - adquiridos na última década, e todos os direitos sociais conquistados a duras penas serão paralisados em detrimento do retrocesso e do conservadorismo de uma elite política branca, racista, machista e homofóbica. Os livros de história registrarão esse fato como GOLPE.

Por fim, não se deve jamais esquecer e isso que faz com o processo seja um golpe, que mais da metade de seus julgadores respondem a algum tipo de crime, inclusive lavagem de dinheiro com recursos desviados da Petrobras. Mas Dilma não. 




Sem crime, Dilma se submeterá à tortura de ser julgada por senadores investigados por crimes


Sim, a presidenta afastada, Dilma Rousseff, fez questão do direito às últimas palavras antes da sentença de perda de mandato no Senado Federal.

O desfecho histórico do processo de impeachment, marcado para o dia 25, é bizarro por qualquer ângulo que se olhe, mas sobretudo, pela ausência de crime de responsabilidade e porque mais da metade de seus julgadores respondem a algum tipo de crime, inclusive lavagem de dinheiro com recursos desviados da Petrobras.

Publicado originalmente no Brasil 247

Para esse fato, só haverá uma versão da história, já escrita na imprensa internacional, em livros e teses de doutorado em vários países.

Sobre o excêntrico interrogatório a que deve ser submetida, disse: "Nunca tive medo disso. Aguentei tensões bem maiores na minha vida. É um exercício de democracia".

Aos 20, Dilma suportou o interrogatório dos militares com pau de arara, palmatória, choques e socos que prejudicaram sua arcada dentária lutando por algo que desejava por um fim, a ditadura.

Agora tem quase 70 e luta pelo que não quer perder, a democracia.

Queiram ou não queiram os 'juízes', a decisão de fazer a própria defesa no plenário do Senado a coloca na história como uma mulher valente que teve seu lugar tomado por um homem que tem medo de vaia.


Universidades brasileiras não estão realmente “formando” professores, crava especialista


Qualquer discussão sobre formação docente no Brasil que não passe pelo nome de Bernardete Angelina Gatti sairá, de cara, empobrecida pela ausência do olhar – e de tantas pesquisas e interlocuções – de uma das intelectuais mais ativas do país neste tema nas últimas décadas. Pode-se até discordar dela, mas não prescindir de seus pontos de vista.

Atual diretora vice-presidente da Fundação Carlos Chagas, onde orienta o setor de pesquisas, e membro do Conselho Estadual de Educação (São Paulo), esta professora graduada em pedagogia pela Universidade de São Paulo e doutora em psicologia pela Universidade Paris 7, sob orientação de Paul Arbousse-Bastide, um dos docentes franceses que ajudaram a fundar a USP, Bernardete é categórica em suas afirmações.
Publicado originalmente no Cenpec

Acredita, sobretudo, no trabalho coletivo das escolas e nas ações integradas entre estas e as universidades, desde que haja disposição mútua para interlocução. E que as inovações verdadeiramente significativas vêm e virão dessas interlocuções.

Para saber qual formação de professores queremos, não deveríamos antes saber para que educar e qual educação queremos?

Não tenho dúvida disso. Sem uma ideia projetiva da educação básica, discutir a formação de professores fica em cima de pressupostos, ou de alguns conhecimentos objetivos da formação dada atualmente, e daquilo que vem sendo colocado, de modo desarticulado, por vários segmentos da sociedade. Não reconhecemos e nem sempre percebemos como se manifestam os múltiplos olhares e discursos sobre a formação de professores e as demandas da escola. Em geral, ficamos nas grandes dicotomias, mas hoje a sociedade é muito mais heterogênea. Há variadas formas de requisitos para a educação e segmentos sociais que pensam de modo muito divergente.

Poderia dar exemplos?

Há segmentos que acham que a formação acadêmica, na educação básica, deveria centrar-se em dar ao aluno o necessário para trabalhar com conhecimentos científicos, matemáticos, com as questões da vida, da biologia. Defendem uma formação genérica, o que não quer dizer leve. Lembrando, em relação à discussão do currículo, que já tivemos em nossa história, nos anos 80, uma formação mais genérica, com um núcleo duro de disciplinas, mas com flexibilidade para preencher parte desse currículo com questões locais e regionais. Não foi adiante, pois a discussão não se resolveu. Há outros segmentos que defendem que a educação básica deveria ser eminentemente pragmática, ou seja, dar apenas aqueles instrumentos para a vida cotidiana, basicamente língua portuguesa e matemática útil – que trabalhe com aplicações, não a matemática acadêmica ou para formar o pensamento, a lógica. E outros que demandam uma revolução na formação, iniciando-se até mesmo na pré-escola, trazendo os dilemas de ponta do conhecimento para formação tanto de crianças como de jovens e adolescentes. E há outras. Por enquanto, o que está mais em pauta é a ideia de dar uma formação mais genérica, básica, culminando com uma formação mais literária e científica no ensino médio. Tem também outra posição, que propugna que haja um currículo diversificado a partir do ensino fundamental 2. Ou seja, os alunos que têm preferência por formação humanista teriam um currículo diversificado, diferente daqueles que mostram interesse por uma formação mais das ciências exatas, ou de tecnologias. Muitos acham que essa flexibilização deveria começar no 8º ou 9º anos, porque aí o adolescente já começa a manifestar suas motivações e preferências cognitivas.

Qual o melhor caminho?

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Pensei que, com a discussão da Base Nacional Comum, fôssemos chegar a um ponto de consenso, mas essas questões dos diferenciais não foram levantadas. Estamos sempre trabalhando em cima de um modelo já culturalmente incorporado às representações de certas lideranças, e não conseguimos sair disso para ver o conjunto de demandas e concepções presentes para achar um caminho intermediário. As discussões se polarizaram demais.

A Base chega meio atropelada?

Chega sem trazer um pensamento renovador. Precisaríamos pensar a estrutura curricular da educação básica de maneira mais criativa, nos liberando um pouco desses arcanos que existem na cultura desde o século 19. A proposta da educação infantil me parece que supera algumas concepções arraigadas sobre o trabalho com a criança. Mas não vejo isso nos outros segmentos, em que ficamos numa discussão de conteúdos disciplinares específicos. Esse pode ser um ponto de partida, mas não de chegada. Para avançar, seria preciso que grupos diferenciados entrem em um debate mais ampliado, vendo os modelos que daí surgiriam, e trabalhando sobre eles.

Como vê a formação oferecida pe­las universidades públicas pa­ra a docência?

De modo geral, nem as públicas nem as privadas estão realmente formando professores. A crítica às universidades públicas é que elas não faziam uma associação adequada entre as teorizações e as práticas, que é um movimento de interdisciplinaridade, difícil, inclusive para os professores doutores que estão nessas universidades, pois a formação deles é disciplinar, e não interdisciplinar. Como de certa maneira abandonamos os estudos de didática e das práticas de ensino com teorizações adequadas e fortes, eles também não têm onde se apoiar. No Brasil, deixamos de lado essas questões, confundindo didáticas e práticas de ensino com tecnicismo, confusão que estamos começando a desfazer. Não tenho dúvida de que as universidades públicas formam um corpo discente um pouco melhor, pois já trabalham com um grupo selecionado, estudantes que vêm para a universidade com vontade de estudar. E têm um currículo acadêmico bem mais forte. Então, saem com uma formação acadêmica melhor, mas não com uma formação para ser professor.

Como vê as licenciaturas com modelo de formação interdisciplinar, tal como a Faculdade do Sesi/SP está propondo? Não há o risco de faltar a base disciplinar?

A ideia, nesse caso, é partir do problema complexo que emergirá da associação dos conteúdos das disciplinas com os conteúdos da pedagogia, para recuperar o que é da disciplina. É um caminho inverso. Dou um exemplo na formação da medicina. Muitas faculdades hoje têm a base propedêutica que tínhamos e temos em muitos cursos. Ou seja, você tem anatomia, fisiologia, todas essas disciplinas de base, mas que agora já partem para analisar situações-problema. Com esses estudos de caso, o aluno tem de recorrer ao conhecimento disciplinar, mas já com uma visão interdisciplinar. E funciona. A Universidade Harvard, por exemplo, está com uma proposta nessa linha, mas não é a única, pois antes Oxford, na Inglaterra, e outras já fizeram isso. Aqui mesmo já tivemos experiências em Marília e outros lugares com esse tipo de formação. Isso exige que os professores formadores já tenham feito seu caminho disciplinar e interdisciplinar. E não de uma área, mas de duas ou três. Se você vai lecionar história da educação, tem de ter conhecimento da historiografia, da antropologia, da sociologia e trazer essa visão interdisciplinar para a história da educação. Se não, fica ali no fato histórico. Os grandes historiadores dão um salto, porque têm uma cultura interdisciplinar ampliada. Ao professor se poderia dar essa cultura interdisciplinar ampliada. Poderíamos ter cursos que formam a partir de situações-problema. Quando a resolução no 2 de 2015 do Conselho Nacional de Educação propõe que o aluno comece o estágio logo no primeiro ano, não é para ele dar aula, e sim para que possa ver a escola e problematizar a sua realidade, saber o que é ser um profissional professor, de forma concreta. Com isso, pode-se construir um currículo bem diferenciado.

Temos exemplos?

Vi alguns currículos muito interessantes aqui no Estado de São Paulo, houve renovações muito grandes em áreas disciplinares aqui na USP como, por exemplo, filosofia, matemática, física, até na ECA (Escola de Comunicações e Artes), propostas para formar professores de modo diferente. Mas ainda são casos isolados. Na Unicamp, tem um belíssimo programa de licenciatura de física e química, bem feito, bem pensado. Você pode pensar em formações polivantes de diferentes naturezas. A proposta do Sesi caminha nessa direção, mas o projeto ainda não nos dá a ideia do que vai ser o currículo concreto, pois ainda é um projeto em construção.

E na América Latina?

Vi uma abordagem interessante em Buenos Aires. Há um horário das disciplinas-base – antropologia, história da educação, sociologia – só que tem um momento disciplinar, com muitas horas, em que esses professores trabalham com os alunos na observação de escolas e comunidades. Os alunos trazem suas observações e os professores fazem interpretações à luz da sua disciplina sobre aquela situação. E formam um consenso multidisciplinar complexo sobre ela. Os alunos vão aprendendo a olhar as realidades escolares, usando conhecimentos disciplinares, mas com um olhar integrado. Só que isso exige do professor uma dedicação muito grande, pois tem de trabalhar com os outros. E isso é feito nos quatro eixos de formação para o professor. Nas universidades públicas, não seria difícil termos projetos inovadores, pois muitos docentes são contratados em regime de dedicação exclusiva; poderia haver uma presença maior, mais integrada, nas atividades de ensino. Já nas particulares, isso é bem mais difícil, pois veriam isso como custo. Mas não é impossível.

E a proposta do conselheiro do CNE César Callegari de fazer com que todas as faculdades de pedagogia, públicas ou privadas, tenham uma escola, de sua propriedade ou associada?

Não acredito nisso. Essa escola vai ser tão diferente da rede que não servirá de inserção real do professor. Já vivemos isso, com os colégios de aplicação. Defendo que uma faculdade ou universidades que têm licenciaturas deveriam ter convênio com um conjunto de escolas em várias partes do estado ou da cidade, de tal maneira que seus alunos possam percorrer realidades diferentes. É muito diferente estar numa escola pública, mesmo que atenda uma população mais ou menos da mesma natureza, no centro de São Paulo ou em Itaquera. Há culturas diferenciadas de quem está aqui e de quem está lá, inclusive das famílias. Prefiro convênios com as redes públicas que organizassem o estágio e em que se pudesse atuar nas escolas com um projeto compartilhado com elas. No caso dos colégios de aplicação, às vezes a faculdade manda no colégio, aí ele se torna uma exceção da exceção da exceção, começa a selecionar os alunos.

Como definir um currículo nacional de formação docente?

A resolução no 2 de 2015 dispõe sobre isso, está lá a Base Nacional Comum de Formação de Professores. Não está definido nos detalhes, mas estão definidos os conhecimentos importantes que um professor deve ter. Pela legislação, é de alçada do CNE definir as diretrizes nacionais de educação, elas são mandatórias. Todos os estados, municípios, instituições públicas e privadas têm de se alinhar. E aí está a inteligência que vejo nas novas diretrizes, embora sejam um pouco cheias de detalhes argumentativos, mas na essência trazem a possibilidade de ser criativo e, ao mesmo tempo, ter uma diretriz clara. Isso é uma qualidade da resolução. Tomara que as instituições tenham competência e vontade política para mudar a formação de professores. O CNE lançou as bases, todas as instituições terão de começar a adaptação a partir do 2o semestre de 2017. Sei que há mobilizações, pois tenho sido convidada para um monte de coisas, mas não sei se todas o farão. Pela resolução, a formação tem de ser feita em pelo menos 4 anos e 8 semestres, não sei como as particulares vão se adaptar a isso. Uma verdadeira transformação nessa formação só viria se houvesse uma integração entre todas as licenciaturas, num centro de formação de professores, num lócus em que as faculdades de educação, de física e química contribuíssem para formar um profissional professor. É uma coisa que discuto há muitos anos: por que existe uma faculdade de medicina, de engenharia e não existe uma faculdade de formação de professores?

E aí juntaríamos os conhecimentos disciplinares com as ciências da educação…

Isso, não é para dissolver faculdades de educação ou o instituto de base que contribui, mas para juntar e, ao fazer isso, teria de haver uma coordenação vivaz que permitisse a interlocução entre eles e a geração de projetos formativos diferenciados. Como a Base Comum, que é você ter uma cultura ampliada nos fundamentos da educação e uma formação bem assentada em didáticas e práticas de ensino. Se essas competências que estão distribuídas fossem condensadas, teríamos a possibilidade de construir a interdisciplinaridade a partir da disciplinaridade, mas propondo um currículo que renovasse a formação. Isso leva tempo? Sim, mas se começarmos já, teremos o tempo de fazê-la.

Não é preocupante o nível de desistência de jovens docentes em início de carreira?

Dos poucos dados existentes sobre isso, não dá para falar que a maioria desiste. Há grande procura pelos cursos de pedagogia. Claro que muita gente que busca esses cursos não quer ser professor e o curso tem seus problemas para formar alfabetizadores. O que nós não temos é procura para disciplinas como história, geografia, ciências sociais. Há poucos cursos para o tamanho do Brasil. Os gaps são nessas áreas. Agora falando em gestão de educação no nível dos estados e municípios, os professores iniciantes não recebem apoio suficiente para que se sintam com um referencial na rede, apoiados através de material, orientação, suporte, eles é que têm de procurar os colegas para se orientar. Se há um coordenador pedagógico sensível a isso na escola, procura dar esse apoio, essa formação. Mas a desistência não é alta, e vou dizer por quê: os licenciandos que procuram trabalhar como professores provêm de camadas sociais menos favorecidas. O salário de um professor é um diferencial para eles. Não é para a classe média, média alta, mas sim para essa camada ascendente. Ele fica na carreira, pois sabe que dali a cinco anos tem X% de aumento, tem estabilidade. Mesmo nas licenciaturas mais sofisticadas, como física, química, matemática, eles têm um nível socioeconômico menor do que os que procuram outros cursos, é um salto social.

E como anda a formação dos coordenadores pedagógicos? Modernizou-se nos últimos anos?

Teoricamente, sim, pois temos bons autores e boas pesquisas sobre a coordenação pedagógica. Na prática, há muitos problemas. Primeiro porque, se você define que o coordenador pedagógico deva ser aquele que vem da pedagogia, o curso não sabe bem o que forma. O diálogo desse formado com pessoas da história, da matemática, da geografia, mesmo tendo feito alguma especialização em coordenação pedagógica, não é fácil, justamente porque ele não tem uma formação interdisciplinar que lhe permita um diálogo fecundo. Não se sustenta o discurso de que “ah, ele pode ver o aspecto pedagógico”. Não há aspecto pedagógico independente de conteú­do, da linguagem daquela área. São linguagens específicas e, se ele tem dificuldade, não é bem recebido. Em outros sistemas, o coordenador pedagógico pode vir de qualquer área – um professor de matemática ou de história que se candidata ao cargo. Em geral, recebe uma formação continuada para isso. Nesses casos, são muito poucos os professores de outras áreas que se candidatam a ser coordenadores pedagógicos. É mais comum que se candidatem a ser coordenadores de área – ciências, matemática, ciências humanas etc. – nas redes onde isso existe. Nas poucas pesquisas que tenho lido sobre esse tipo de coordenação, ela funciona bem. Não temos ainda uma opção clara de que tipo de coordenação pedagógica queremos ter nas escolas. Defendo que deveria haver um curso de pós-graduação, um mestrado profissional voltado à formação de coordenadores pedagógicos. Aí poderia vir de qualquer área, mas teria uma formação psicopedagógica forte, didática, interligada a diferentes conteúdos, linguagens e lógicas. Essa é a formação que precisaríamos ter, mas para isso precisaríamos de uma indução, em nível federal ou esta­dual, o que demanda financiamento.

Hoje, fala-se muito em metodologias ativas de ensino, como instrução por pares, estudo de caso etc. O que é propriamente novo e o que tem mais potencial de estimular o aluno?

Pois é, há muita novidade que não é novidade, e muita novidade que não funciona na escola. A sala de aula invertida, por exemplo, só pode ser fecundamente utilizada após um tempo de aculturação da criança na vida escolar. Porque ela vem de uma vida familiar, ou comunitária, ou de rua, um tanto indisciplinada, solta, e a vida escolar exige concentração e atenção.

Seria mais para o ensino médio…

Sim, e mesmo assim você teria de ter tanto recurso… A nossa população ainda não tem uma situação socioeconômica e cultural equitativa, somos muito desiguais, a maioria não conta com recursos culturais acessíveis, por mais que use celular. Nos entusiasmamos com coisas que às vezes não têm muita objetividade. Então, desconfio de alguns modismos. São coisas muito deste momento da sociedade contemporânea, da imagem, do novo, ou de travestir de novo algo que não é efetivamente novo.

Mas de todas essas coisas, você destacaria algo que tem mostrado bons resultados?


Vi, por exemplo, de estudos de caso de escolas públicas de Chicago, de escolas públicas na França e na Itália que o que funciona mesmo é uma equipe escolar mais fixa, mais perene, que compartilha um período maior dentro da escola. Nos EUA há vários estudos de caso que mostram isso. Esse compartilhamento deve ter um sistema de apoio bem desenvolvido – não de imposição, de apoio –, com material pedagógico, possibilidades. E deixar a comunidade ser criativa. A inovação em geral é produzida em pesquisas que a universidade faz e propõe. Por exemplo, tivemos o Pibid. Não foi tudo, mas a maioria dos projetos trouxe inovações importantes, em termos de construção e teste de material didático, de organização de feiras de ciências com novos modelos. Quando você dá condições e põe interlocutores qualificados, há criatividade nesse universo. A chave é criar condições para compartilhamentos efetivos, no caso da escola com equipes fixas, e no caso da universidade, de os professores conversarem, manterem uma interlocução constante – para definir currículo, quem vai trabalhar com o quê. Tem professor que nem sabe o currículo de formação docente da sua escola. Vai lá e apenas dá a sua aula.


Cultura do estupro: o que a miscigenação tem a ver com isso?



Em um país em que a cada 11 minutos uma mulher é estuprada não se pode tratar essa questão como um tema pontual. O fato de essa violência ser sistemática comprova que existe uma cultura de violência contra a mulher, porque também vivemos em um país em que, a cada cinco minutos, uma mulher é agredida.

Porém, é importante dizer que essa cultura do estupro existe desde o período da escravidão. Mulheres negras escravizadas eram violentadas pelos senhores de escravos e forçadas às mais variadas formas de violências. A filósofa Angela Davis, em Mulher, raça e classe, aborda o fato das mulheres negras não serem tratadas como frágeis e castas, ao contrário, tiveram de realizar trabalhos forçados que precisavam do uso da força.

Publicado originalmente na Carta Capital

Davis inicia o livro com o capítulo “Legado da escravatura: bases para uma nova natureza feminina” falando sobre o modo pelo qual a mulher negra escravizada era tratada de modo a ofuscar uma “natureza feminina”, uma vez que elas eram forçadas a desempenhar o mesmo trabalho dos homens negros escravizados.

O que as diferenciavam dos homens, e essa se torna uma diferença crucial, era o fato de terem seus corpos violados pelo estupro. Essa outra construção de feminino irá contrastar diretamente com a qual as mulheres brancas lutarão para derrubar: a da mulher frágil, submissa e dependente do homem. A mulher negra ter sido submetida a esse tipo de violência evidencia uma relação direta entre a colonização e a cultura do estupro.

No Brasil, as mulheres negras tiveram a mesma experiência. Importante ressaltar que a miscigenação tão louvada no País também foi fruto de estupros sistemáticos cometidos contra mulheres negras. Essa tentativa de romantização da miscigenação serve para escamotear a violência.

Mulheres negras escravizadas foram violadas sistematicamente no período colonial. E, atualmente, ainda é esse o grupo o mais violentado, também em caso de violência doméstica. Segundo dados da Unicef na pesquisa Violência Sexual, o perfil das mulheres e meninas exploradas sexualmente aponta para a exclusão social desse grupo.

A maioria é de afrodescendentes, vem de classes populares, tem baixa escolaridade, habita em espaços urbanos periféricos ou em municípios de baixo desenvolvimento socioeconômico. Muitas dessas adolescentes já sofreram inclusive algum tipo de violência (intrafamiliar ou extrafamiliar).

Por mais que todas as mulheres estejam sujeitas a esse tipo de violência, já que é sistemática, se faz importante observar o grupo que está mais suscetível a ela já que seus corpos vêm sendo desumanizados historicamente, ultrassexualizados, vistos como objeto sexual. Esses estereótipos racistas contribuem para a cultura de violência contra essas mulheres, pois elas são vistas como lascivas, “fáceis”, as que não merecem ser tratadas com respeito.

Um exemplo dos estigmas que estão colocados sobre os corpos das mulheres negras é o caso de Vênus Hotentote. Seu nome original é Sarah Baartman. Nascida em 1789 na região da África do Sul, no início do século 19 foi levada para a Europa e exposta em espetáculos públicos, circenses e científicos devido aos seus traços corporais.

Segundo Damasceno (2008), Sarah Baartman deu um corpo à teoria racista. Não importa aonde vamos, a marca é carregada. Mesmo após sua morte, seu corpo seguiu sendo explorado. Partes de seu corpo, incluindo as íntimas, ficaram à exposição do público no Museu do Homem, na França, até 1975. Apenas em 2002, seus restos mortais foram devolvidos à África do Sul a pedido de Nelson Mandela.

Com base nesses fatos históricos podemos dizer que no Brasil há uma relação direta entre colonização e cultura do estupro. E nós precisamos falar sobre isso.

As mulheres negras foram e continuam a ser as principais vítimas das violência contra a mulher.

Vitória da Educação: Deputados de Estado do Sudeste barram o PL “Escola Sem Partido”


A Comissão de Educação e Cultura da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) barrou, nesta terça-feira (16), o projeto da Escola Sem Partido no Estado de São Paulo. Os deputados decidiram se posicionar contra a aprovação do projeto de lei número 1.301/2015 por considerarem que ele ia contra a liberdade dos educadores de promover uma educação livre.

Publicado originalmente no R7

O relator foi o deputado Carlos Giannazi (PSOL). Segundo ele, essa foi “uma vitória da sensatez e da democracia”. O parlamentar apresentou um projeto que se contrapõe ao Escola Sem Partido, o chamado Escola Com Liberdade (projeto de lei número 587/2016).


Será feita uma audiência pública para debater o projeto Escola Sem Partido no dia 25 de agosto, às 19h, no plenário José Bonifácio, na Alesp. Professores, alunos, pais e entidades estarão presentes nas discussões.

Deputados decidiram se posicionar contra a aprovação. Cris Faga/11.08.2016/Fox Press Photo/Estadão Conteúdo.

Deputado Federal do Psol apresenta Projeto de Lei “Escola Livre”


 Uma escola para a democracia não é uma escola "sem partido", mas com muitos partidos, com muitas ideias, com muito debate, com muita análise crítica do mundo. Uma escola para a democracia é uma escola sem preconceito, sem ódio, sem bullying, sem autoritarismo e sem discriminação. Uma escola para a democracia é uma escola laica e respeitosa de todas as crenças e da ausência delas. Uma escola para a democracia é uma escola que pratica a democracia no seu cotidiano.

Por tudo isso, apresentei hoje um projeto de lei (PL 6005/2016) que cria o programa ‘Escola livre’ em todo o território nacional”, foi com essas palavras que o deputado federal pelo Psol, Jean Wyllys iniciou a discussão da matéria em seu portal.

Ao complementar, diz “Enquanto os fascistas, os macarthistas e os fundamentalistas religiosos falam em "Escola sem partido" e travam uma estúpida guerra contra uma inexistente "ideologia de gênero", eu quero defender uma escola livre. Uma escola democrática, plural, inclusiva, aberta a todos os debates. Livre de censura. Livre de preconceitos e discursos de ódio. Livre de burrice e autoritarismo. Livre para educar para a liberdade!”.



Vídeo sobre Escola Sem Partido é autoritário e induz ao voto, afirma advogada



A polêmica envolvendo o projeto de lei Escola Sem Partido ganha mais um capítulo. Na página online da consulta pública do Senado Federal foi publicado um vídeo em que o senador Magno Malta (PR-ES) defende sua proposta e pede votos a favor do programa. O problema é que apenas argumentos favoráveis estão presentes para avaliação dos internautas.

Na opinião de Nina Ranieri, especialista em direito educacional e professora de direito da USP (Universidade de São Paulo), o fato de constar apenas um ponto de vista numa consulta aberta à sociedade fere o direito do cidadão, pois não dá subsídios para uma interpretação correta dos fatos.

Publicado originalmente no Uol

"Não só induz [o voto das pessoas], como é muito pouco democrático. Chega ser até autoritário ter só um argumento. Isso revela muito o viés do próprio projeto. Essa proposta de tornar neutra a educação tem um fundo altamente político. A preocupação não é com os estudantes", afirma Ranieri.

A consulta pública já bateu o recorde de votações na história do site do Senado. Até o fechamento do texto, 371.851 votos haviam sido contabilizados (180.633 a favor e 191.218 contra o projeto) -- a segunda proposta com mais participação (191.532 votos) é a do projeto que propõe a reformulação da lei do Ato Médico. O espaço foi criado para que os cidadãos possam opinar sobre projetos de lei, medidas provisórias e outras proposições que tramitam no Senado.

De acordo com um dos responsáveis pelo site e-Cidadania, onde está a consulta em que o vídeo foi publicado, qualquer senador pode solicitar a publicação de um vídeo sobre o projeto de sua autoria. A única ressalva é que o conteúdo do vídeo esteja diretamente relacionado à proposta. A responsabilidade sobre o material é total da assessoria do respectivo senador.

O funcionário explicou que, por enquanto, apenas um vídeo por projeto de lei pode ser veiculado em cada consulta pública, mas que melhorias estão sendo planejadas. Apenas três propostas possuem publicações dos autores.

Como solução para o caso, Ranieri sugere que o vídeo do senador Magno Malta seja retirado da página da consulta pública enquanto os argumentos contrários não forem acrescentados.

Os argumentos do projeto

No vídeo de pouco mais de 5 minutos, o senador defende que o aluno não tem que estar na sala de aula para ouvir "e ser incutido em sua mente aquilo que o professor quer como, por exemplo, o nazismo (...), doutrinas machistas ou doutrinas feministas ou LGBT."

Em sua conclusão ele ainda ressalta: "Nós precisamos de uma escola que ensine e não que pregue ideologia, não de uma escola que ensine política, que ensine religião."

Claramente contrária ao projeto de lei, a professora defende que, segundo o artigo 206 da Constituição Federal, o ensino deve estar baseado na liberdade de aprender e de expressão. Entre os princípios que devem gerir o ensino, o documento ainda assegura o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.

Outro lado

A reportagem tenta contato com o senador Magno Malta desde terça-feira (9), mas até o fechamento do texto não obteve retorno. A primeira solicitação foi realizada na terça-feira (9) por e-mail --em meio a tentativas de contato via telefone. No dia seguinte, uma nova mensagem foi enviada para confirmar o recebimento do pedido e não houve retorno. Nesta sexta um novo e-mail foi enviado, mas sem sucesso.

Entenda a polêmica

O movimento "Escola sem Partido" defende a "neutralidade do ensino" por meio da proibição de suposta "doutrinação ideológica" nas escolas.

A inspiração para o projeto de lei no Senado – a qual embasa outros quatro projetos do tipo, na Câmara dos Deputados, e além de sete Assembleias Legislativas e 12 Câmaras municipais – é a proposta idealizada em 2004 pelo advogado Miguel Nagib, procurador paulista.


No último dia 22 de julho, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do MPF (Ministério Público Federal), encaminhou ao Congresso Nacional uma nota técnica em que aponta a inconstitucionalidade do projeto de lei 867/2015, que inclui o programa Escola sem Partido entre as diretrizes e bases da educação nacional. O projeto de lei tramita na Câmara, com autoria do deputado Izalci Lucas (PSDB-DF), mas, segundo o MPF, a nota valerá também "para todas as proposições legislativas correlatas".

Imagem capturada do vídeo na página de consulta pública do Senado Federal.