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Retrospectiva 2016: Estudantes abraçam a resistência. Que o Brasil os acompanhe


Jovens da ocupação do Colégio Estadual Central, em Belo Horizante, demonstram união e solidariedade.

Ana Júlia, defesa de um país mais justo, baseado no que
determina a constituição, virou simbolo das lutas.
Foto: Pedro de Oliveira/ALEP
Quem, há alguns meses, ou dias, poderia imaginar que uma das principais respostas aos retrocessos que o país vem passando viesse de jovens, principalmente que cursam o ensino médio, e em estados como Paraná e Santa Catarina e no Distrito Federal, que estão entre os mais conservadores do Brasil? A reportagem da Revista do Brasil visitou escolas, entrevistou estudantes e participou de oficinas em locais ocupados para tentar entender quem são e o que pretendem esses novos ativistas, que têm entre 13 e 18 anos e não haviam ainda participado de um movimento social.
Da RBA

Antes de vir para cá, a gente não tinha nenhuma vinculação política, partido, nada”, diz Maria, uma das líderes de ocupação numa escola na periferia de Curitiba – os nomes dos estudantes usados na reportagem são fictícios. “Algumas pessoas falaram que o PT estava fazendo nossa cabeça, coisa assim. Mas a gente veio por conta própria. Fizemos assembleia e os alunos decidiram”, diz a aluna do Colégio Estadual Olívio Belich, no bairro do Cajuru, na região leste de Curitiba.

A gente nem se conhecia direito antes, não tem militância até hoje. Sou contra todos os partidos”, complementa Paulo, do Colégio Estadual Teotônio Vilela, na Cidade Industrial, também em Curitiba. O que os move, mais do que questões do ambiente escolar – como a tentativa de alterar a base curricular do ensino médio por meio de uma medida provisória – diz respeito a ataques do governo de Michel Temer que, segundo eles, põem em risco o futuro de políticas públicas afetarão as próximas gerações.

Queremos barrar a reforma, mas não é só isso, lutamos contra a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que tira dinheiro da saúde e da educação, contra a reforma da Previdência... A saúde e a educação já são precárias e ainda querem tirar dinheiro”, afirma Larissa, do Olívio Belich. “O que a gente mais queria era o apoio das pessoas que vão perder com isso. Mas a maioria não consegue enxergar. Até porque as leis são escritas pro pessoal da elite. O pessoal mais carente não entende o que vai perder”, avalia Marina, do Teotônio.

A desatenção da maioria das pessoas em não reconhecer o que está acontecendo com o país lembra um pouco o que ocorreu com movimentos globais, como a chamada Primavera Árabe e o ­Ocuppy, nos Estados Unidos. No livro Occupy (Editora Boitempo), o geógrafo britânico David Harvey, ao escrever sobre o que levou pessoas a tomar as ruas do coração financeiro dos Estados Unidos, diz que aquela luta é contra o que chama de Partido de Wall Street, que “domina muito do aparato estatal, do Judiciário, em particular a Suprema Corte, cujas decisões partidárias estão crescentemente a favor dos interesses venais do dinheiro, em esferas tão diversas, como a eleitoral, a trabalhista, ambiental e comercial”.

Para Harvey, muitas pessoas decentes estão presas a um sistema que está podre. “Se querem um salário razoável, não têm outra opção além de render-se à tentação do diabo.” Ele observa que leis “coercitivas” da competição forçam os cidadãos a obedecer as regras desse “sistema cruel e insensível”. “O problema é sistêmico, não individual.” De acordo com o britânico, os mais ricos acionam uma enorme variedade de opiniões de “especialistas” e colunistas espalhados na mídia que eles controlam. “Em um momento, só se fala da austeridade necessária a todas as outras pessoas para tratar do déficit e, em outro, propõe redução de sua própria tributação sem se importar sobre o efeito que terá sobre o déficit.”


No Brasil, essa situação é exemplificada na discussão sobre a PEC 241, agora com o número 55 no Senado. A justificativa é de que para diminuir o déficit público serão congelados por 20 anos os investimentos em saúde, educação, desenvolvimento tecnológico, agricultura etc. Ao mesmo tempo, não há previsão de limitar o pagamento de juros da dívida pública brasileira, responsável por cerca de 90% desse mesmo déficit. São os mandamentos de Wall Street.

Ocupação se espalharam no Paraná, com regras, debate e causa bem definida contra a Pec e a imposição da reforma do ensino médio. Foto: Maíra Kaline (Estudante de Comunicação Organizacional UTFPR)

Marina: 'O que a gente mais queria era o apoio das pessoas que vão perder com isso. Mas a maioria não conseguem enxergar. Até porque as leis são escritas pro pessoal da elite. O pessoas mais carente não entende o que vai perder'.Foto: Facebook Ocupação Paraná.

Manifestação no Paraná: organização com regras. Foto: Maíra Kaline.
Poder da mídia

Alunos entrevistados não citam o geógrafo britânico, mas sentem na pele os efeitos da narrativa contra seu movimento. Após uma primeira tentativa de desqualificação, em que foram retratados como “manipulados”, “baderneiros”, “drogados” etc., passaram a ser denominados como aqueles que prejudicariam milhões de outros estudantes, que não poderiam fazer o Enem ou estudar para o vestibular. “Vêm pressionar a gente, dizendo que estamos prejudicando seus filhos, mas eles não deveriam estar estudando desde o começo do ano? Agora não vai adiantar nada”, diz Marina.

A pressão também aumentou depois que numa briga entre dois garotos dentro de uma escola ocupada um deles foi assassinado. “Muitos pais agora estão contra pelo medo de que aconteça alguma coisa com a gente. Medo do que passa na Globo. A Globo só passa desgraça. As pessoas aceitam sem saber, sem tentar entender o que está acontecendo”, diz Maria. Os pais de Larissa apoiam, mas ficam chocados com o que veem na TV. “Hoje de manhã meu pai estava assistindo ao jornal e disse: ‘Nossa, como eles mentem’.”

Quem está na ocupação desfruta o convívio. “Nesse tempo a gente ficou amigo de verdade. Antes estudávamos na mesma escola e nem nos conhecíamos direito. Se via no corredor, mas nem se falava. É uma união mesmo.” Ao contrário do que vem sendo divulgado, nas escolas visitadas pela reportagem os alunos falaram da organização e das regras adotadas. Todos se revezam para fazer limpeza, comida e manter a segurança – como nas experiências do ano passado em São Paulo, depois Goiás, Rio de Janeiro, Ceará... É proibido que meninos e meninas durmam no mesmo quarto, ou que se consuma bebida alcoólica ou droga.

Há a questão de limpeza, arrumação, deixar organizado, comer e tapar as panelas, horário de comer e de dormir. Adolescente é meio difícil, quer ficar direto no celular, mas a gente tem um horário de dormir porque tem de acordar cedo”, diz Maria. Ela conta que na escola há distribuição de leite do governo para a população e eles têm de abrir o portão para o rapaz que faz a entrega e para os funcionários responsáveis pela distribuição.

No Teotônio Vilela, os primeiros dias foram difíceis, mas depois se organizaram. “Na primeira semana, a gente tinha para comer pão, salame e mortadela. A gente ficou magro aqui. Chegamos a passar fome. Depois abrimos a cozinha e, quando começamos a cozinhar, precisa ver nossa alegria, ver o alho, a cebola fritando, comer um arrozinho”, afirma Paulo. “Os pais vêm, alguns universitários também cozinham para a gente, a gente mesmo faz.”

Além de doar alimentos e cozinhar, estudantes universitários, professores e diversas outras pessoas foram às escolas para contribuir com debates, workshops, aulas abertas, oficinas. Teve oficina sobre direito à cidade por alunos e professores de Arquitetura, acompanhada pela reportagem da RdB na escola Professor Nilo Brandão, no Canguru, também em Curitiba. Além de rodas de capoeira, de circo, aulas de xadrez, pingue-pongue, Português, História, Geografia, preparatório para o vestibular, entre outras atividades.

Se há apoio, a pressão também é grande. Vai de diretores, professores, comerciantes do bairro, outros alunos e, principalmente, a Justiça. “Estamos sofrendo ameaças de invasão”, diz Paulo. “Se vierem, não vão vir desarmados, vai dar merda. A gente conhece a comunidade. Mas estamos preparados para qualquer coisa, psicologicamente e fisicamente. Mas não sabemos o que vai acontecer na hora.” Paulo falou numa sexta-feira, 28 de outubro. No domingo, 30, um dos colegas foi barbaramente agredido quando saiu da escola. Mesmo querendo continuar, os outros decidiram desocupar.

Além das pessoas no entorno e da polícia, a pressão da Justiça aterroriza. Foram concedidas dezenas de liminares de reintegração de posse, mas os métodos vão muito além. Em Brasília, por exemplo, o juiz Alex Costa de Oliveira, da Vara da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), autorizou o uso de técnicas de tortura para “restrição à habitabilidade” das escolas, com objetivo de convencer os estudantes a desocupar. Um juiz, por ironia da vara da infância e juventude, manda impedir o contato dos jovens com amigos e a família, restringir a entrada de alimentos e autoriza o uso de “instrumentos sonoros contínuos, direcionados ao local da ocupação, para impedir o período de sono” dos adolescentes.

Alunos que estavam ocupando o Centro de Ensino Médio Dona Filomena ­Moreira de Paula, na cidade de Miracema (TO), também foram retirados à força pela PM acionada pelo promotor de Justiça do ­Ministério Público Estadual (MPE). Foram levados para a delegacia, alguns algemados, sem mandado judicial. Em Chapecó (SC), há relato de invasão de policiais em uma ocupação com fuzis em punho.

Além dessas práticas que passam por cima das leis e dos direitos humanos, os estudantes ainda enfrentaram a atuação de grupos que agem à margem do Estado. Com práticas que lembram a forma de atuar das milícias fascistas dos anos 1930, 1960 e 1970, organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL) arregimentam recursos, estrutura e apoiadores para “desocupar escolas”. Isso já aconteceu em Brasília e no Paraná. No início do ano, práticas semelhantes, associadas a pessoas do crime organizado e milícias, ocorreram em São Paulo e no Rio de Janeiro.

O que vem depois

A Primavera Árabe, as manifestações de junho de 2013, o Occupy Wall Street, a ocupação das escolas no ano passado e no início deste ano e as deste outubro têm, pelo menos, um fator em comum: trazem para a arena da disputa política novos atores desatrelados de partidos ou movimentos sociais tradicionais.

Na apresentação do livro Ocuppy, feita por Henrique Soares Carneiro, o historiador destaca o caráter espontâneo de rebeliões contra as estruturas políticas convencionais, o que mostra a necessidade de um novo projeto que articule uma representação dos anseios de transformação e ruptura. Argumenta também que existe uma participação política protagonizada pela nova geração, por meio difuso de propagação da informação, via internet, sobretudo as redes sociais. E que esse despertar para uma nova euforia política, num mundo dominado pelos ideais do individualismo, e pela carência de projetos coletivos para o futuro, causa essa profunda indignação, que pode ser o germe de uma revolução.

Ao mesmo tempo em que esses novos atores agem, as forças dominantes hegemônicas se rearticulam, absorvem ou repelem movimentos por mudanças. Um sopro de esperança está no aparecimento de jovens que pela primeira vez participam da disputa política por uma sociedade melhor. É emblemática a forma como a estudante Ana Júlia, de 16 anos, cala deputados na Assembleia Legislativa paranaense. Sua voz em defesa de um país mais justo – baseado não em teorias revolucionárias, mas no que determina a Constituição – virou símbolo das lutas atuais.

Mas o que acontecerá daqui por diante? A resposta pode estar nas palavras de outra jovem, também de 16 anos, ouvida pela revista. “A PEC 241 pode passar, a gente pode ser derrotado, mas a gente sabe o que está tentando. O povo brasileiro está sendo roubado, literalmente, mas a gente está fazendo nossa história.” Tanto está que a onda de rebeldia ultrapassou a praia dos secundaristas e banhou o meio universitário. No momento que em que esta reportagem era concluída, estudantes ocupavam campi em Brasília, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Em todos os casos, universidades públicas, ameaçadas pela PEC 55.

Em Jogo de cartas marcadas e o golpe consumado resta à resistência



Estava tudo decidido. O jogo onde o povo não deu as cartas não podia terminar bem. Aliás, o povo pouco sabia do que de fato estava acontecendo, a não ser de fatos e mais fatos que foi narrado pela grande mídia. A exceção aqui é a regra, pois muitos só têm acesso às informações por meio da televisão ou do rádio. Internet ainda é um mundo para poucos e ainda assim os poucos não estão preocupados com os rumos políticos do país. Mais uma vez cabe lembrar que a exceção aqui também é a regra.

Pouco se ouviu comentar nas ruas, nos bares, nos demais ambientes que aglomera várias pessoas acerca do momento político em que o Brasil atravessa. Na internet, meia dúzia de pessoas escrevendo, comentando e compartilhando textos e imagens sobre o cenário desastroso que a nós foi imposto, enquanto outras não estavam nem ai. Platão, um dos filósofos gregos mais conhecidos e estudados já dizia “não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governados por aqueles que gostam”. Não é que você precisa está constantemente falando de política, especialmente aquela que nos interessa nesse momento – a partidária – mas você enquanto cidadão precisa se interessar por aqueles temas que vai de forma direta e indireta interferir na sua vida e dos que estão ao seu redor. É necessário que tu participes da vida política do teu município, do teu estado e do teu país, pois é dela que vem o sustento teu e da tua família. Nunca é demais lembrar isso.

Mas o que o momento brasileiro pode nos dizer sobre isso? Tudo. Vimos e ouvimos deputados, deputadas, senadores, senadores, a mídia e demais membros da sociedade afirmando que estavam tirando a presidenta de república porque nós - povo - pedimos, clamamos. Não, ao contrário. A grande maioria do povo brasileiro deu a Dilma o poder de dirigir o país. Foram mais de 54 milhões de eleitores que a uma só vez digitaram na urna o direito que a constituição e a democracia lhe deram. Foram esses mesmos eleitores e eleitoras que deram o poder aquele congresso de legislar e fiscalizar as contas da própria presidenta. O povo é consultado e tem o direito de votar para eleger representantes/as, mas é ignorado sobre a possibilidade de tirar ou não um governante. O seu direito acaba quando termina o processo eleitoral. Assim pensam a esmagadora classe política do nosso país e assim agiram com o desastroso impeachment.

Pouco importa se foi seguido o devido caminho. Pouco importa se a defesa da presidenta foi dada a oportunidade de falar. Pois é sabido que a trama já estava armada. Tanto estava que quando em alguns momentos da fala dos agentes da defesa da presidenta o plenário do senado esvaziou-se. Ora, a defesa foi assegurada, mas falar para quem? O princípio constitucional nesse caso foi apenas para cumprir tabela. É como um time de futebol que chega nas últimas rodadas do campeonato sem chances, mas joga para cumprir a regra. A constituição em si não foi obedecida, como alguns pregaram. Ela foi desrespeitada. Mas, como se lá fala do impeachment? Fala, mas este só pode ocorrer se comprovado crime contra a administração pública, crime de responsabilidade fiscal. E nesse caso não houve.

Não é meu objetivo apresentar aqui os argumentos técnicos e jurídicos do afastamento da presidenta Dilma, pois acredito que já repeti muito em outras oportunidades. Tão pouco quero aqui me aventurar mencionado nomes e mais nomes dos autores e atores do golpe. Sim, atores. Porque a novela que eles criaram com narrativas que não refletem a realidade e portando a vontade popular entrará para os livros de história como uma farsa para distrair atenção do eleitorado e construir uma cena política onde eles e elas junto a partes da mídia conservadora possam usufruir do suor de agricultores, agricultoras, negro, negras, indígenas, homossexuais e outros setores marginalizados. Esses grupos sociais serão sem dúvidas os que mais sofrerão com as ações desse governo que ora usurpou sem nenhum pudor o cargo que a ele não foi delegado.

Sempre fui um crítico do governo Dilma. Foi minha candidata no segundo turno e sempre fui admirador das boas ideias das políticas de inclusão social implementada na sua gestão, mas ao mesmo tempo um crítico ferrenho daquelas ações que em nada contribui para desmarginalizar os sempre à margem do poder, mas que tão somente reforçava a política do mais do mesmo. Fui sempre contra a sua falta de ação para realizar as tão sonhadas reformas de base, como a política e a agrária. Mas, nesse caso, eu estou ao lado da justiça. Estou ao lado da democracia e do cumprimento da constituição. Não há terceira via aqui. Há o lado dos querem o bem comum e o lado dos que querem voltar ao poder a qualquer custo, nem que para isso a vontade popular não seja obedecida.

É ora de lastimar mais um golpe no Brasil. Mas é ora também de resistir e não reconhecer esse governo que ai está. É ora de juntarmos forças e irmos à luta. É ora do povo acordar e participar mais da vida política do seu país. Afinal de contas, quem nos representa importa muito.

Conjunto de imagens de atos de resistência ao golpe/divulgação.