Crianças em creches no interior de São Paulo. (Foto: Reprodução/ TV TEM).
O
Brasil Carinhoso, programa do governo federal criado em 2012 para ajudar os
municípios a manter crianças pobres de 0 a 48 meses em creches, foi esvaziado.
Depois de anos de quedas consecutivas no valor dos repasses, que chegou a 90%
entre 2015 e 2017, o orçamento aprovado para 2018 é de R$ 6,5 milhões. Isso
equivale a apenas 1% do orçamento aprovado quatro anos atrás, de R$ 642
milhões.
Ao
G1, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) confirmou a redução, mas
afirmou que o programa tem ajudado no aumento no aumento das vagas em creches
(leia a íntegra da nota ao final da reportagem). De acordo com dados do Censo
Escolar divulgados no dia 26, o número de matrículas em creches públicas
cresceu 6,4% entre 2016 e 2017.
Na
educação pública, a responsabilidade pela educação infantil, que inclui as
creches (para crianças de 0 a 3 anos), e as pré-escolas (para crianças de 4 a 5
anos), é dos municípios. Porém, a Constituição Federal afirma que a União
precisa dar apoio suplementar às prefeituras.
O
Brasil Carinhoso é uma das iniciativas federais nesse sentido. Ele repassa aos
municípios o equivalente a metade do valor anual mínimo por matrícula em
creche, que varia de acordo com a carga horária do atendimento (tempo parcial
ou integral) e se a creche é pública ou credenciada com o governo.
Em
2014, segundo dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE),
esse valor por criança variou entre R$ 914,23 e R$ 1.485,62. Em um repasse
anunciado pelo FNDE em outubro daquele ano, R$ 765,6 milhões foram repassados
para quase 5 mil municípios, beneficiando 580 mil crianças.
Meta descumprida
O
Plano Nacional de Educação (PNE) estipula que, desde 2016, o Brasil deveria por
lei ter todas as crianças de 4 a 5 anos matriculadas na pré-escola, mas os
dados oficiais mostram que, até pelo menos 2014, 10% delas ainda estavam fora
da escola. Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) divulgada neste
mês, que incluiu um levantamento com centenas de prefeituras, mostra que quase
metade delas sequer sabe o número total de crianças dessa faixa etária no
município.
Além
disso, o PNE prevê que, até 2024, 50% das crianças de 0 a 3 anos estejam
matriculadas em creche. Mas dados do TC Educa, uma plataforma criada pelos
tribunais de contas estaduais que cruza os números do Censo Escola com
estimativas populacionais do Datasus, mostram que nove em cada dez municípios
ainda não chegaram nesse patamar. Para cumprir a meta, além do levantamento de
quantas vagas novas são necessárias, os municípios precisam construir novas
creches.
Os
dados orçamentários mostram, no entanto, que o governo federal tem caminhado na
direção oposta para ajudar os prefeitos a cumprirem essa meta.
Queda nos repasses
Os
valores aprovados no orçamento são chamados de "dotação inicial", e
servem como uma referência. Porém, no decorrer do ano, eles podem mudar tanto
para cima quanto para baixo. No caso do Brasil Carinhoso, desde 2012 ele chegou
a receber duas vezes verba extra após a aprovação do orçamento. Porém, o valor
"empenhado", ou seja, que efetivamente foi destinado a esse fim, caiu
nos últimos quatro anos consecutivos. Veja no gráfico abaixo:
Em
dois anos, o valor repassado pelo governo federal caiu de R$ 405,7 milhões, em
2015, para R$ 40 milhões em 2017. Neste ano, os dados do Ministério do
Planejamento mostram que os parlamentares aprovaram um orçamento de R$ 137
milhões. Isso quer dizer que só 29% do que estava previsto acabou efetivamente
sendo gasto.
Durante
o ano, quase metade da verba foi congelada, o que fez o valor previso cair para
R$ 67,6 milhões. Mas, ao fim de 2017, nem esse valor foi atingido.
'Deixou de existir'
Alessio
Costa Lima, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
(Undime) afirmou, durante um seminário realizado neste mês na Câmara dos
Deputados, que as prefeituras também sofrem para expandir as vagas por causa de
cortes no programa Brasil Carinhoso.
"O Brasil Carinhoso praticamente deixou de
existir", afirmou ele.
No
mesmo seminário, Hector Luis Passini, diretor de Programas da
Secretaria-Executiva do MEC, justificou o não cumprimento de metas citando a
crise econômica, e disse que não há "soluções mágicas" para o
problema.
"O PNE foi concebido em um momento de
fartura. Isso não vai voltar mais. Então ou tem coragem de enfrentar,
eventualmente até abrir o debate, ou então nós vamos continuar com boa parte
das metas não cumpridas." - Hector Passini (MEC)
"Isso não quer dizer que o ministério não
esteja comprometido com essas metas. Nós estamos comprometidos, mas acho que
temos que ter coragem para rever as escolhas que foram feitas",
completou ele.
Desigualdade aumentou
A
auditoria do TCU também procurou avaliar se outra estratégia do PNE estava
sendo cumprida pelos municípios na educação infantil: a priorização da expansão
de vagas para a população de renda mais baixa. O Brasil Carinhoso, por exemplo,
é destinado apenas
Leia a íntegra da nota do Ministério
do Desenvolvimento Social:
"O repasse à educação infantil do Brasil
Carinhoso foi criado em 2012 com o objetivo de ampliar o acesso de
beneficiários do Bolsa Família às creches. O MDS repassa recursos ao MEC via
FNDE, que imediatamente transfere para as contas dos municípios. Os recursos do
Brasil Carinhoso devem ser utilizados na educação infantil, sendo possível,
inclusive, a compra de materiais não autorizados pelo FUNDEB, como pomadas e
fraldas.
Em 2015, uma mudança na Lei
12.722/2012 alterou as regras de financiamento do programa. Os valores que os
municípios tinham em caixa, R$ 476,3 milhões, referentes aos repasses dos anos
anteriores, passou a ser descontado do valor devido (R$ 882 milhões). Ainda em
2015, outra mudança na lei determinou que apenas os municípios que tivessem ampliado
o número de crianças do Bolsa Família matriculadas em creches teriam direito
aos recursos.
Porém, em 2015, não houve repasse do
MDS para o MEC. Os recursos referentes ao ano de 2015 foram pagos em duas
parcelas em 2016. A primeira em fevereiro e a segunda em junho.
Em 2016, também foram pagos os
recursos referentes a esse exercício (R$ 139,9 milhões). No momento do repasse,
o saldo em conta dos municípios era de R$ 215,8 milhões, totalizando R$ 355,8
milhões para a ação. Em 2017, foram repassados R$ 40 milhões.
A política tem se mostrado efetiva,
pois o número de crianças matriculadas saltou de 572 mil em 2012 para 875 mil
em 2016." (Com informações do G1).
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