O
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 25 anos, nesta
segunda-feira (13), no centro do debate sobre a redução da maioridade penal de
18 para 16 anos. A mudança, de acordo com o coordenador do Movimento Nacional
de Direitos Humanos em São Paulo, o advogado Ariel de Castro Alves, abre
precedente para uma reinterpretação do ECA. Para ele, reduzir a maioridade
penal seria como “revogar” o ECA em
relação à proteção de adolescentes entre 16 e 17 anos.
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Ariel de Castro é coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos - SP. Foto: Agência Brasil |
“Vejo
que seria um duro golpe contra o ECA. Pode provocar uma fragilização, porque a
interpretação que pode ocorrer é que aqueles entre 16 e 17 anos, por terem a
maioridade penal, não seriam mais sujeitos à proteção especial. Por exemplo,
como considerar vulnerável diante da exploração sexual uma adolescente de 16 ou
17 anos que já pode responder até criminalmente por seus atos?”, indaga ele
que também é assessor jurídico da organização não governamental Aldeias
Infantis SOS.
Ele
abre discussão ainda acerca da proteção do adolescente em relação ao consumo de
bebidas alcoólicas. “Como impedi-lo de consumir bebidas alcoólicas, como punir
quem fornece bebidas para aquele com idade entre 16 e 17 anos se ele é
considerado imputável?”
Para
outros especialistas ouvidos pela Agência Brasil, as discussões sobre a redução
da maioridade penal, no entanto, poderiam ser evitadas se o ECA, sancionado no
dia 13 de julho de 1990, fosse cumprido em sua totalidade. “Temos uma série de princípios que não se
aplicam, por exemplo, os programas socioeducativos. Há 25 anos que está
faltando competência técnica e gente especializada nesse assunto. Então, não é
para mudar a lei, mas a realidade”, avaliou o procurador federal aposentado
Edson Sêda, um dos redatores do texto do ECA aprovado pelo Congresso em julho
de 1990.
De
acordo com a ex-deputada Rita Camata (PSDB-ES), que foi relatora do ECA na
Câmara dos Deputados, reduzir a maioridade penal é “acender um barril de pólvora”. De acordo com ela, o estatuto prevê
punição para o adolescente infrator a partir dos 12 anos de idade. “Há uma
grande confusão por parte dos que defendem a redução. Eles acham que o estatuto
que impede [a punição dos adolescentes]. Mas o estatuto prevê que o adolescente
seja responsabilizado a partir dos 12 anos.”
Para
o presidente nacional da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Everaldo Patriota, nas últimas duas
décadas e meia, o Brasil criou uma “equação terrível” na política de prevenção
e de ressocialização dos jovens. “Nós não
cumprimos o ECA e agora estamos tratando dos efeitos e esquecendo a causa”,
destacou. “A sociedade toda está tomada
por uma paranoia de insegurança coletiva, mas o que foi que fizemos com nossas
crianças e adolescentes? Não cuidamos delas e agora vamos criminalizá-las?”,
indagou.
Impunidade
Para
Edson Sêda, a sensação de impunidade para o adolescente infrator decorre da
falha de prefeituras e de governos estaduais e federal na execução das medidas
de privação de liberdade e de liberdade assistida. “A lei manda controlar, mas
não controlam. Manda fiscalizar a liberdade assistida, mas não se fiscalizam. O
menino que deveria estar em liberdade assistida anda com uma faca, comete um
crime, mas a culpa não é do estatuto, mas sim de quem não observou as regras.”
Um
dos redatores do ECA, Sêda lembrou que o estatuto prevê acompanhamento e
punição ao jovem infrator não apenas até os 18 anos, mas aos 21 anos. “A lei
não manda soltar o menino aos 18 anos nem apenas depois de três anos de
internação. Ela fala que a liberdade compulsória ocorre aos 21 anos e que a
liberdade assistida também deve ocorrer até os 21.”
Na
avaliação do Instituto Alana, entidade que atua em prol da infância, o combate
à violência não pode se restringir ao debate sobre a redução da maioridade
penal. “Menos de 1% dos adolescentes são responsáveis por crimes contra vida no
Brasil”, argumentou Pedro Hartung, advogado da instituição. “A violência é um
problema estrutural e social. Isso tem a ver com acesso às políticas públicas
mais básicas”, acrescentou.
Responsabilização
Para
o promotor de Justiça, Infância e Juventude do Distrito Federal Anderson
Pereira de Andrade, que há 30 anos atua na área da criança e do adolescente, é
necessário aumentar o tempo de internação, previsto no ECA, para o jovem
infrator. De acordo com o promotor, o estatuto deveria tratar da promoção e
proteção dos direitos e uma outra legislação abordaria questões relacionadas à
responsabilização.
“Acho
que isso ajudaria muito e sinalizaria para a sociedade e para o próprio
adolescente que essa responsabilidade agora é penal. Ao mesmo tempo que
endureceria a pena naqueles delitos mais graves, garantiria mais direitos ao
adolescente, direitos processuais, que hoje o estatuto não garante”, destaca
Andrade.
O
promotor explica que, se o adolescente cometesse um homicídio, por exemplo, ele
estaria sujeito a uma pena mais dura, mas por tempo menor, com conteúdo mais
reeducativo e em uma instituição diferenciada em relação ao adulto.