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Cerca de 8 mil pessoal vão as ruas em um levante contra a redução da maioridade penal



Aproximadamente oito mil pessoas, segundo os organizadores do ato, percorreram as principais avenidas de São Paulo, parte do trajeto sob chuva, no início da noite desta terça-feira, 7, para protestar contra a redução da maioridade penal aprovada na semana passada, em Brasília, após uma manobra do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conseguir reverter a rejeição da matéria. “Ô Cunha, pode esperar. A sua hora vai chegar”, foi uma das palavras de ordem mais gritadas pelos ativistas durante a passeata, para expressar a indignação com a postura do parlamentar.

Protesto contra a redução da maioridade penal também
aconteceu no Rio de Janeiro. Foto: Fernando Frazão.
O número expressivo de manifestantes nas ruas da capital paulista, em uma noite fria e chuvosa, encheu de ânimo as lideranças dos movimentos sociais que integram a frente contra a redução da maioridade penal. Eles acreditam que é possível reverter a manobra de Eduardo Cunha da semana passada. Para virar lei, a matéria ainda precisará ser aprovada em um segundo turno na Câmara, além de ser aprovada em dois turnos no Senado. Nas três votações, é preciso maioria qualificada.

A mobilização popular tem sido a grande força contra o avanço do conservadorismo no país”, ressalta Juninho, do Circulo Palmarino. “A juventude quer educação e não prisão. Não vamos aceitar calados, as manobras de Eduardo Cunha. O ato é importante porque foi construído em ampla unidade com setores democráticos e populares (da sociedade)”, reforça Beatriz Lourenço, do Levante Popular da Juventude.

Protesto

Os organizadores da manifestação desta terça já anunciaram um novo ato para o próximo dia 13, contra a redução da maioridade penal e para lembrar os 25 anos da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Somos contra alterar o ECA. Propomos que o Estatuto seja de fato implantado no país, coisa que nunca aconteceu”, frisa Douglas Belchior, dirigente da Uneafro.

Para o padre Julio Lancellotti, da Pastoral do Menor, a proposta de alteração do ECA, defendida pelo governo na Câmara, é uma temeridade devido à composição de forças políticas conservadoras que integram o atual Parlamento. “Com esse Congresso é muito perigoso”, comenta preocupado. “Primeiro é preciso verificar se o ECA está sendo cumprido”, completa.

Para derrubar a redução da maioridade penal, o padre também confia na pressão popular. “É preciso mostrar que há quem seja contra. E aqui (na rua) está uma grande parcela da juventude, para mostrar que o Congresso está completamente equivocado, que o (Eduardo) Cunha está insistindo no caminho da violência e da repressão. Fascistas, não passarão”, alfineta Padre Julio.

Repressão

A Polícia Militar acompanhou todo o trajeto com viaturas, motos, ônibus e um forte aparato de policiais. A tropa do braço, com sua armadura e escudos também marcou presença, mas desta vez não interveio. Ouviu, mas não reagiu às palavras de ordem entoadas a plenos pulmões pelos manifestantes. “Não acabou, tem de acabar. Eu quero o fim da Polícia Militar.”

Quando a manifestação atingiu a Praça Roosevelt, onde as lideranças concluíram o ato, a tropa do braço se recolheu aos veículos da Polícia Militar. Várias viaturas da Força Tática e motos da Rocam, no entanto, continuaram estacionadas na rua da Consolação próximas ao cruzamento com a rua Caio Prado, com os giroflex ligados. Os policiais observavam os manifestantes à distância.

Esse cruzamento foi o palco do epicentro da repressão ao protesto do Movimento Passe Livre pela redução da tarifa do transporte público, em junho de 2013, quando o fotógrafo Sérgio Silva ficou cego de uma das vistas ao ser atingido por uma bala de borracha disparada pela Tropa de Choque da PM.

Aula de cidadania

Isaías, 19 anos, com boné do grupo de rap Facção Central, também engrossou a passeata. O menino franzino com consciência de gigante, que descarrega caminhões durante o dia em uma rede de hipermercados e à noite cursa História em uma faculdade particular, deu uma verdadeira aula de cidadania durante a entrevista à reportagem de Caros Amigos.

Com essa política de redução da maioridade penal, o moleque vai ser preso e quando sair da prisão não vai conseguir (arrumar) emprego. Porque não se dá emprego a quem tem passagem (na polícia). Aí o moleque vai voltar pra quebrada e vai ter uma vaga (no tráfico) esperando por ele”, antecipa.

Morador de Perus, região noroeste da capital, ele conhece de perto essa realidade. Já teve um amigo (mano, como ele o define) que foi parar atrás das grades por causa do tráfico de drogas.

E ele questiona: “Por que na Noruega, Finlândia, Irlanda não se discute a redução da maioridade penal? Será que os moleques de lá são melhores do que os daqui? Será que são mais seres humanos do que nós? Não. Não são melhores do que os moleques da quebrada. A diferença é que lá, eles têm um futuro garantido, aqui não. Essa é a realidade.

Racismo

Bruna Tamires de Souza Cruz, 22 anos, estudante de Gestão de Políticas Públicas, na USP Leste, também resolveu se juntar àqueles que protestam contra a redução da maioridade penal. Ela conta que se deu conta de que era negra só após entrar na universidade. “Na escola municipal todo mundo é pobre. Descobri que era negra, quando percebi que não era bem-vinda na USP. Quando começaram a aparecer várias pichações racistas nas paredes dos banheiros, montamos um coletivo de negros e negras da EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades).”

Esse foi o pontapé inicial para a conquista da consciência. Mas a entrada na luta contra a redução aconteceu de forma ainda mais dura. A estudante conta que foi vítima de um ataque racista no trem. Moradora de Pirituba, na zona noroeste da capital, ela ia para um evento em Campo Limpo, no extremo sul da cidade, quando ouviu uma passageira criticar seu cabelo Black Power e resolveu reagir.

Ela disse: ‘Que horrível, não sei como alguém pode andar com uma bucha como essa (na cabeça)’. E eu fiquei com muita raiva, muita raiva. Ela tava falando pra todo mundo ouvir. Ela era branca. E o que eu podia fazer pra destruir essa pessoa no argumento? Eu pensei, eu não vou levar isso pra casa. Esse problema não é meu, ela é a racista. Eu não ia acabar com o meu dia, por causa dela. Aí eu levantei e disse (para as pessoas que estavam no vagão): ‘Passageiros e passageiras, eu vou falar sobre a redução da maioridade penal, que é uma política racista, que vai prejudicar negros e negras, como a gente… E eu vi que a mulher começou a se encolher. E as pessoas bateram palmas”, comemora. “De 10 pessoas, se a gente conversar, consegue reverter (a opinião de) umas oito”, conclui.

Liberdade para Islam Hamed

Ativistas da Frente Palestina e da Missão a Gaza se juntaram aos manifestantes contra a redução da maioridade penal e panfletaram um documento exigindo a libertação do brasileiro-palestino que está há 90 dias em greve de fome, para pressionar por sua repatriação ao Brasil. “Redução não é solução. Para as crianças palestinas, prisão é realidade desde o nascimento”, relata trecho do texto distribuído.

O documento informa ainda que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, esteve recentemente em Israel, país exportador de materiais bélicos usados na repressão contra a juventude marginalizada brasileira.

A tarefa da mídia parece ser separar o povo do povo




Reproduzimos abaixo excelente artigo de Nirlando Beirão, intitulado Criticar o governo, sim. O capitalismo, nunca, publicado nesta segunda-feira, 05, no site Carta Capital.

Ao discorrer sobre o assunto tão divulgado e, muitas vezes mal interpretado pela mídia golpista, da qual a rede Globo é a líder, Nirlando chama a atenção para a hipocrisia desses veículos de comunicação que se utilizaram dos movimentos para bater no governo Dilma, mas sem levar em conta os reais objetivos da questão.

O artigo em questão nos faz reportar ao que disse Joseph Pullitzer: “Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma”. 

Passemos ao texto

Criticar o governo, sim. O capitalismo, nunca

Dá para notar que os protestos de rua estão perdendo a mística, o encanto, para quem está do lado de lá deles – digo, a mídia oligárquica e, por extensão, aquela facção ameba, mais influenciável, da chamada opinião pública. Mais do que perder o fascínio, as manifestações começam a provocar descrença e irritação, como se a explosão espontânea e legítima das massas estivesse sendo agora apropriada por uns grupelhos descabelados de radicais e arruaceiros.

Não tenho mais idade para me regozijar com cenas de depredação, mas me irrita a hipocrisia dos que aplaudiam antes e agora criticam. Tenho até um pequeno, descompromissado palpite, a respeito desse divórcio que se deu entre o momento em que o protesto era uma beleza e o momento em que o protesto passou a ser um horror. Nada melhor, aliás, para balizar essa reviravolta, do que a cobertura, sempre tão isenta, sempre tão imparcial, do jornalismo eletromagnético da Globo e a dos dinossauros de papel.

Meu palpite me diz: enquanto a raiva se voltava contra o governo e os governantes, “essa infâmia de políticos corruptos”, “a dona Dilma”, “a turma do mensalão”, aí o partido da mídia se deliciava. As multidões ululantes vociferavam, justificadamente, contra a péssima qualidade dos serviços públicos, primeiro os transportes, depois a saúde, e a educação, e a segurança, e tudo o mais, se é por aí, ok, perfeito, abaixo os podres poderes, o Estado é o mal maior.

De repente, a agenda parece ter se ampliado. Se é para discutir a indigente situação dos serviços públicos no Brasil, por que não se ocupar tambêm da sofrível – para dizer o mínimo – prestação de serviços privados?

Existe tão grande diferença assim entre o malfalado SUS e certos hospitais particulares onde o paciente é obrigado a pagar fortunas?

As universidades particulares, com suas mensalidades que pesam uma tonelada no bolso, são exemplos da excelência pedagógica de Harvard e de Cambridge?

E os serviços de telefonia, fixa e móvel?

E as filas dos bancos, aquilo lá é um exemplo de respeito ao cidadão?

E as companhias aéreas, com seu sistemático desrespeito ao viajante, sem falar dos golpezinhos que costumam dar em seus sites de contravenção?

Penso na indústria nacional, obsoleta, atrasada, sem nenhuma musculatura física ou criatividade mental para competir no mundo, indústria cujos produtos são um lixo (ressalvo os aviões da Embraer e as sandálias havaianas), incapaz de inovar tecnologicamente (que inveja da Coreia!), sempre queixosa, abúlica, pondo da culpa nos impostos e na infraestrutura.

Ah, e há o espinho que mais dói. Os rebeldes da rua – os que ainda estão aí – insistem em debater também a péssima qualidade da informação que se produz e se veicula no Brasil. Por isso as emblemáticas manifestações à porta da Globo, por isso a saudável insistência em desconfiar do viés partidário e, mais uma vez, eleitoreiro dos veículos que dizem falar em nome do povo.

Nesse Brasil de frases feitas e ideias curtas, o culpado é, tem de ser, sempre o governo e os políticos, mesmo que eles sejam eleitos por nós e mesmo sabendo-se que sem política não há democracia.

A mídia oligárquica nunca foi muito chegada à democracia. Menos ainda ao povo. A tarefa dela, agora, é tentar dizer que há povo e povo. Aquele que manifesta com as ideias das quais a gente gosta deve ser respeitado. Aquele de quem a gente discorda não passa de um bando de vândalos.