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Brasil: a herança perversa do colonialismo racista. (FOTO/ Reprodução/ Comissão ARNS). |
Segundo
estudo divulgado em outubro de 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), a crônica desigualdade social que marcou todo o curso de
nossa história, desde que Cabral aqui aportou no dealbar do século 16, aumentou
em 2018. O rendimento médio mensal do 1% mais rico do país foi quase 34 vezes
maior do que o da metade mais pobre de toda nossa população.
Não
é difícil perceber que tais dados escandalosos representam o fruto podre do
capitalismo excludente e do racismo genocida, aqui implantados desde o início
do processo colonizador.
Estima-se
que em 1.500, quando os portugueses aqui chegaram, a população indígena em
nosso território era de três milhões a quatro milhões de pessoas. Durante o
período colonial, como reportam os historiadores, foram exterminados em média 1
milhão de índios em cada século. Ora, tal genocídio corre o sério risco de ser
retomado com o atual desgoverno federal – o que levou o Coletivo de Advocacia
em Direitos Humanos (CADHu) e a Comissão Dom Paulo Evaristo Arns de Defesa dos
Direitos Humanos, da qual tenho a honra de fazer parte, a encaminhar à
Procuradora do Tribunal Penal Internacional uma comunicação, pela qual requerem
a abertura de um procedimento preliminar sobre a incitação ao genocídio da
população indígena, por parte do atual chefe do Poder Executivo federal.
Concomitantemente,
o tráfico de escravos africanos para o continente Americano, organizado
sobretudo por portugueses e brasileiros durante mais de três séculos e meio,
foi a mais vasta e duradoura migração forçada de toda a história. Hoje, sabe-se
com precisão que doze milhões e meio de escravos foram transportados da África
para as Américas entre 1.500 e 1.867, sendo que desse total menos de onze
milhões sobreviveram à travessia do Atlântico. Quase metade dessa vasta
população cativa foi desembarcada em território brasileiro, sendo que 5%
faleciam durante o processo de venda e transporte para os locais de trabalho; e
outros 15%, nos três primeiros anos de cativeiro em nosso território.
O
tráfico escravagista para o Brasil foi, por quase três séculos, a nossa mais
lucrativa atividade comercial e os traficantes de escravos formaram, durante
todo esse tempo, a camada mais abastada de nossa população. Aliás, os nossos
fazendeiros sempre preferiram comprar escravos trazidos por traficantes do que
utilizar os que já nasciam aqui, pois a expectativa de vida de um cativo nascido
no Brasil, como constatado em 1872, era de apenas 18,3 anos, ao passo que o da
média da população em geral chegava a 27,4 anos.
Em
13 de maio de 1.888, fomos o último país das Américas a abolir a escravidão, e
o fizemos pacificamente, em razão de nosso "caráter cordial" como
disseram alguns; mas também sem pagar um centavo de indenização aos
alforriados. Os senhores de escravos, entre os quais sempre estiveram várias
congregações da Igreja Católica, não se sentiam minimamente responsáveis pelas
consequências do crime nefando, praticado durante quase quatro séculos.
A
história da escravidão de africanos e afrodescendentes no Brasil recomeça agora
a ser relatada por Laurentino Gomes, em sua monumental obra Escravidão, cujo
primeiro dos três volumes já foi publicado. Alimento a esperança de que essa
história execrável seja uma parte importante do currículo didático de nosso
ensino fundamental.
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Por
Fábio Konder Comparato, na Comissão ARNS.
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