![]() |
50 dias do governo Bolsonaro; uma ópera-bufa em sete atos. (Foto: Divulgação). |
O
governo de Jair Bolsonaro completou 50 dias nesta segunda-feira 18. Mas é tanto
recuo, tanto bate-cabeça, tanta intriga e tanta crise que o tempo parece outro:
uns cinco anos, alguém diria. Destaque para a degola de um de seus homens
fortes, o aprofundamento do caso Queiroz e a revelação de um esquema de
candidaturas laranja no PSL.
Chamuscado
por um início cheio de tropeços e o estouro precoce de crises públicas e
privadas, o presidente chega fragilizado à disputa com o Congresso – embora
beneficiado pelo acordo com Rodrigo Maia e pela vitória contra Renan Calheiros.
As
promessas anticorrupção e de pujança econômica pouco avançaram. Mudanças
econômicas pontuais já causam desconforto: a fim da taxa sobre o leite
importado, por exemplo, enfureceu a bancada ruralista.
A
tal nova era traz práticas antiquíssimas, patrimonialismo e tramoias típicas do
baixo clero. De concreto, pouco resta além da explosão da violência ligada ao
machismo, ao racismo e LGBTfobia.
Confira
a seguir.
1.Os filhos-problema
As
leis anti-nepotismo não impedem que os três filhos mais velhos de Jair
Bolsonaro tenham voz dentro do governo. Mas, nos últimos dias, Carlos, Flávio e
Eduardo têm trazido mais problemas do que alegrias ao pai.
Embora
tenha cargo de vereador no Rio de Janeiro, Carlos atua mesmo como consultor do
capitão. Se intromete nas discussões do governo, ataca a imprensa e, mais
recentemente, protagonizou a fritura pública de Gustavo Bebianno.
O
caçula Eduardo, que costumava fazer dobradinhas com o pai no Congresso, tem se
dedicado a tirar do papel uma versão à direita do que ele imagina ser o Foro de
São Paulo.
O
mais discreto dos três é Flavio, eleito senador, que está enrolado até o
pescoço com as descobertas do MP carioca sobre a relação dele com o seu
ex-assessor, Fabrício Queiroz. É questão
de tempo para que os problemas dos pimpolhos atinjam o presidente.
2. O vice intrigante
Mesmo
que Bolsonaro não tenha passado a caneta ao vice enquanto ficou no hospital,
Mourão roubou a cena. Durante as semanas de ausência, o general acenou às
centrais sindicais, recebe líderes internacional, deu declarações à imprensa
sobre os mais diversos assuntos – chegou até a confidenciar a posição liberal
em relação ao aborto.
Esses
quase dois meses serviram ao General Mourão sedimentou sua fama de ente
razoável do governo. Seria o general um defensor do livre pensar? Ou trata-se
uma tática para pavimentar o próprio caminho em caso de um desgaste
incontornável do chefe? A conferir.
3.A ala delirante
Não
fosse tão retrógrada, a ‘ala ideológica’ dos ministérios ofereceria um alívio
cômico diante de tantos escândalos. De um lado Damares Alves apela aos temores
mais esdrúxulos para atacar o feminismo e o movimento LGBT. De outro, impede
inspeções anti-tortura em presídios cearenses.
Ricardo
Vélez, um método arcaico na alfabetização. Diz que as faculdades devem ficar
restritas a uma ‘elite’, prometeu ênfase em educação moral e cívica nas
escolas. Sua iniciativa mais recente é o anúncio de uma ‘Lava Jato na
educação’, em parceria com Sérgio Moro.
Ernesto
Araújo também se destaca pelas declarações estapafúrdias e a cruzada quixotesca
contra o globalismo. De concreto até agora, o MRE joga lenha na crise
venezuelana e tirou a América Latina do currículo do Instituto Rio Branco.
Também deve apresentar em breve um passaporte sem a logo do Mercosul.
Prioridades são prioridades.
4.Os agentes laranja
Na
semana passada, uma reportagem da Folha revelou que o PSL usava a cota de 30% da candidatura de mulheres para
engordar as campanhas das velhas raposas do partido, nas chamadas candidaturas
laranja.
Gustavo
Bebianno, então presidente do PSL, autorizou o envio de 400 mil reais a uma
candidata de Pernambuco – mesmo estado de Luciano Bivar, o cacique do partido.
O montante foi declarado a uma gráfica fantasma.
Outro
pivô do esquema é o ministro Marcelo Álvaro Antonio, do Turismo. Por indicação
dele, o presidente do PSL mineiro repassou 279 mil reais a quatro candidatas.
Diferente do advogado, Antonio segue firme no governo.
5. PSL em convulsão
A
crise do PSL também respinga dentro das cercanias do planalto. O partido
cresceu exponencialmente nas últimas eleições – passou de 8 para 46 deputados.
Mas esbarra na falta de habilidade política e no estrelismo de alguns dos
recém-eleitos. O líder do Delegado Waldir (GO), pena para costurar alianças. A
promessa de um grande partido da direita fica cada vez mais longe, tanto é que
os filhos do presidente ensaiam até migrar para a morta-viva UDN, a ser
recriada sob a égide bolsonarista.
6. Generais à espreita (e o papa comunista)
Enquanto
Mourão assume a interlocução pública, os generais representam uma espécie de
‘tutela informal’ em meio a tantas crises. Além do vice, são oito em posições
de chefia no alto-escalão: Augusto Heleno (GSI), Santos Cruz (Secretaria de
Governo), Azevedo e Silva (Defesa), Costa Lima (Minas e Energia), Guilherme
Theophilo (Secretaria de Segurança Pública), Maynard Santa Rosa (Secretaria de
Assuntos Estratégicos).
A
sanha controladora ficou explícita na descoberta de que, sob comando de Heleno,
a Abin e o GSI mantinham relatórios de arapongagem contra a Igreja Católica.
7. A ameaça Bebianno
Eis
a baixa mais recente e talvez a mais importante até agora. Desde o estouro do
laranjagate, a relação de Bebianno e Bolsonaro azedou e o enrosco custou-lhe o
cargo. A degola virou uma novela que já se arrasta por cinco dias: primeiro
Carlos Bolsonaro fritou Bebianno publicamente, chamando de ‘mentiroso’.
O
pai assentiu e decidiu dispensar seu brancaleone, segundo divulgaram aliados
ainda na sexta. No fim de semana, Bebianno fez saber sua decepção e testou na
imprensa seu o poder de fogo contra o presidente. Como chefe de campanha, deve
guardar informações das quais Bolsonaro não quer ser lembrado.
O
fim definitivo veio só na noite de segunda, quando porta-voz da Presidência
confirmou a exoneração. O substituto é um general: o oitavo com status de
ministro no governo. (Publicado originalmente em CartaCapital).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ao comentar, você exerce seu papel de cidadão e contribui de forma efetiva na sua autodefinição enquanto ser pensante. Agradecemos a sua participação. Forte Abraço!!!