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(FOTO/ Getty Images/ iStockphoto) |
“Os homens negros devem ajudar um ao outro a entender que estão sendo levados pela dinâmica da supremacia branca a causar danos extremos sobre si mesmos, uns aos outros e, finalmente, à raça negra” - Dra. Frances Cress Welsing
O
debate sobre a representatividade da população negra nos espaços midiáticos,
publicitários e políticos têm conquistado um número maior de opiniões que
convergem na compreensão de que é importante o aumento do número de negros, em
todos os espaços sociais, como protagonistas. Quem é negro sabe muito bem o quanto
somos atingidos, emocionalmente, nas poucas vezes que vemos pessoas negras
ocupando cargos de relevância social.
São
momentos que projetamos nossos sonhos, e acreditamos na possibilidade de
conseguir alguma posição que não seja marginal na sociedade. Daí a importância
da representatividade na luta antirracista, por lidar na dimensão subjetiva de
negros e brancos, possibilitando a desconstrução de estigmas e estereótipos que
afetam a visão de mundo no contexto das relações sociais, como ensinou a psicanalista
Maria Lúcia da Silva:
“É necessário saber que as relações entre
brancos e negros estão permeadas por representações que precisam sair do plano
latente e vir para o plano da consciência. Isto também significa que ações
envolvendo a dimensão subjetiva do racismo precisam ser introduzidas na pauta
do Movimento Negro, descortinando o impacto da imagem que brancos e negros têm
de si e do outro.”
Mas
reconhecemos que não podemos viver somente de sonhos. O racismo estrutural
impõe uma sobrevivência desumana aos negros. Por essa razão, o empreendimento
no aumento da representatividade não pode ser dissociado de ações políticas
amplas, pois as conquistas devem sair do campo simbólico e atingir o coletivo.
É fundamental medidas como as cotas raciais, que são exemplos importantes na
redução da desigualdade racial. Com elas, vimos o aumento significativo da
população negra nas instituições de ensino superior nos últimos anos.
Recentemente,
a Magazine Luiza informou que priorizará candidatos negros no processo de
seleção para o cargo de trainee. De acordo com a empresa, 53% da equipe são
negros, mas apenas 16% ocupam cargos de liderança. Essa ação é outro exemplo no
combate ao racismo estrutural. Aliás, a disseminação de medidas dessa natureza,
no mercado de trabalho, ajudará a minar o privilégio racial que sempre
beneficiou os brancos, ainda que os negros apresentassem melhores
qualificações.
Pretos no topo
Nas
redes sociais, diversas pessoas escrevem em suas postagens a frase “pretos no topo” que é referência aos
negros em ascensão, ou que alcançaram lugares historicamente ocupados por
brancos − condição que remete a inspiração mencionada no início desse texto.
Além do orgulho em testemunhar a história desses negros, existe a esperança de
que eles contribuirão para que outros alcancem os mesmos espaços.
Esse
sentimento tem relação com a Consciência Negra que, segundo Steve Biko,
significa “a percepção pelo homem negro
da necessidade de juntar forças com seus irmãos em torno da causa de sua
atuação – a negritude de sua pele – e de agir como um grupo, a fim de se
libertarem das correntes que os prendem em uma servidão perpétua”.
Mas,
não podemos perder de vista de que estamos inseridos dentro de um sistema
capitalista que corrompe o pensamento de muitas pessoas, diante das
experiências oferecidas, e cria a falsa impressão de que o esforço individual é
determinante para o destino do próprio indivíduo. Por essa razão, é comum que
parcela dos negros, em ascensão, assuma o discurso da meritocracia ou não se
manifestem diante da realidade marginal da maioria dos semelhantes. Eles não
percebem que, ao se colocarem como exemplos de superação, estão servindo de
instrumento do racismo; com o mesmo efeito quando não usam os espaços para
denunciarem nossas mazelas.
Em
outro ponto de vista, a escritora Michelle Alexander chama a atenção para o
discurso da diversidade que é comum nesse debate da representatividade. Da
maneira praticada, a diversidade tem potencial em conduzir à inação, devido ao
nosso contentamento indireto ao observarmos uma minúscula parcela dos negros ocupando
posições de relevância social. “Como
resultado, a diversidade cosmética, que se concentra em oferecer oportunidades
a membros individuais de grupos sub-representados, tem o duplo efeito de
diminuir a possibilidade de que regras injustas sejam combatidas e de legitimar
todo o sistema”.
E
levando em consideração esses aspectos, o ideal de uma sociedade igualitária e
sem privilégios está distante. Há inúmeros abismos sociais de complexa
superação. A luta pela representatividade deve ser vista como um dos caminhos
para o combate ao racismo estrutural, mas exige cuidado com as armadilhas
existentes e não reforçarmos o sistema excludente. Devemos fortalecer os negros
que estão em ascensão ou no topo, desde que tenham compromisso político com a
população negra. Isso é uma condição que considero inegociável.
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