Oliveira Silveira. (FOTO/ Divulgação/ LiteraturaRS). |
“encontrei minhas origens
no
leste
no
mar em imundos tumbeiros
encontrei
em
doces palavras
……..cantos
em
furiosos tambores
………ritos
encontrei
minhas origens
na
cor da minha pele
nos
lanhos de minha alma
em
mim
em
minha gente escura
em
meus heróis altivos
encontrei
encontrei-as
enfim
me encontrei”
Esta
escrita surge a partir das nossas vidas e se constrói com o objetivo de
realizar um registro histórico que ao mesmo tempo em que é singular expressa
uma vivência coletiva. Por isto, ela também é o encontro de nós mesmas, por um
ideal comum – a luta pela consciência negra e a preservação das memórias de
todos aqueles que vieram antes de nós e que brigaram muito para que chegássemos
até aqui.
Nossa
infância deu-se na década de 70. Foi naquele tempo que pela primeira vez
pessoas negras reuniram-se em uma casa no bairro Bonfim, Porto Alegre,
pretendendo dar início a estudos com o objetivo de encontrar uma data mais
significativa ao povo negro, fugindo da narrativa de que sua liberdade teve por
protagonistas pessoas brancas que defenderam o fim da escravização no Brasil.
O
anfitrião era o Professor José Maria, sobre quem todos falavam como um amante
do magistério, que cultivava a negritude. Ele abriu as portas de sua casa para
que o genro, Oliveira Silveira,reunisse o Grupo Palmares, que fazia uma
oposição ao dia 13 de maio, com o olhar crítico para a abolição da escravidão
no Brasil.
Dali
surgiu o primeiro ato evocativo do Grupo Palmares, no Clube Marcílio Dias, o
qual apenas se realizou após obterem a licença da Censura (Afinal: o que um
grupo de negros pretendia em reunião?).
Firmou-se ali, em 1971, o primeiro 20 de
novembro!
A
data da morte de Zumbi dos Palmares emerge como referência de luta e o quilombo
é reverenciado como espaço coletivo de fortalecimento e resistência em oposição
a um sistema que não reconhecia identidade e subjetividade a negras e negros em
nosso país.
Assim
era Oliveira Silveira, também professor, poeta gaúcho, natural de Rosário do
Sul, que sempre viu nos espaços coletivos uma possibilidade de fortalecimento:
—
Ele sempre trabalhou com grupos! Terminava um grupo ele já formava outro e
formava outro, mais outro!
Nossa
ancestralidade e nosso presente são produtos de muitos grupos, pois somados
talentos, experiências, habilidades, diferentes modos de pensar e agir,
potencializam-se forças e a história é preservada!
Oliveira
percebeu nas diversas tribos em África: grupos; nas pessoas em sofrimento nos
navios negreiros: grupos; nos privados de liberdade das senzalas: grupos;
nosquilombos:nossos mais valiosos grupos!
Depois
da lei de Isabel, nas reuniões de família e amigos: grupos!Nos clubes sociais
Marcilio Dias, Associação Satélite Prontidão, Floresta Aurora, formados apenas
por pessoas negras: grupos!
Nas escolas de samba, Bambas da Orgia, Imperadores do Samba, União da Vila do IAPI: grupos.Sempre estivemos reunidos em grupos!
E
foram esses grupos – lugares existenciais de sociabilidade, refúgio e luta
contra o racismo- que não permitiram e não permitem que sejamos eliminados,
pois é no coletivo que encontramos sentido para nossas existências. Pela
oralidade transmitimos, de uma geração para outra nossos conhecimentos, nossa
sabedoria, hábitos alimentares, as curas, a fé. Pensamos em coletivo, pensamos
em grupo, para resistirmos ao dia a dia, para fortalecermos nossas
subjetividades, para construirmos identidades próprias.
Na
verdade, Oliveira Silveira vivia de construir quilombos: espaços em que negras
e negros pretendiam fugir da nova escravidão e viver em liberdade.
Surgiram
Palmares, Semba, Associação Negra de Cultura, dentre tantos outros, todos
viabilizando encontros com nós mesmos. Como diz a poesia, pessoas de pele
escura, buscando umas pelas outras para enfim poderem encontrar a si próprias.
Encontre
negros e negras unidos e resistindo e estará diante de um grupo, lugar onde
Oliveira Silveira se encontrou! Lugar onde sua memória permanece viva!
Por
isto, para encontrar Oliveira Silveira, o poeta da Consciência Negra, procure
um grupo de pessoas negras que buscam por identidade e compreendem a liberdade
como um processo de luta, e não como algo que foi entregue pelo opressor.
_____________________________
Por Karen Luise Souza e Naiara Rodrigues da Silveira Lacerda, originalmente no Justificando.
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