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Mão de uma idosa de 84 anos em abrigo, no Rio; ela foi resgatada de condições análogas à escravidão após 72 anos em maio deste ano - Reprodução Globonews - 14.mai.22. |
Uma
denúncia é a porta de entrada para revelar casos de trabalho análogo à
escravidão ligados a serviços domésticos, que ocorrem dentro de residências e
envolvem vítimas em situação de vulnerabilidade social, com baixa escolaridade
e pouco acesso aos canais de investigação.
Segundo
o auditor Maurício Krepsky, chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação
do Trabalho Escravo, é difícil identificar as situações que envolvem atividade
doméstica se não for por meio de um relato. “Geralmente a denúncia não é feita
pela vítima, é alguém que está fora e observa, então chegar essa informação é
extremamente importante.”
“Às
vezes, [a vítima] não tem acesso a pessoas ou a lugares nos quais a denúncia
pode ser feita. Às vezes, não tem nem sequer consciência do grau de exploração
a que é submetida, porque o trabalho escravo afeta principalmente pessoas em
grande situação de vulnerabilidade social, afirma Medina.
O
tema ganhou mais debate e espaço, nas últimas semanas, com o podcast A Mulher
da Casa Abandonada, produzido pela Folha. Ele retrata a história de uma
brasileira que manteve uma empregada doméstica em condições análogas à escravidão
durante 20 anos nos EUA.
O
trabalho análogo à escravidão pode estar presente em qualquer setor, no meio
urbano ou rural. Segundo Italvar Medina, procurador do MPT (Ministério Público
do Trabalho), a maior parte dos resgates de 2021 foi feita de lavouras de café,
no meio rural, e dos setores de construção civil e trabalho doméstico, no meio
urbano.
As
condições que caracterizam o trabalho análogo à escravidão estão previstas no
artigo 149 do Código Penal. Trabalho em condições degradantes, trabalho
forçado, jornada exaustiva e situações que configuram escravidão por dívidas
são recorrentes.
Não
é necessário que todos os aspectos estejam presentes; qualquer uma destas
situações já pode configurar trabalho análogo à escravidão e, em caso de
suspeita, a denúncia pode ser feita por meio de Sistema Ipê.
VEJA COMO IDENTIFICAR UM CASO DE
TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVIDÃO
CONDIÇÕES DEGRADANTES
Há
negação dos direitos básicos para a dignidade do trabalhador. “Ele não tem garantida uma alimentação digna,
muitas vezes não tem acesso a água potável, a um alojamento com a mínima
qualidade e conforto, acesso a medidas de saúde e segurança do trabalho, não há
respeito ao repouso, não há às vezes até mesmo pagamento de remuneração”,
explica Medina.
Há
situações em que trabalhadores do meio rural são resgatados em barracos de
lona, obrigados a buscar a própria comida e a beber água de riachos e açudes.
TRABALHO FORÇADO
Ameaças,
agressões físicas, restrição de uso de meios de transporte e retenção de
documentos, como passaportes de trabalhadores imigrantes, são medidas usadas
para impedir ou dificultar a saída da vítima do local de trabalho.
JORNADA EXAUSTIVA
A
jornada exaustiva tem longa duração e é tão intensa que pode levar ao total
esgotamento das energias e ao adoecimento.
ESCRAVIDÃO POR DÍVIDAS
O
empregador leva o trabalhador a constituir dívidas de forma fraudulenta. O
funcionário nunca consegue quitar a falsa dívida que teria contraído.
“Então o empregador, por exemplo, cobra os
próprios instrumentos de proteção, cobra os mantimentos para o trabalhador por
preços superfaturados, cobra o meio de transporte para o trabalhador ir à
fazenda, e com isso praticamente todo o dinheiro que o trabalhador ganha reverte
de volta ao empregador.”
QUANDO E COMO FAZER UMA DENÚNCIA?
Caso
desconfie de que alguém está sendo submetido a trabalho análogo à escravidão,
denuncie a situação no formulário do Sistema Ipê: www.ipe.sit.trabalho.gov.br
ou presencialmente, nas unidades do Ministério Público do Trabalho ou em
Superintendências Regionais do Trabalho, por telefone das unidades ou por meio
do Disque 100.
“A pessoa não precisa nem usar a palavra
‘trabalho escravo’ se ela não quiser, ela precisa descrever os fatos”, diz
Medina.
É
possível fazer a denúncia de forma anônima, mas Krepsky ressalta a importância
de deixar ao menos um telefone de contato: “Muitas
pessoas têm medo de denunciar e se identificar, mas precisamos entrar em
contato com o informante em algum momento, até para garantir a eficiência da
ação fiscal, às vezes ter algum detalhe que a pessoa não citou e a gente
precisaria saber.”
Os
dados do denunciante são sigilosos e não são divulgados, assim como a própria
existência da denúncia e seu conteúdo.
“Por obrigação legal, a gente não pode nem
mesmo dizer se a ação fiscal é objeto de denúncia, quanto mais revelar a fonte”,
explica o auditor Maurício Krepsky, chefe da Divisão de Fiscalização para
Erradicação do Trabalho Escravo.
_____________
Por Natalie Vanz Bettoni, da Folha de S.Paulo e reproduzido no Geledés.
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