Sempre
apontado em situação vexaminosa no ranking da participação feminina na
política, o Brasil tem mais um motivo para se envergonhar: se fossem reunidas
todas as deputadas federais eleitas na história do país, apenas metade do
plenário da Câmara seria ocupado. A outra metade ficaria vazia, ou ocupada
maciçamente por homens, como sempre esteve. Somente 220 mulheres exerceram
mandatos na Casa desde 1933, quando a médica paulista Carlota Pereira Queirós
se tornou a primeira deputada eleita na América Latina. Atualmente, a Câmara é
composta por 513 integrantes. Desses, apenas 55 são mulheres. No Senado, há 13
senadoras entre os seus 81 membros.
Congresso em Foco
- Com esses números, o Brasil ocupa a 154ª posição, em um ranking composto por
190 países, em presença feminina no Parlamento. Nas primeiras colocações,
despontam Ruanda, Bolívia, Cuba e Islândia. O Congresso brasileiro aparece
atrás de nações conhecidas pela forte opressão à mulher, como Jordânia, Síria,
Líbia, Iraque, Emirados Árabes, Afeganistão e Arábia Saudita. Os índices
brasileiros de engajamento feminino na política (11% na Câmara) estão abaixo da
média mundial, em torno de 22%, e também do percentual do Oriente Médio, 16%,
segundo a União Interparlamentar (UIP).
As
últimas eleições municipais, marcadas pelo tempo reduzido no horário eleitoral
e pelo barateamento das campanhas, com a proibição das doações empresariais,
não aumentaram em nada a presença da mulher nos cargos eletivos municipais. As
vereadoras são apenas 14% dos integrantes das câmaras e as prefeitas só
comandam 12% dos municípios brasileiros. Entre as 93 maiores cidades do país,
com mais de 200 mil eleitores ou capitais, apenas três elegeram mulheres: Boa
Vista (RR), Caruaru (PE) e Pelotas (RS).
Máquina partidária e financiamento
Especialistas
no assunto identificam dois grandes obstáculos para melhor a representação
política das mulheres (hoje, 52% do eleitorado). A primeira barreira se dá no
acesso ao comando partidário. É a direção do partido que define as candidaturas
prioritárias e favorece a distribuição de recursos e espaço no rádio e na TV a
candidatos com mais chances de vitória. As máquinas partidárias são quase todas
controlados, nos municípios, nos estados e nacionalmente, por homens.
O
segundo entrave é exatamente o dinheiro. Pesquisas acadêmicas confirmam que os
empresários priorizam candidaturas masculinas na hora de financiar campanhas
por entender que os homens têm mais chances de vitória e, por isso, estão mais
sujeitos a oferecer as contrapartidas ao investimento.
As
mudanças adotadas até agora têm se mostrado insuficientes para equilibrar o
jogo eleitoral. A exigência de reserva de 30% das vagas para um dos gêneros foi
facilmente burlada por partidos com o registro de candidaturas fantasmas,
apenas para preencher o percentual previsto em lei e escapar da punição.
Cotas no Parlamento
Não
há consenso para a solução do problema. Algumas das principais lideranças da
bancada feminina no Congresso defendem a eleição paritária de homens e mulheres
– a partir de votação em listas preordenadas. Diante da impossibilidade de uma
proposta dessa natureza ser aprovada por um Parlamento majoritariamente
masculino, deputadas e senadoras apoiam a instituição de cotas para a Câmara,
com a previsão inicial de 20% das vagas para mulheres.
Segundo
a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), a experiência já se mostrou exitosa
em países europeus e na Argentina, onde a presença feminina no Parlamento
aumentou de 10% para 37% desde a alteração. Caso a cota fosse adotada no
Brasil, todos os estados teriam ao menos uma deputada eleita.
A
proposta de emenda à Constituição que trata do assunto passou pelo Senado em
2015. A Casa, porém, não seria afetada pelas mudanças, já que a eleição ali é
majoritária. A mudança valeria para as eleições proporcionais, como a de
deputados e vereadores. O texto, no entanto, está engavetado na Câmara.
A
PEC 98, de 2015, assegura a cada gênero percentual mínimo de representação nas
três próximas legislaturas: 10% das cadeiras na primeira legislatura, 12% na
segunda legislatura e 16% na terceira. Caso o percentual mínimo não seja
atingido por um determinado gênero, as vagas necessárias serão preenchidas
pelos candidatos desse gênero com a maior votação nominal individual entre os
partidos que atingiram o quociente eleitoral.
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Carlota, única mulher entre 253 eleitos em 1933, inaugurou a participação feminina no parlamento brasileiro. Foto: Arquivo/Câmara. |
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