Tudo
panos, úmido murcho, como corda antes da música. udo uma roupa vasta que a mão
separando ajunta. fios de uns e outros misturados, cada um com seus nomes. De
rito e de longe, de muito e nenhum recurso. Tudo um risco para quem torce as
costas no tanque. Como as letras na impressora antes dos livros. Tudo roupas
para um corpo que se expande todo braços, segurando as peças. A quem atenta são
páginas de leituras
Edimilson de Almeida Pereira – Nos Varais
A
encruzilhada, linha de força, entre individualidade e coletividade, é aqui
analisada na constituição do movimento negro contemporâneo, especialmente nos
circuitos acadêmicos. Esse aparente antagonismo entre o indivíduo e o coletivo
no campo político reside no fato de que o ativismo em movimentos sociais colocou
(e talvez ainda coloque) barreiras para a expressão da individualidade se
apresentar com agudez posto que elementos da individualidade como o
pertencimento racial e/ou de gênero são vistos como obstáculos para a
construção da objetividade no pensamento científico.

Foram
determinados indivíduos, com suas personalidades, que assumiram certos campos
de atuação e temas de estudo. O envolvimento com o movimento negro foi bastante
amplo para alguns/umas acadêmicos/as. Questionaram a sociedade, a esquerda, os
movimentos sociais de classe e de gênero e o próprio movimento negro. Deram
novos sentidos ao fazer político social, racial e/ou de gênero. Sabendo do
custo de ser negro no Brasil, tornaram-se negros/as ativistas intelectuais.
Romperam com o lugar social subalterno, enfrentaram o racismo e/ou o sexismo.
No
entanto, algumas pessoas de referência neste campo tiveram suas trajetórias
interrompidas com a morte em plena maturidade.
Escrevo
com base em pesquisa individual e em leituras de outros/as pesquisadores/as que
tratam de trajetórias de ativistas negros/as, agregando-as para problematizar a
relação entre individualidade e coletividade, o que envolve a abordagem de um
projeto tanto pessoal quanto político. Centrar-me-ei em alguns indivíduos que
emergiram no cenário nacional nos anos 1970 e marcaram indelevelmente o
movimento negro contemporâneo e o campo de estudo das relações raciais e/ou de
gênero na escolha e no tratamento dos temas do racismo (em correlação com
outros sistemas de opressão) e da cultura negra.
Em
síntese, trabalho em duas direções: 1. A idéia de um movimento negro de base
acadêmica com um projeto político; 2. Os dilemas entre individualidade e
coletividade, recolocados em outras aparentes contradições, para intelectuais
ativistas negros/as. Olhando para as décadas de 1970 a 1980, destacam-se as
figuras exemplares de Eduardo Oliveira e Oliveira, Lélia Gonzalez, Beatriz
Nascimento e Hamilton Cardoso. Eventualmente menciono outros/as que alcançaram
visibilidade pública no mesmo período ou em décadas anteriores, e que também
compuseram esse cenário.
Seus
percursos indicam a existência de dilemas entre: militância e academia;
política e cultura; racismo, sexismo e classismo; movimentos negros e
movimentos de base classista ou de gênero; e, de certa maneira, entre vida e
morte conquanto se confrontaram com sistemas de interrupção da existência
humana que vão desde a desumanização até a eliminação sumária (de indivíduos e coletividades
inteiras). Alguns/umas vieram a morrer antes dos 60 anos de idade, por motivo
de doença grave, assassinato ou suicídio.
A
trajetória de intelectuais críticos de seu tempo e de seus contextos de vida
indica questões específicas que podem ser compreendidas igualmente em sentidos
coletivos.
No
caso da formação de “intelectuais negros/as insurgentes” (hooks & WEST,
1991), especialmente aqueles/as vinculados/as ao movimento negro, há questões
ligadas à construção de sua individualidade, à opção pela militância, à sua
ligação com as comunidades e culturas negras, e, à continuidade de suas
trajetórias enquanto acadêmicos/as e intelectuais. Coloca-se a questão da
formulação e veiculação de um discurso, enquanto “vontade de verdade”
(FOUCAULT, 1999), sendo o/a intelectual aquele “que procura, incansavelmente, a
verdade, mas não apenas para festejar intimamente, dizê-la, escrevê-la e
sustentá-la publicamente” (SANTOS, 2001). Com um “intelecto inquiridor e
profundamente confrontador” (SAID, 2003: p. 29) e portadores de “saberes
sujeitados” (FOULCAULT, 2005: p. 11) esses/as intelectuais se confrontaram com
encruzilhadas e superaram muitas delas “ em movimento”, mas nem sempre em
consonância com o movimento negro.