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Alexandre Lucas, do Coletivo Camaradas, em ação. (FOTO | Reprodução). |
Por Alexandre Lucas, Colunista
A ideia de que o Ponto de Cultura é a afirmação da trajetória e da permanência da continuidade tem como referência o fato de que não se trata de produzir um novo produto para ofertar ao Estado, uma lógica semelhante à do mercado. Pelo contrário, o Estado deve garantir que experiências de base comunitária e territorial consigam se afirmar economicamente e politicamente, colocando o processo como parte fundamental de um Ponto de Cultura. Essa é a concepção basilar e de ruptura com as políticas culturais dominantes, que deram origem ao Cultura Viva no país.
Essa
perspectiva confronta-se com a retomada da Política Nacional de Cultura Viva, a
qual vem se configurando por um viés notadamente marcado pelo mercado e que
precisa ser combatido. Essa constatação pode ser percebida desde a página do
Cultura Viva no site do Ministério da Cultura, que vende a ideia da cultura
como uma oportunidade facilitada de acesso a recursos públicos: “A ideia da
cultura como um bom negócio”. Alinhado a isso, os editais da Política Nacional
Aldir Blanc (PNAB) apresentam contradições relevantes que impactam na concepção
de Pontos e Pontões de Cultura nos municípios e estados. Com instrumentos
oriundos do Ministério da Cultura para serem aplicados em nível municipal e
estadual, criam-se funis burocráticos, com tendência a beneficiar os
“especialistas em editais” e marginalizar os fazedores e fazedoras permanentes
de paisagens culturais e sociais, além de produtores, produtoras, pensadores e
pensadoras simbólicos ligados aos territórios e comunidades.
A
ideia do “produto” nos editais do Cultura Viva é algo explícito, previsto nos
editais, o que descarta a ideia da permanência e da continuidade. Manter os
espaços vivos, em movimento, abertos para a conversa, o café, o ensaio, o
estudo, a brincadeira e a reunião é o processo que edifica a organização
popular, dá identidade e não se encaixa no pacote do mercado.
Tudo
pode ser Ponto de Cultura? Excluindo o artista individual e as iniciativas de
ordem comercial, em tese, sim. Talvez, do ponto de vista populista, isso possa
parecer grandioso, mas, ao mesmo tempo, pode resultar em um inchaço e em uma
adesão de mercado.
O
Cultura Viva, enquanto política pública para a cultura, deve crescer pautado em
sua dimensão política e conceitual, baseada na cidadania cultural e na
transversalidade. Se esse princípio não for capaz de fortalecer processos,
redes de articulação da sociedade civil, impulsionar e consolidar os mecanismos
de controle e participação social, e reconhecer o Cultura Viva como política de
Estado, ele perderá sua capilaridade intersetorial e sua capacidade de
incidência política, conforme previsto na Lei Federal nº 13.018, de 22 de julho
de 2014, que institui a Política Nacional de Cultura Viva.
A
meta é chegar a 15 mil Pontos de Cultura certificados pelo Ministério da
Cultura, um número elevado que repercutirá inquestionavelmente na necessidade
de ampliação dos recursos para o Cultura Viva em nível nacional, além de
representar a descentralização de recursos. Entretanto, no formato que vem
sendo desenhado, o Ministério da Cultura retira o caráter inovador,
transformador e de ruptura do Cultura Viva, colocando-o no campo do “mais do
mesmo”.
Precisamos de 15 mil Pontos de Cultura alinhados com um novo projeto de sociedade, interligados em rede, ocupando de forma crescente as tecnologias e as concessões de comunicação, protagonizando modelos ousados de democratização cultural para a classe trabalhadora, reconhecendo que a cultura é ideológica e está em disputa. O Cultura Viva deve ser a inquietação necessária para combater o fascismo em ascensão e desconstruir o pensamento elitista das políticas culturais no Brasil.
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