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Abdias Nascimento discursa em convenção do Partido Democrático Trabalhista realizada no Congresso Nacional, em 1982. (FOTO | Acervo Ipeafro). |
Nos
ensina o Griot Abdias Nascimento: “Poucos
brasileiros sabem (…) que pelo lado africano, o lado da senzala, somos os
herdeiros de uma civilização que deu à luz o chamado mundo ocidental. Poucos
sabem porque o fato foi escamoteado, distorcido e falsificado durante séculos,
que a tão decantada civilização greco romana tem suas origens no Egito Antigo,
um país africano, e que a civilização egípcia, por sua vez nasceu no coração da
África”
Conversando
com Bida Nascimento, filho de Abdias, perguntamos por uma citação. “Eu sou o
Leão Africano!”. Abdias costumava exaltar essa frase enquanto jogava cartas. A
figura do leão é emblemática por si só e não deve ser reduzida como um animal
da savana africana. À essa mitologia guerreira se demanda a Tribo de Judá que
fez a cabeça do mais famoso ‘Dread Lion’ de todos os tempos, Bob Marley. Ser
“Dread Lion” ou usar ‘DreadLocks’ consiste numa filosofia de vida ou
‘lifestyle’ para assumir a própria etnia. Quando estamos vendo ‘rastas’ andando
pelas ruas orgulhosos de seus cabelos e trejeitos podemos reconhecer que a
autoestima de cada um desses cidadãos está preservada. Nisso se consiste a luta
do Movimento Negro. Resgatar a autoestima das populações afrodescendentes de
modo que a ampla maioria da população, no caso do Brasil, através de uma
referência histórica passe à ser vista como protagonista da vida nacional.
Nesse
trabalho de revisionismo, Abdias funda com sua esposa Elisa Larkin Nascimento o
Instituto de Pesquisa e Estudos Afrobrasileiros (Ipeafro) em 1981 na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). A ausência de produção acadêmica
e, consequentemente, de provocação na opinião pública sobre as experiências dos
povos africanos e afrodescendentes, seja nas Américas ou na África, resultou
num robusto material desenvolvido ao longo desses 36 anos de trabalho
intelectual e artístico. Poderemos destacar as revistas “Thot” que acompanhavam
o mandato parlamentar de Abdias, a coleção Sankofa, que na tradição dos povos
Acã situados na antiga África Ocidental (atual Gana e parte da Costa do Marfim)
eram formulados diversos Adinkras, onde o símbolo que ilustra o título dessa
pesquisa é denominado SankofaGwa: “Nunca é tarde para voltar e buscar o que
ficou para trás”. Por uma outra narrativa que englobe os povos de matrizes
africanas para além do samba, futebol, cozinha e candomblé; o suplemento
didático “A Linha do Tempo dos Povos Africanos” comprova tanto materialmente
como dialeticamente, a existência da filosofia africana, a vanguarda nas artes,
literatura, astronomia, medicina, engenharia e arquitetura. Devemos hoje
procurar entender o porque associamos diretamente (bem como somente também) os
reinados, dinastias, palácios e castelos à Europa.
Certamente
causará estranhamento a afirmação de que o homem mais rico de todos os tempos
foi simplesmente um africano reverenciado como Mansa Musa, Imperador da Mali. O
certo seria estranhar porque até hoje a imagem que ficou incutida na
mentalidade humana é que a África é um lugar permeado por doenças, guerras
civis e miséria absoluta. Ao invés desse subdesenvolvimento intelectual, vamos
começar a reconhecer a existência das universidades, centros culturais, museus,
hospitais e pontos turísticos?
Acreditamos
que essa seja a necessidade da implementação da Lei 10.639/03 que versa sobre
História da África e dos africanos e sobre o papel do povo negro na formação da
sociedade brasileira. No dia que cada cidadão afrodescendente souber de si e do
seu mundo, poder se conectar com a diáspora e seu universo, a história no
Brasil será outra frente à esse amplo contingente populacional unido e
empoderado.
De
forma boa, fica impossível falar de Abdias em poucas linhas. Para além da
atuação acadêmica, ativista e parlamentar, Abdias também foi ator, dramaturgo,
poeta, pintor e diretor. Convidamos todos para assistir o espetáculo “Abdias
Nascimento, O Leão Africano!” que será realizado no próximo dia 18 de fevereiro
de 2017, sábado, às 20h. Esse projeto faz parte da programação da VI Semana do
Patrimônio Fluminense, onde o objetivo é ressaltar o patrimônio cultural
imaterial. O sítio histórico do Cais do Valongo será o palco dessa apresentação
aberta ao público de forma gratuita. Não seria possível sem o patrocínio da Sociedade
de Promoção da Casa de Oswaldo Cruz e o apoio do Ipeafro, bem como o Ponto de
Cultura Escola POP. Abdias vive! Axé!
Veja
também “A educação Popular não começa com Paulo Freire, diz Alex Ratts”
___________
Texto de Walmyr Junior e Paulo Mileno, do Jornal do Brasil com o título Abdias Nascimento, o Leão Africano!
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