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Vinícius Jr. (FOTO | Divulgação). |
“Tudo pra nós, que é preto (sic), é mais difícil / Quem não é da cor fala que é maluquice”. Esse trecho da música 60K, do rapper Major RD, retrata bem o que houve na eleição da Bola de Ouro 2024. Vinicius Jr., favorito, com sobras, à conquista do prêmio, pela última temporada impecável com o Real Madrid (ESP), não venceu. Em seu lugar, um jogador que nem sequer foi o melhor do próprio time, Manchester City (ING), e nem estava cotado para ficar entre os três melhores do mundo em 2023/24.
No
discurso da vitória, o espanhol Rodri disse que alguns amigos o tinham
contactado para falar que sua conquista representa que “o futebol ganhou”. Um jogador europeu, branco, isento e que
representa o ideal de profissional “perfeito”
na cabeça de muitos. Um atleta considerado patriota, que foi punido por gritos
ofensivos contra o território britânico de Gibraltar (localizado na Espanha),
quando foi campeão da Eurocopa 2024, que, aparentemente, garantiu a ele a Bola
de Ouro.
Já
Vinicius Jr. representa o oposto disso tudo: negro, brasileiro, dança, brinca,
não abaixa a cabeça e enfrenta o racismo com altivez. É extremamente doloroso
que ele tenha que passar, dia após dia, jogo após jogo, por tanto preconceito
enquanto exerce a própria profissão. É cansativo, é revoltante! De uma forma ou
de outra, ele tem aberto portas para mudanças dentro do time em que atua e para
punições contra os racistas que o atacam.
Dentro
das quatro linhas, o atacante brasileiro de 24 anos teve ótimos números na
temporada passada: 26 gols e 11 assistências em 49 jogos (contando Real Madrid
e Seleção Brasileira), além da conquista de quatro títulos com a equipe
espanhola, sendo a Liga dos Campeões a mais importante. Um ano de ouro que
teria a coroação perfeita com a premiação individual mais importante do futebol
mundial.
A
justificativa para bancar o vencedor escolhido foi de que Rodri foi campeão da
Eurocopa; se o critério fosse “conquistas pela seleção”, faria mais sentido,
por exemplo, o companheiro de equipe de Vini Jr., o espanhol Dani Carvajal,
levar o troféu, já que ele ganhou a Liga dos Campeões e a Eurocopa na mesma
temporada. Só que ele ficou em 4º lugar na lista.
Outro
motivo utilizado foi o de que a União das Associações Europeias de Futebol
(UEFA) e a France Football só poderiam premiar jogadores que estivessem de
acordo com o fair play (jogo limpo), levando a entender que, por se posicionar
e ser considerado raivoso e polêmico, Vinicius não estaria apto a ser Bola de
Ouro. Mais um argumento que cai por terra, já que o goleiro Dibu Martínez,
sempre provocador no ambiente de jogo, foi eleito como o melhor em sua posição.
Informação vazada e repercussão
A
imprensa europeia destacou que, na manhã desta segunda-feira, 28, o Manchester
City avisou ao Real Madrid que Rodri seria o vencedor da Bola de Ouro. Vinicius
e toda a delegação do time espanhol desistiram de comparecer à cerimônia; e não
foi enviado nenhum representante, nem mesmo para receber o prêmio de “Melhor
Clube” da temporada.
Apesar
da incerteza, a informação vazada já gerou revolta nos brasileiros,
especialmente porque a temporada anterior de Rodri havia sido muito melhor, e
ele ficou apenas em 5º lugar. Depois do resultado confirmado, Vinicius recebeu
apoio de torcedores, amigos, companheiros e ex-companheiros de equipe.
Cerimônia
Durante
a entrega da Bola de Ouro, percebeu-se o constrangimento no ar. George Weah,
ex-jogador de futebol, ex-presidente da Libéria e único africano a ganhar o
prêmio, em 1995, ao fazer suspense sobre o vencedor, ouviu um grito de “Vini
Jr.”, vindo da plateia. Na sequência, a entrega do troféu para Rodri foi um dos
momentos mais tensos dos últimos anos da cerimônia.
Enquanto
torcedora do Real Madrid e plena simpatizante do Vini Jr., a notícia da manhã
de hoje veio como uma água fria sobre mim. O que mais nós, pessoas negras,
temos que fazer para conquistar o topo nas nossas carreiras? Aquela conversa de
que temos que fazer três vezes mais do que eles é real, mas é muito mais
profundo do que isso. Não apenas temos que ser muito melhores; temos que
performar uma espécie de negritude amansada. Afinal, por mais que muitos de nós
estejam chegando a lugares de destaque, os mandatários continuam sendo os
mesmo: a branquitude.
Não é nosso dever buscar aprovação dessas pessoas, muito pelo contrário. Temos que e devemos lutar pelo que acreditamos ser certo; sem abaixar a cabeça, e apoiar uns aos outros, pois só nós estamos disponíveis para os nossos. Não temos que esperar nada de quem nos rebaixa, desvaloriza e desdenha.
O
prêmio da Bola de Ouro deixou de ser credível há algum tempo, por outros
fatores, mas o dia 28 de outubro de 2024 vai ficar marcado para sempre nas
memórias dos fãs de futebol. O dia em que o melhor jogador do mundo foi
preterido; não só por causa da cor da pele, mas também pela forma como escolheu
combater todos os preconceitos que enfrenta diariamente. Como disse Maya
Angelou (1928-2014): “Você pode me marcar na história com suas mentiras amargas
e distorcidas. Você pode me esmagar na terra, mas, mesmo assim, como a poeira,
vou me levantar”.
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Texto da jornalista Karoline Tavares, no Site Negrê.
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