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Desde o ano 2000, a religião vem ressurgindo, diz babalorixá. (FOTO | Fernanda Frazão | Agência Brasil). |
O Dia Nacional da Umbanda será comemorado neste 15 de novembro, mas existe uma questão forte a enfrentar. A intolerância religiosa é uma preocupação entre seus seguidores. O pai Fernando D’Oxum, da Tenda Espírita São Lázaro, do bairro Pita, em São Gonçalo, região metropolitana do Rio, disse que nos anos 1980 houve uma expansão da religião no Brasil, mas a partir daí ocorreu um "grande processo negativo por parte de integrantes de algumas igrejas pentecostais, que começaram a demonizar esta religião".
Segundo
o babalorixá, dos anos 2000 para cá, a religião afro-brasileira vem
ressurgindo. “Até por causa de uma escola muito poderosa, que é a escola
paulista que nos ajudou muito na divulgação do culto no Brasil, e hoje está
espalhada no país todo, com grande força em São Paulo, Rio de Janeiro e não
posso tirar a grande força também que é a do Rio Grande do Sul”, afirmou.
A
preocupação é dividida com o pai Wilker Jorge Leite Filho, do Templo Umbandista
Estrela do Amanhã (Tueda), de Bangu, na zona oeste do Rio, para quem a
intolerância atualmente não ocorre mais de uma forma velada. “Isso existe, e
acho que vai existir sempre. Se estamos em um planeta de prova e expiação, se
estamos ainda crescendo aqui no planeta Terra, ainda tem uma mistura muito
grande de espíritos com entendimento, espíritos sem entendimento, então, essa
ignorância ainda vai existir por muito tempo”, ressaltou.
Ocorrências
Dados
do Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio de Janeiro indicam que, em 2021,
houve 33 ocorrências de ultraje a culto religioso em todo o estado do Rio de
Janeiro. Em relação a 2020, representa um aumento de 10 casos.
Naquele
ano, as delegacias da Secretaria de Estado de Polícia Civil fizeram 1.564
registros de ocorrência de crimes que podem estar relacionados à intolerância
religiosa, o que significa mais de quatro casos por dia. No total, estão
incluídos os casos de injúria por preconceito (1.365 vítimas); e preconceito de
raça, cor, religião, etnia e procedência nacional (166).
De
acordo com o instituto, a injúria por preconceito “é o ato de discriminar um
indivíduo em razão da raça, cor, etnia, religião ou origem. Já o preconceito de
raça, cor, religião, etnia e procedência nacional tem por objetivo a
inferiorização de todo um grupo étnico-racial e atinge a dignidade humana”.
“A
tipificação criminal é determinada pela ridicularização pública, impedimento ou
perturbação de cerimônia religiosa”, destacou o ISP, que tem o objetivo de
mostrar para a sociedade que intolerância religiosa é crime e tem que ser
denunciada.
Tendas
Outra
dificuldade desta religião é saber quantas tendas e casas de santo existem no
Brasil. Pai Fernando D’Oxum disse que não tem a informação de quantas estão
instaladas no país, mas, atualmente, em São Gonçalo são cerca de 400. O líder
espiritual defendeu a realização de uma pesquisa que possa identificar a
localização das casas de santo e qual é a população de povos de terreiros de
umbanda no país
“Seria
maravilhoso se a gente conseguisse mapear, mas por conta da violência, alguns
terreiros escolhem ficar absolutamente escondidos, porque têm medo de que, uma
vez expostos, esses grupos neopentecostais agressivos possam ir lá e depredar o
patrimônio. Tem uma discussão sobre violência a ser feita ainda”, ressaltou.
Segundo
Fernando D’Oxum, é difícil verificar o número de umbandistas no Brasil. “As
pessoas, em um censo, por exemplo, não dizem que são umbandistas, elas se dizem
espíritas, e aí já começa uma grande confusão. Esta tem sido uma batalha nossa
para que o umbandista se reconheça como umbandista e não como espírita. Fora os
que no censo se dizem católicos, porque têm um acesso mais facilitado.
Para
o pai Fernando D’Oxum, a Umbanda é uma religião que nasceu na cidade de São
Gonçalo e foi anunciada pelo médium Zélio Fernandino de Moraes, no dia 16 de
novembro de 1908, embora, na véspera, o médium tenha feito uma manifestação na
cidade vizinha Niterói, data que acabou sendo marcada como Dia da Umbanda.
“É
uma religião brasileira que a gente entende como 100% brasileira, com
influências do povo indígena, dos hindus e de várias vertentes da religiosidade
brasileira e, logicamente, do catolicismo. É uma religião que se predispõe à
caridade, à prática de ajuda ao outro e que hoje está presente em quase todos
os continentes. Uma religião que avançou mundo à fora”, disse pai Fernando.
Sincretismo
Na
visão do babalorixá, a umbanda toma um pouco a vertente da matriz africana do
candomblé quando começa a reconhecer e adaptar os orixás, que são os guias, e
que chegaram com os negros do povo da áfrica no Brasil.
Além
disso, tem o sincretismo, que surgiu da necessidade das pessoas escravizadas
associarem um orixá a um santo da igreja católica. Foi assim que São Sebastião
é Oxossi, São Jorge é Ogum, Nossa Senhora dos Navegantes e Iemanjá, Nossa
Senhora da Conceição é Oxum e Santa Bárbara é Iansã, entre outros. Assim, os
escravizados podiam professar a sua fé nas fazendas onde viviam.
De
acordo com pai Fernando, o sincretismo vem se modificando ao longo dos anos e,
atualmente, algumas casas não fazem mais altares com santos católicos. “Algumas
casas de Umbanda não fazem mais sincretismo nos altares, ou seja, os santos católicos
em algumas casas já não estão mais presentes nos altares.”
Por
considerar São Gonçalo como o berço da umbanda, que é muito poderosa na cidade,
diante dos desafios desta religião, o babalorixá propõe a criação de uma lei
municipal que determine a inclusão dela no calendário oficial da cidade.
Preservação
Pensando
em preservar o patrimônio histórico, a tenda espírita criou o projeto do Museu
da Umbanda, que ainda não tem uma sede física, mas vem avançando desde 2009.
Pai Fernando destacou que uma peça importante desse patrimônio foi perdida com
a demolição da casa do médium Zélio Fernandino de Moraes, em Neves, bairro de
São Gonçalo, onde a Umbanda foi anunciada em 1908. A prefeitura da época não
realizou a desapropriação do imóvel.
Renovação
A
Tenda Espírita São Lázaro não faz iniciação de crianças e adolescentes. Lá,
somente aos 18 anos podem ser iniciados, mas antes disso, a partir dos 13 anos
podem participar do grupo jovem Bala e Pimenta onde recebem informações sobre a
Umbanda e a doutrina espírita.
“A
missão do grupo é sempre difundir a nossa doutrina. O que a Umbanda é realmente
com seus preceitos tudo que realmente prega até mesmo para nós, jovens,
espalharmos no nosso meio o que é a Umbanda realmente e tirar um pouco do
preconceito. O grupo é para expandir a nossa doutrina entre os jovens do nosso terreiro”,
afirmou o estudante Samuel Salustiano da Costa, 17 anos, o coordenador do
grupo.
“Nesse
momento, de descobrir o que eu quero ser, qual o caminho que vou seguir na
minha vida, a umbanda me ajuda muito nessa fase de jovem, O que a religião
passa e mais me representa é a inclusão, o estender a mão a todos, o amor
incondicional e a caridade”, revelou Samuel.
O
contato do pai Wilker com a umbanda foi com a própria família que seguia esta
religião. Com 16 anos ele começou a desenvolver a mediunidade e com 19 anos fez
a coroação para babalorixá. “Sempre foi permitido a mim olhar, ter contato com
outras crenças religiosas, mas eu já nasci umbandista. Sempre gostei desde
pequenininho. Não me lembro com interesse em outras. Pela minha criação e o que
meus pais me passaram sempre respeitei, visitei Igreja Católica, protestante
por convite, mas a minha convicção sempre foi umbandista”.
Celebrações
A
umbanda tem também muito a celebrar pelos seus 115 anos. Para isso, foi
elaborada uma longa programação para comemorar sua participação entre as representações
religiosas no Brasil.
Em
São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, a prefeitura, por meio da Comissão
da Semana da Umbanda, criada para organizar as celebrações, preparou uma agenda
que começou na segunda-feira (13) com o debate Legalização e Justiça - um
caminho possível para o fim das violências contra os povos de terreiro. O
evento foi realizado na Faculdade de Formação de Professores da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ), naquele município.
A
programação tem ainda a exposição Pelos Caminhos da Umbanda, no hall principal
da Câmara Municipal de São Gonçalo, promovida pelo Instituto Carta Magna da
Umbanda. A ideia da mostra, que vai até amanhã (16), foi apresentar a
construção da religião brasileira de matrizes africanas e indígenas, a partir
de suas práticas, ritos, territórios e historicidade.
Também
amanhã, às 17h, durante uma sessão solene em homenagem às lideranças da umbanda
na Câmara Municipal de São Gonçalo, os homenageados receberão a medalha Zélio
Fernandino de Moraes.
Na
sexta-feira (17), haverá um show do cantor e compositor gonçalense Altay
Veloso, no Teatro Municipal de São Gonçalo, às 19h. A apresentação vai terminar
com a bateria da escola de samba Porto da Pedra. Os shows serão gratuitos e
sujeitos à lotação.
Encerrando
a programação da semana, no sábado (25), será o momento do Encontro dos Povos
de Terreiros de São Gonçalo, das 14h às 20h, na Praça Zélio Fernandino de
Moraes, Marco Zero da Umbanda, no bairro de Neves. Lá, as homenagens serão
dirigidas a lideranças religiosas, com o Banda com Banda, cerimônia de
hasteamento da bandeira da umbanda e uma feira de artesanato e gastronomia.
______
Com informações da Agência Brasil.
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