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Tiago Alexandre dos Santos reforça que o racismo é responsável por tirar meninos e meninas pretas das escolas e universidades. (FOTO/ Reprodução). |
Conhecimento
é ferramenta para transformar a vida da população preta. A ideia é cravada por
Tiago Alexandre dos Santos, 21, morador de Barbalha e mestrando em Sociologia
na Universidade Estadual do Ceará (Uece). O estudante, oriundo de escola
pública do interior cearense, aponta que estrutura social e política racista é
responsável, muitas vezes, por retirar meninos e meninas pretas de escolas e
universidades.
“Não podemos homogeneizar as vivências de
pessoas pretas. Nós passamos percursos individuais, mas é uma luta coletiva e
parte de coisas que nos antecedem. Geralmente, são os pretos que precisam
trabalhar cedo. Muitos estudantes, inclusive, são os primeiros da família a
cursarem a escola completa, porque os pais precisaram parar pra trabalhar”,
resgata.
Nascido
na zona rural da Região do Cariri, Tiago relembra que os pretos foram e são
historicamente relegados às periferias e distanciados das perspectivas de
ascensão. “Me recuso a falar de abolição,
porque ela não existiu – senão nem estaríamos tendo essa conversa. Fomos
cerceados do direito de sonhar com a educação como uma possibilidade, ainda que
entendendo a importância disso na nossa trajetória. O que a gente vai ser e a
nossa permanência na escola e na universidade depende de diversos fatores externos
e históricos”, reflete.
Sobre as diferenças nas formas como o racismo se manifesta dentro e fora do ambiente universitário, Tiago é categórico. “O racismo perpassa todas as relações, pretos sofrem em todos os lugares. Tá na pele. A diferença é que na universidade tem essa sutileza, a ideia de que ‘somos todos iguais, humanos’. Quando eu saio de lá, eu e o preto que trabalha na fábrica encaramos a rua do mesmo jeito. Ambos seremos parados pela polícia e chamados de vagabundos”.
“Quando questionamos por que em determinadas
disciplinas só lemos homens brancos, europeus e mortos, as pessoas perguntam ‘o
que isso tem a ver, você não quer estudar?” Não conseguem entender que é
esse modelo de formação que faz com que a sociedade não reconheça nem legitime
pessoas pretas como pesquisadoras, por exemplo”
Para o mestrando, a dificuldade de se construir a imagem de um homem ou uma mulher preta como estudante é sintomática. “Não existe esse pensamento de que toda pessoa com livro na mão é estudante: nossa estética, nossa cor, a forma como a gente se porta no mundo borram os limites do que é ser estudante. Pra gente, existe um processo de enfrentamento e construção disso: de as pessoas nos olharem e perceberem enquanto estudante, pesquisador, professor”, frisa.
O enfrentamento, segundo ele, é “de povo negro para povo negro”, muito embora a presença dos brancos seja fundamental na luta anti racismo. “É preciso que o menino negro morra nas mãos da polícia para que a população branca se sinta protegida, para que a polícia seja fortalecida. As pessoas brancas precisam usar os próprios privilégios para contribuírem com a luta: como nos Estados Unidos, onde os brancos fizeram um cordão diante da polícia, para que os pretos pudessem protestar”, exemplifica.
“Uma estratégia de transformação é o processo
de aquilombamento, a reconstituição da humanidade a partir de nós. Pensar
somente a partir do Estado, da política pública, não funciona.”
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Texto de Theyse Viana e publicado originalmente no Diário do Nordeste com o título “Racismo estrutural: estudante de Barbalha aponta obstáculos de pretos no acesso à educação”.
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