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Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, 9 de novembro de 2019. (FOTO/Ricardo Stuckert). |
Um
ano e sete meses separam as duas fotos quase idênticas que abrem este texto. Na
primeira, Lula é carregado após discurso de despedida no Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP), antes de se entregar à
Polícia Federal para cumprir pena em Curitiba. Na segunda, Lula é carregado
após discurso de retorno, no mesmo sindicato, um dia após deixar a prisão.
Essa
não é uma repetição aleatória. Tirada propositadamente pelo inseparável
fotógrafo do ex-presidente, a segunda imagem reforça a construção do mito e a
jornada do herói. O migrante nordestino que passou fome e veio a São Paulo em
um pau-de-arara, passando por provações e tornando-se chefe da nação, desceu ao
seu inferno e, agora, retorna de forma apoteótica. Mais do que histórias de
sucesso e superação, os brasileiros, criados no caldo da cristandade, gostam
mesmo é de narrativas de renascimento.
Lula,
que havia controlado a narrativa de sua prisão, dizendo onde e de que forma ela
aconteceria, chegando ao ponto de pedir à militância em São Bernardo que o
deixasse ir, uma vez que muitos queriam impedir a polícia de leva-lo, controlou
a sua saída. No carro de som, neste sábado (9), lembrou à multidão que havia
dito, 581 dias antes, que teria que passar por mais essa provação, mas que
estaria de volta. Para a ala de seus seguidores mais fanáticos, era quase como
se falasse: estava escrito.
Poderia
ter optado pela progressão de pena, como ofereceu a própria Lava Jato, ficando
com tornozeleira em casa. Mas mirou a suspeição do então juiz Sérgio Moro, que
ainda deve ser analisada pelo Supremo Tribunal Federal, com base nos diálogos
juridicamente promíscuos revelados pelo site The Intercept Brasil. Isso pode
anular sua condenação, tornando-o elegível novamente. Por enquanto, ficou com o
meio termo. Apesar de ter dito ao repórter Flávio Costa e a mim, em entrevista
ao UOL, que a decisão sobre a inconstitucionalidade da prisão em segunda
instância não lhe interessava, entrou com pedido de liberdade horas depois da
decisão do STF, por 6 a 5. Ao final, esperou e conseguiu o que quis. A seu
favor, dizem que o diabo não tem paciência para jogar xadrez.
Ainda
é cedo para saber o tom que irá adotar em suas caravanas e no rosário de
entrevistas que ainda vai conceder a veículos internacionais - de acordo com a
sua assessoria, pedidos estrangeiros se acumulam aos montes. Deve ser incômodo,
aliás, para Jair Bolsonaro que o The New York Times dê mais atenção ao
"presidiário do que ao presidente da República. E essa é uma das maiores
mudanças trazidas pela soltura de Lula: o atual presidente conseguia atrair
toda a atenção que desejasse ao postar e fazer comentários, pautando a
discussão pública, mesmo com coisas inúteis - como o caso da golden shower.
Agora, terá que dividir espaço.
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Clique aqui e confira íntegra do texto do professor e blogueiro Leonardo Sakamoto.
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